Travestimento de gênero

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 Nota: Não confundir com travesti, nem com transexualidade.

Transvestismo[1], travestismo ou travestimento[2] é o ato de vestir-se com as roupas e acessórios de um membro do sexo oposto.[3] O termo se refere comumente a pessoas que foram designadas ao gênero masculino, que são a maioria a apresentar esse comportamento.[1] :266

Na Psicologia e Psiquiatria, o diagnóstico de transtorno transvéstico só é aplicado aos indivíduos que tiverem os sintomas de um transtorno parafílico, ou seja, se o ato causa sofrimento ao indivíduo. O transvestismo também é diferente da transgeneridade, uma vez que os indivíduos normalmente são cisgêneros.[1]

História[editar | editar código-fonte]

Há registros do termo em francês desde o século XIX,[4] o qual foi importado ao português,[5] entretanto o fenômeno não é novo e é referido na Bíblia hebraica.[6]

Magnus Hirschfeld, já no século XX, é muitas vezes creditado por cunhar a palavra em inglês "transvestite" (do Latim trans-, "sobre, cruzado" e vestitus, "vestido") para se referir ao interesse sexual em cross-dressing.[7] Ele usou o termo para descrever pessoas que habitualmente e voluntariamente usavam roupas do gênero oposto. O grupo de travestis de Hirschfeld consistia em homens e mulheres, com orientações sexuais heterossexuais, homossexuais e bissexuais.[8]

Hirschfeld não estava feliz com o termo, ele acreditava que a vestimenta era apenas um símbolo externo escolhido com base em várias situações psicológicas internas.[7] Na verdade, Hirschfeld ajudou as pessoas a alcançarem as primeiras mudanças de nome e a realizar o primeiro relato de cirurgia de redesignação sexual. Portanto, o termo "travesti" de Hirschfeld foram, em termos de hoje, não eram apenas travestis, mas uma variedade de pessoas do espectro transgênero.[7]

Hirschfeld também notou que a excitação sexual era associada frequentemente ao travestismo.[7] Na terminologia mais recente, isso é às vezes chamado de fetichismo travesti.[9] Hirschfeld também distinguiu claramente entre o travestismo como uma expressão de (trans) sentimentos "contrassexuais" de uma pessoa e comportamento fetichista, mesmo que este último envolvido vestisse roupas do outro sexo.[7]

Cultura[editar | editar código-fonte]

Em algumas culturas, o travestismo é praticada por razões religiosas, tradicionais ou cerimoniais. Por exemplo, na Índia, alguns devotos do sexo masculino do deus hindu Krishna, especialmente em Mathura e Vrindavan, vestiam-se com roupas do sexo feminino para posar como sua consorte, a deusa Radha, como um ato de devoção.[10] Na Itália, o napolitana femminielli ("machos femininos") usa vestidos de casamento, chamado de matrimonio dei femminielli ("casamento do femminielli") e uma procissão tem lugar pelas ruas, uma tradição que, aparentemente, tem origens pagãs.[11]

Definições[editar | editar código-fonte]

Dentro das ciências da medicina e da psicologia o travestismo frequentemente é subdividido em algumas categorias, entre elas: travestismo fetichista, travestismo exibicionista e travestismo transexual ou wisley.[12][13][14]

O travestismo fetichista caracteriza-se por vestir roupas do sexo oposto com o objetivo principal de obter excitação sexual e de criar a aparência de pessoa do sexo oposto.[15] Nesse contexto é comum haver um certo arrependimento após o orgasmo caracterizado, por exemplo, pela necessidade de se remover as roupas do sexo oposto com o declínio da excitação sexual.[14] Em abordagem semelhante considera-se o travestismo fetichista como uma um transtorno de "Personalidade Ansiosa ou Esquiva" caracterizada, por exemplo, por uma certa angústia, tensão, apreensão, insegurança e inferioridade associado a um desejo permanente de ser amado e aceito.[13] Em comum nessas abordagens destaca-se um certo sofrimento associado ao ato de travestir-se, motivo que provavelmente justifica a visão de que o travestismo fetichista pode ser considerada uma patologia psiquiátrica de longa duração. Na Classificação Internacional de Doenças da OMS (CID) o termo travestismo é abordado em dois tópicos: “travestismo fetichista” (F65.1) e “transtornos múltiplos da preferência sexual” (F65.6).[16]

No travestismo fetichista, o paciente do sexo masculino se veste como mulher para gerar excitação sexual nele mesmo, a qual leva à relação sexual heterossexual ou à masturbação.[17]

O travestismo fetichista difere da transexualidade enquanto identidade de gênero, caracterizada pelo desejo de viver e ser aceito como sendo de um gênero diferente; transexuais, travestis e alguns crossdressers podem manifestar esse desejo, travestindo-se ocasionalmente ou no dia-a-dia e eventualmente assumir integralmente uma identidade do sexo oposto. O travestismo fetichista pode estar presente nas etapas iniciais do travestismo transexual.[13]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c Susan Krauss Whitbourne; Richard P. Halgin (2015). Psicopatologia - 7ed. AMGH Editora. p. 292. ISBN 978-85-8055-487-8.
  2. De Oliveira, Wellington Do Rosário (27 de dezembro de 2021). «Travestimento, gênero e a arte do disfarce:». Semina - Revista dos Pós-Graduandos em História da UPF (3): 75–99. ISSN 2763-8804. doi:10.5335/srph.v20i3.13054. Consultado em 15 de julho de 2023 
  3. Andrew M. Colman (2015). A Dictionary of Psychology. OUP Oxford. p. 780. ISBN 978-0-19-105784-7.
  4. Nicolas), Bescherelle (M , Louis; Bescherelle, H. (1843). Dictionnaire usuel de tous les verbes français: tant réguliers qu'irréguliers, entièrement conjugués, contenant par ordre alphabétique les 7,000 verbes de la langue française avec leur conjugaison complète, et la solution analytique et raisonnée de toutes les difficultés auxquelles ils peuvent donner lieu (em francês). II. [S.l.]: Chez Breteau & Pichery. p. 896 
  5. «travesti». Infopédia 
  6. Aggrawal, Anil. (abril de 2009). «References to the paraphilias and sexual crimes in the Bible». J Forensic Leg Med. 16 (3): 109–14. PMID 19239958. doi:10.1016/j.jflm.2008.07.006 
  7. a b c d e Hirschfeld, Magnus: Die Transvestiten. Berlin 1910: Alfred Pulvermacher
    Hirschfeld, Magnus. (1910/1991). Transvestites: The erotic drive to cross dress. (M. A. Lombardi-Nash, Trans.) Buffalo, NY: Prometheus Books.
  8. Hirschfeld, Magnus. Geschlechtsverirrungen, 10th Ed. 1992, page 142 ff.
  9. American Psychiatric Association (2013). Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders: DSM-5 Fifth ed. Arlington, Virginia: American Psychiatric Publishing. pp. 685–705. ISBN 978-0-89042-555-8. OCLC 847226928 
  10. Meet the crossdresser saints of UP Arquivado em 11 de maio de 2015, no Wayback Machine.. CNN-IBN.
  11. Il mondo del "femminiello", cultura e tradizione. TorreSette.it. Retrieved 21 January 2013
  12. Matilde Josefina Sutter (1993). Determinação e mudança de sexo. Aspectos médico-legais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 173 páginas. 85-203-1104-1 
  13. a b c «Personalidade Ansiosa ou Esquiva - CID 10». PsiqWeb. Consultado em 12 de fevereiro de 2010 
  14. a b «F65 Transtornos da preferência sexual». UFPel/FAU. Consultado em 12 de fevereiro de 2010 
  15. Benjamin J. Sadock; Virginia A. Sadock (2016). Compêndio de Psiquiatria: Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica. p. 770. ISBN 978-85-363-0861-6.
  16. «ICD Version 2007: Mental and behavioural disorders». World Health Organization. Consultado em 2 de maio de 2008 
  17. Glen O. Gabbard (2015). Psiquiatria Psicodinâmica na Prática Clínica. (5 ed.). Artmed. p. 296. ISBN 978-85-8271-280-1.