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Estudos de histórias em quadrinhos

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Estudos de histórias em quadrinhos é uma área de pesquisa acadêmica que foca nos quadrinhos (ou banda desenhada) e arte sequencial.[1][2]

Os estudos de histórias em quadrinhos não devem ser confundidos com os aspectos técnicos da criação de quadrinhos. No caso, os estudos se relacionam com a teoria da criação dos quadrinhos (abordando os quadrinhos criticamente como arte) a escrita da historiografia dos quadrinhos (o estudo da história dos quadrinhos).[3] A teoria dos quadrinhos também se relaciona com a filosofia dos quadrinhos, ou seja, o estudo da ontologia,[4][5] epistemologia[6] e estética[7] dos quadrinhos, assim como a relação entre quadrinhos e outras formas de arte, e a relação entre texto e imagem em quadrinhos.[4]

Os estudos em quadrinhos também estão relacionados com a crítica de quadrinhos, a análise e avaliação dos quadrinhos e o meio dos quadrinhos.[8]

Teoria dos quadrinhos

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Na primeira metade do século XX, ocorreram eventuais investigações sobre os quadrinhos como uma forma de arte válida, especificamente em The 7 Lively Arts (1924), de Gilbert Seldes, Comics and Their Creators (1942), de Martin Sheridan, e The Early Comic Strip: Narrative Strips and Picture and Picture Stories in the European Broadsheet from c. 1450 to 1825, de David Kunzle. Na Europa, as primeiras tentativas de um sistema geral de semiótica dos quadrinhos foram os trabalhos de Roland Barthes (particularmente seu ensaio de 1964, "Rhetoric of the Image") e Umberto Eco (principalmente seu livro de 1964, Apocalípticos e Integrados). Já os estudos anglófonos nos Estados Unidos cresceram na cena acadêmica com os livros Quadrinhos e Arte Sequencial (1985), de Will Eisner, e Desvendando os Quadrinhos (1993), de Scott McCloud.[9][10][11]

Mais recentemente, a análise de quadrinhos começou a ser realizada por cientistas cognitivos, sendo o mais proeminente Neil Cohn, que usou ferramentas da linguística para detalhar a estrutura teórica da "linguagem visual" subjacente dos quadrinhos e também usou experimentação psicológica de neurociência para testar essas teorias na compreensão real. Este trabalho sugeriu semelhanças entre a forma como o cérebro processa a linguagem e a forma como processa imagens sequenciais. As teorias de Cohn, contudo, não são universalmente aceitas, com outros estudiosos como Thierry Groensteen, Hannah Miodrag e Barbara Postema oferecendo entendimentos alternativos.[12]

A primeira iniciativa relacionada ao estudo dos quadrinhos no Brasil ocorreu em 1951, com a Primeira Exposição Internacional de Histórias em Quadrinhos, realizada em São Paulo e organizada por estudiosos como Álvaro de Moya, Reynaldo de Oliveira, Syllas Roberg, Miguel Penteado e Jayme Cortez. Além da exposição de desenhos originais de autores de diversos países, houve destaque para a tentativa de uma abordagem científica, buscando auxílio principalmente em teorias ligadas ao cinema.[13][14]

Dentre os organizadores, apenas Moya seguiu a carreira acadêmica, sendo professor colaborador na ECA-USP de 1970 a 1991 e autor do livro Shazam! (1970), primeira antologia de textos críticos sobre quadrinhos no Brasil e que contou com o primeiro relato histórico sobre os quadrinhos nacionais, com menção aos principais autores e editores.[14]

Contudo, o estudo acadêmico considerado pioneiro no Brasil ocorreu por volta de 1967 no Centro de Pesquisas da Comunicação Social da Faculdade Cásper Líbero, fundado por José Marques de Melo. Em um dos grupos deste centro, foi feito um levantamento do conteúdo dos gibis brasileiros, tendo o resultado sido publicado no livro Comunicação Social: teoria e pesquisa (1970). Além disso, na mesma época Melo também incluiu uma disciplina sobre histórias em quadrinhos na grade curricular dos cursos de Jornalismo e Editoração da ECA-USP, onde também instituiu, em 1990, o Núcleo de Pesquisa em História em Quadrinhos (atual Observatório de Histórias em Quadrinhos).[13][15] [14]

Instituições acadêmicas

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Os estudos em quadrinhos estão se tornando cada vez mais comuns em instituições acadêmicas em todo o mundo. Alguns exemplos notáveis ​​incluem: Universidade Estadual de Ohio,[16] Universidade da Flórida,[17] Universidade de Toronto Mississauga,[18] e University of California at Santa Cruz,[19] entre outros. Na Grã-Bretanha, o crescente interesse em quadrinhos levou ao estabelecimento de um centro de estudos de quadrinhos, o Centro Escocês de Estudos de Quadrinhos (SCCS, na sigla em inglês) na Universidade de Dundee, na Escócia.[20] Além de programas formais e graduações, é comum ver cursos individuais dedicados a quadrinhos e romances gráficos em diversas instituições de ensino.[21]

A tese Culture and the Comic Strips, de Sol M. Davidson (Universidade de Nova Iorque) foi o primeiro Doutorado de quadrinhos em 1959.[22][23] Na França, Jean-Christophe Menu recebeu um Doutorado em Arte e Ciências da Arte em 2011 pela Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne após defender sua tese La bande dessinée et son double : langage et marges de la bande dessinée : perspectives pratiques, théoriques et éditoriales.[24][25]

Sociedades científicas

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Além de sua presença em instituições acadêmicas, os quadrinhos também têm sido estudados em sociedades científicas interdisciplinares. A primeira associação estadunidense dedicada a apoiar o estudo da narrativa gráfica e da arte sequencial foi a Comics Studies Society (CSS), criada em 2014 durante a ICAF. Outras sociedades anglófonas que podem ser mencionadas são British Consortium of Comics Scholars (BCCS, criada em 2012 por Paul Davies), Scottish Centre for Comics Studies (SCCS) e Canadian Society for the Study of Comics (CSSC, criada em outubro de 2010 por Sylvain Rheault).[26][27][28][29]

Sociedades científicas nas Américas

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Canadian Society for the Study of Comics

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A primeira sociedade científica sobre quadrinhos no continente americano foi a Canadian Society for the Study of Comics (CSSC, "Sociedade Canadense para o Estudo de Quadrinhos" em inglês), também conhecida pelo nome em francês Société Canadienne pour l'Étude de la Bande Dessinée (SCEBD). É uma comunidade bilíngue de acadêmicos focada em discutir todos os aspectos dos quadrinhos como forma de arte e fenômeno cultural fundada em outubro de 2010 pelo professor Sylvain Rheault da Universidade de Regina. A CSSC é focada principalmente em estudos sobre os quadrinhos canadenses, mas é aberta para associados internacionais. Entre outras atividades, o CSSC/SCEBD organiza uma conferência acadêmica durante o Toronto Comic Arts Festival.[28][30]

Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial

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Em 31 de março de 2012, a Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial (ASPAS) foi fundada no Brasil em 31 de março de 2012 durante o 1º Fórum Nacional de Pesquisadores em Arte Sequencial (FNPAS), um evento promovido na cidade de Leopoldina. Além de eventos regulares, a ASPAS também promove diversas atividades acadêmicas, como o Encontro de Quadrinhistas com Trina Robbins, realizado em 2015 na Gibiteca Henfil, em São Paulo, e em 2017 na Universidade Federal do Rio de Janeiro.[31][32][33][34]

Comics Studies Society

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Em novembro de 2014, durante o Fórum Internacional de Artes em Quadrinhos (ICAF), o professor Charles Hatfield, da Universidade do Estado da Califórnia em Northridge, fez uma moção para criar a Comics Studies Society como uma associação interdisciplinar aberta a acadêmicos, não acadêmicos ou acadêmicos independentes, professores e alunos com o objetivo promover o estudo crítico dos quadrinhos.[35][36][29][37][38]

Em uma reunião dentro do Billy Ireland Cartoon Library & Museum, o primeiro Comitê Executivo do CSS foi oficialmente votado e os principais focos do CSS foram definidos como "promover o estudo crítico dos quadrinhos, melhorar o ensino de quadrinhos e se envolver em conversas abertas e contínuas sobre os quadrinhos mundo". A CSS também publica a revista INKS (desde 2017), organiza a Conferência Anual da Comics Studies Society (desde 2018) e premia estudos, livros e artigos de quadrinhos com cinco prêmios anuais: o CSS Article Prize, o Hillary Chute Award for Best Graduate Student Paper, o Gilbert Seldes Prize for Public Scholarship, o Charles Hatfield Book Prize e o CSS Prize for Edited Book Collections.[39][40][37]

Conferências

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Embora seja comum ocorrer apresentações dedicadas aos quadrinhos em conferências acadêmicas das mais variadas áreas, conferências inteiras dedicadas a esse assunto estão se tornando mais comuns. Algumas de maior destaque internacional são a International Comic Arts Forum (organizada pela Escola do Art Institute of Chicago), The International Bande Dessinée Society Conference (Universidade Metropolitana de Manchester), Sequential Art Studies Conference (Universidade de Tecnologia de Sydney), Festival of Cartoon Art (Universidade de Georgetown e Universidade Estadual de Ohio),[41] Comics in Popular Culture conference (Universidade de Bowling Green State).[42] e Conference on Comics and Graphic Novels (Universidade da Flórida).[43]

O International Comic Arts Forum (ICAF), cuja primeira edição ocorreu em 1995 na Universidade de Georgetown, é considerado uma das primeiras iniciativas acadêmicas para o estudo dos quadrinhos.[44] A alemã Gesellschaft für Comicforschung ("Sociedade para pesquisa em quadrinhos", em tradução livre) organiza conferências acadêmicas anuais desde 2006.[45] A Comics Arts Conference também ocorre regularmente, desde 1992, em paralelo com a San Diego Comic-Con e a WonderCon.[46]

Referências

  1. International Journal of Comic Art, volume 7, 2005, p. 574.
  2. Pramod K. Nayar, The Indian Graphic Novel: Nation, History and Critique, Routledge, 2016, p. 13.
  3. Benoît Crucifix, "Redrawing Comics into the Graphic Novel: Comics Historiography, Canonization, and Authors' Histories of the Medium", "Whither comics studies?" panel, International conference of the French Association for American Studies, Toulouse (France), May 24–27, 2016.
  4. a b Meskin, Aaron (2011). «The Philosophy of Comics». Philosophy Compass. 6 (12): 854–864. doi:10.1111/j.1747-9991.2011.00450.x 
  5. Iain Thomson, in his "Deconstructing the Hero" (in Jeff McLaughlin, ed., Comics as Philosophy (Jackson: University Press of Mississippi, 2005), pp. 100–129), develops the concept of comics as philosophy.
  6. Meskin, Aaron and Roy T. Cook (eds.), The Art of Comics: A Philosophical Approach, Wiley-Blackwell, 2012, p. xxxi.
  7. David Carrier, The Aesthetics of Comics, Penn State University Press, 2000, Part 1: "The Nature of Comics."
  8. Bramlett, Frank, Roy Cook and Aaron Meskin (eds.), The Routledge Companion to Comics, Routledge, 2016, p. 330.
  9. Umberto Eco, Apocalittici e integrati: comunicazioni di massa e teorie della cultura di massa, Bompiani, 1964. Cf. also: Umberto Eco (1972). "Epilogue", in: Walter Herdeg and David Pascal (eds.): The Art of the Comic Strip, Zurich: The Graphis Press.
  10. Roland Barthes, "Rhétorique de l'image", Communications 4(1), 1964, pp. 40–51, translated as "Rhetoric of the Image", in: Roland Barthes, Image–Music–Text, essays selected and translated by Stephen Heath, New York 1977, pp. 32–51.
  11. Jochen Ecke, Gideon Haberkorn (eds.), Comics as a Nexus of Cultures: Essays on the Interplay of Media, McFarland, 2010, p. 238.
  12. Neil Cohn, The Visual Language of Comics: Introduction to the Structure and Cognition of Sequential Images, London: Bloomsbury, 2013, p. 1ff.
  13. a b «Trajetória da pesquisa em HQs no Brasil é tema de lançamentos da ECA». USP. 4 de outubro de 2013 
  14. a b c «Análise da pesquisa em HQs no Brasil: a contribuição da ECA-USP». Intexto (UFRGS). 26 de agosto de 2021 
  15. «Histórias em quadrinhos: panorama histórico, características e verbo-visualidade». Darandina (UFJF). 13 de setembro de 2019 
  16. «Comics Studies @ OSU | Popular Culture Studies» 
  17. «UF | Comics Studies | Studying Comics at UF». English.ufl.edu. 4 de abril de 2007. Consultado em 23 de novembro de 2009 
  18. Visual Culture Studies - University of Toronto Mississauga.
  19. Spiegelman, Art. "Comix 101." Lecture. Porter College, University of California, Santa Cruz, April 1992.
  20. «Scottish Centre for Comics Studies». scottishcomicstudies.com. Consultado em 28 de novembro de 2016 
  21. «UF | Comics Studies | Teaching Comics». English.ufl.edu. 9 de abril de 2007. Consultado em 23 de novembro de 2009 
  22. Sol M. Davidson. Culture and the Comic Strips. Ph.D. diss., New York University, 1959.
  23. Sol & Penny Davison Collection - George A. Smathers Libraries.
  24. Article about Jean-Christophe Menu presenting his thesis at the Sorbonne.
  25. Theses.fr: La bande dessinée et son double : langage et marges de la bande dessinée : perspectives pratiques, théoriques et éditoriales.
  26. «About». Official website of British Consortium of Comics Scholars 
  27. «Comic Studies in the UK and Beyond – Learning the Comic Art». downthetubes 
  28. a b Canadian Graphic: Picturing Life Narratives. [S.l.: s.n.] 2016 
  29. a b The Secret Origins of Comics Studies. [S.l.: s.n.] 2017 
  30. «Comics, Education, and Libraries». American Libraries Magazine. 24 de maio de 2017 
  31. «Livro 'Arte Sequencial e seus Multiversos Conceituais' terá lançamento no Museu Espaço dos Anjos». Jornal Leopoldinense. 3 de setembro de 2018 
  32. «ASPAS - 10 anos fomentando a cultura no Brasil». O Barquinho Cultural. 5 de abril de 2022 
  33. «Elas fazem HQ!: mulheres brasileiras no campo das histórias em quadrinhos independentes». Universidade Federal de Santa Catarina. 2017 
  34. «Trina Robbins em dois eventos no Rio de Janeiro». Universo HQ. 26 de setembro de 2017 
  35. «About the Comics Studies Society». Comics Studies Society official website 
  36. «Comics Studies Society goes public on Feb. 14, 2016, launches its founding membership drive». SciFi Pulse. 15 de fevereiro de 2016 
  37. a b «Washington People: Rebecca Wanzo». Washington University in St.Louis. 3 de fevereiro de 2017 
  38. Keywords for Comics Studies. [S.l.: s.n.] 2021. 2 páginas 
  39. «About the Comics Studies Society Prizes». Comics Studies Society official website 
  40. «Annoucement of open membership for new Comics Studies Society». Sacred and Sequential. 19 de fevereiro de 2016 
  41. "Regularly Held Conferences".
  42. Robert G. Weiner (ed.), Graphic Novels and Comics in Libraries and Archives: Essays on Readers, Research, History and Cataloging, McFarland, 2010, p. 264.
  43. «Comics Conference». www.english.ufl.edu. Consultado em 21 de novembro de 2009. Arquivado do original em 29 de novembro de 2009 
  44. Matthew Smith; Randy Duncan (19 de setembro de 2017). The Secret Origins of Comics Studies. [S.l.]: Taylor & Francis. 316 páginas. ISBN 978-1-317-50578-5 
  45. «Gesellschaft für Comicforschung». Consultado em 22 de outubro de 2010. Arquivado do original em 18 de julho de 2011 
  46. The Comics Arts Conference and Public Humanities.