Vedor da Fazenda

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'Vedor-mor

O Vedor da Fazenda ou Veador da Fazenda (ou antes viador, do latim via, caminho ou estrada)[1][2] é um título que era destinado obrigatoriamente a cidadãos nobres ou que fossem provenientes de famílias nobres[3], que surge em 1370, no reinado de D. Fernando I[4], com a missão de controlarem e registarem, as receitas e despesas, do Reino de Portugal e da Casa Real. É inicialmente o oficial da fazenda, economia da casa e do reino, da sua provisão, regulamento e fiscalização[5].

Controlavam o tesouro dos monarcas e fiscalizavam os ingressos derivados do exercício do poder (receitas aduaneiras e demais receitas públicas, v.g. sisas, dízimas, portagens e ancoragens, pensões de tabeliães, rendas e direitos da chancelaria, tributos dos judeus) e as despesas ordinárias (mantimentos, pensões, salários) e despesas extraordinárias (guerra e missões diplomáticas)[6].

Era a quem cabia a administração superior do Património Real e da Fazenda Pública[7].

Sendo, nesse tempo, João Anes (de Almada) o primeiro vedor dessa Fazenda Régia.

O cronista Fernão Lopes, incumbido por D. Duarte, em 1434, de redigir as crónicas dos reis antecessores, faz referência direta aos oficiais que detinham o controlo das despesas da fazenda régia quando diz: «em cada huum anno eram os reis certificados polos vedores da fazenda das despesas todas que feitas haviam»[8].

Perante os Vedores da Fazenda respondiam os contadores e os porteiros que desempenhavam as funções de contabilistas da casa régia, seguidos do tesoureiro-mor e do esmoler-mor, acompanhados de perto pelo reposteiro-mor que tradicionalmente possuía atribuições financeiras relacionadas com a atividade da Corte. Estes oficiais tinham por missão a fiscalização de todos os atos executados com dinheiros do património régio[9].

No Ultramar português, seguindo a escala hierárquica, o vedor encontrava-se logo a seguir ao vice-rei. No decorrer desse período da gestão do Império de Portugal há uma descrição de um viajante estrangeiro que permite que facilmente se perceba a constituição do poder político e a respectiva distribuição na cidade de Goa, onde se situava o centro de decisão de Índia Portuguesa, começando por descrever a figura do Vedor da Fazenda que governa na Praça da Ribeira Grande, sendo ele “...o intendente de todos os negócios da fazenda e de tudo quanto em Goa se faz [...] porque é ele a segunda pessoa abaixo do vice-rei («Viagem de Francisco Pyrard de Laval», edição de Joaquim Heliodoro e Magalhães Basto, Porto, Livraria Civilização, Vol. II, cap. III, pág. 34.).” A criação deste cargo remonta a 1517 e possibilitou a prossecução de uma magistratura capaz de interferir na administração das fortalezas, exercendo a sua jurisdição sobre todos os oficiais da fazenda que nelas se encontravam. As suas funções incidiam na inspecção administrativa, controlando desta feita o cumprimento dos regimentos dos seus oficiais. [10].

Observa Helena Maria Matos Monteiro, na sua dissertação de mestrado sobre os meados do século XV e anterior, que nos livros de chancelaria surgem também cartas redactadas pelos Vedores da Fazenda, sobretudo de subscrição régia, Mas para além "da redacção de um conjunto de cartas ligadas aos bens e direitos do rei ou da coroa" a eles cumpre também a preparação e a própria execução das mesmas". Paralelamente desempenham múltiplos "encarregos". Em suma, são oficiais 'polivalentes', e destacados membros da "sociedade política" afonsina e joanina de um departamento 'já ' quase patriminonializado[11].

Historial

Nos finais do século XII, surge o dapifer regis ou vedor que vai exercer as funções de administração palaciana que anteriormente competiam ao mordomo-mor[12].

No tocante à administração financeira, já em 1255 nos surge o porteiro-mor (inicialmente intermediário no acesso à pessoa do rei e depois transformado em superintendente na cobrança de tributos e receitas patrimoniais régias) a que no século XIV vão suceder, primeiro, os ouvidores da portaria e, depois, os vedores da fazenda[13]., ambos com funções quer de superintendência tributária quer de contencioso fiscal. No domínio da fiscalização financeira, com D. Dinis destaca-se da cúria régia a estrutura dos Contos, cujo primeiro regimento conhecido data de 5 de Julho de 1389, desdobrados em Contos de Lisboa e Contos de El Rei e que D. Manuel unifica nos Contos do Reino e Casa, sob a direcção de um provedor mor[14].

Os Vedores da Fazenda, desde o reinado de D. João I (1385-1433), encontram-se vinculados à cobrança e auditoria das contas da casa real, dos almoxarifados e das contadorias fora da comarca de Lisboa, para além de zelarem pelos bens régios[15].

Um século mais tarde, no reinado de D. Manuel I (1495-1521), em resposta ao aumento dos negócios do Estado real com a expansão ultramarina, extensa a São Jorge da Mina e a Índia, os Vedores da Fazenda dispõem de regimento próprio e detêm amplas competências no domínio financeiro e fiscal[16].

Foi nas Cortes de Tomar, em 1581, em que Filipe II de Espanha foi jurado Rei – Filipe I de Portugal –, que os povos pediram ao monarca que despachasse os negócios do Reino na nossa língua, com portugueses, um Chanceler-Mor, um Vedor da Fazenda e dois Desembargadores do Paço, com quatro escrivães. O Rei concordou e assim nasceu o Conselho de Portugal[17].

Ainda sobe Domínio Filipino, na área da administração financeira em 20 de Novembro de 1591 vai surgir o Conselho da Fazenda, onde se integram a Casa dos Contos, a Casa da Índia e as Alfandegas, competindo-lhe centralizar todas as matérias financeiras e sendo presidido pelo vedor da fazenda, assistido por quatro conselheiros. Em 1663 passa também a coordenar as matérias referentes às companhias de comércio. Com o Marquês de Pombal, por lei de 22 de Dezembro de 1761, o Conselho transforma-se em mero tribunal de jusrisdição voluntária e contenciosa, passando a competir ao Tesouro Geral ou Erário Régio a centralização de todas as receitas e despesas públicas, extinguindo-se também a Casa dos Contos[18].

A estrutura governamental dos primeiros tempos da República portuguesa altera a designação da Fazenda para Ministério das Finanças[19].

Veadores ou vedores em Portugal

Alguns titulares designados por vedor, cujos cargos eram exercidos no Reino de Portugal e seu império assim como no Brasil Imperial, eram:

Referências

  1. Veador, Dicionário Português (on-line). Edição 1.4 (jan 2016).
  2. (ou vereda). Com a mesma etimologia surge mais tarde o vereador
  3. Veador, Dicionário Português (on-line). Edição 1.4 (jan 2016).
  4. Casa dos Contos (1389-1761), Tribunal de Contas
  5. Diccionario da lingua portugueza, por António de Morais Silva, Na impressão regia, 1831, Volume 2, pág. 868
  6. A atividade financeira da Corte dos reis de Portugal (séculos XIV e XV), por Judite A. Gonçalves de Freitas, Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade / FCT / Universidade do Porto, e-spania, 20 de Fevereiro de 2015
  7. Casa dos Contos (1389-1761), Tribunal de Contas
  8. A atividade financeira da Corte dos reis de Portugal (séculos XIV e XV), por Judite A. Gonçalves de Freitas, Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade / FCT / Universidade do Porto, e-spania, 20 de Fevereiro de 2015
  9. A atividade financeira da Corte dos reis de Portugal (séculos XIV e XV), por Judite A. Gonçalves de Freitas, Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade / FCT / Universidade do Porto, e-spania, 20 de Fevereiro de 2015
  10. A viagem de Francisco Pyrard Laval, por Marco Monteiro, Cadernos da História
  11. A Chancelaria Régia e os seus Oficiais (1464-1465), por Helena Maria Matos Monteiro, Dissertação de mestrado em História Medieval, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto
  12. Estrutura do Governo, História portuguesa, por José Adelino Maltez, Respublica, Repertório Português de Ciência Política, Edição electrónica 2004, Última revisão em: 20-01-2009
  13. A origem da Vedoria da Fazenda remonta ao ofício de porteiro-mor a que sucederam os ouvidores da portaria nos finais do reinado de D. Dinis (1321), consolidando-se nos inícios do reinado de Afonso IV (1325-1357) e de Pedro I (1357-1367), competindo-lhes a cobrança das rendas e tributos dos bens da Coroa - A atividade financeira da Corte dos reis de Portugal (séculos XIV e XV), por Judite A. Gonçalves de Freitas, Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade / FCT / Universidade do Porto, e-spania, 20 de Fevereiro de 2015; citando António Henrique de Oliveira Marques, «Fazenda Pública na Idade Média», in : Joel Serrão (dir.), Dicionário de História de Portugal, Porto: Livraria Figueirinhas, 1985, vol. 2
  14. Estrutura do Governo, História portuguesa, por José Adelino Maltez, Respublica, Repertório Português de Ciência Política, Edição electrónica 2004, Última revisão em: 20-01-2009
  15. A atividade financeira da Corte dos reis de Portugal (séculos XIV e XV), por Judite A. Gonçalves de Freitas, Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade / FCT / Universidade do Porto, e-spania, 20 de Fevereiro de 2015
  16. A atividade financeira da Corte dos reis de Portugal (séculos XIV e XV), por Judite A. Gonçalves de Freitas, Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade / FCT / Universidade do Porto, e-spania, 20 de Fevereiro de 2015
  17. Do Conselho de Estado ao Actual Supremo Tribunal Administrativo, por Maria da Glória Ferreira Pinto Dias Garcia, nota 22, Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, Lisboa, 20 de Março de 1998
  18. Estrutura do Governo, História portuguesa, por José Adelino Maltez, Respublica, Repertório Português de Ciência Política, Edição electrónica 2004, Última revisão em: 20-01-2009
  19. Estrutura do Governo, História portuguesa, por José Adelino Maltez, Respublica, Repertório Português de Ciência Política, Edição electrónica 2004, Última revisão em: 20-01-2009
  20. Cargos e Dignidades da Casa Real Portuguesa, por José J. X. Sobral, Audaces, 2 de Novembro de 2018
  21. Cargos e Dignidades da Casa Real Portuguesa, por José J. X. Sobral, Audaces, 2 de Novembro de 2018
  22. Cargos e Dignidades da Casa Real Portuguesa, por José J. X. Sobral, Audaces, 2 de Novembro de 2018
  23. Cargos e Dignidades da Casa Real Portuguesa, por José J. X. Sobral, Audaces, 2 de Novembro de 2018
  24. Diccionario da lingua portugueza, por António de Morais Silva, Na impressão regia, 1831, Volume 2, pág. 868
  25. A Chancelaria Régia e os seus Oficiais (1464-1465), por Helena Maria Matos Monteiro, Dissertação de mestrado em História Medieval, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto
  26. A Chancelaria Régia e os seus Oficiais (1464-1465), por Helena Maria Matos Monteiro, Dissertação de mestrado em História Medieval, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto
  27. Cargos e Dignidades da Casa Real Portuguesa, por José J. X. Sobral, Audaces, 2 de Novembro de 2018

Ver também