Domitila de Carvalho
Domitila de Carvalho | |
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Nascimento | 10 de abril de 1871 Travanca |
Morte | 11 de novembro de 1966 (95 anos) |
Cidadania | Portugal, Reino de Portugal |
Ocupação | médica, política |
Domitila (Domitilla na grafia Portuguesa antiga[1]) Hormizinda Miranda de Carvalho (Feira, Travanca, 10 de Abril de 1871 — Lisboa, Prazeres, 11 de Novembro de 1966) foi uma médica, professora, escritora e política Portuguesa, tendo sendo a primeira mulher a frequentar a Universidade de Coimbra, onde se formou em três áreas distintas (Matemática, Filosofia e Medicina), e uma das primeiras três deputadas eleitas em Portugal ao integrar, em 1934, a lista dos deputados escolhidos pela União Nacional para a I Legislatura da Assembleia Nacional.[2] Foi poetisa e sócia da Academia das Ciências de Lisboa. Era monárquica e amiga da Rainha D. Amélia, com quem trocava correspondência.[3]
Biografia
[editar | editar código-fonte]Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho nasceu em Travanca, concelho da Feira, filha de Manuel Rodrigues de Carvalho, um professor da instrução primária, natural da freguesia de Requeixo, concelho de Aveiro, e de Margarida Rita de Miranda, natural da freguesia de Alquerubim, concelho de Albergaria-a-Velha.[4] Ficou órfã de pai com apenas um ano de idade. Fez os primeiros estudos em Castelo Branco, cujo liceu frequentou, tendo prosseguido estudos nos liceus de Bragança e Leiria. Terminou o ensino liceal em 1891.
Terminado o ensino secundário com excelentes resultados nos exames finais, a instâncias dos professores e da mãe requereu a matrícula ao Magnífico Reitor e tornou-se a primeira mulher, depois da reforma universitária de 1772, a ser admitida na Universidade de Coimbra, onde se matriculou em Outubro de 1891. Como condição para a admissão, foi obrigada, por indicação do reitor, a trajar sempre de negro, com chapéu discreto e de um modo sóbrio de forma a que não se evidenciasse entre os colegas masculinos, obrigatoriamente vestidos de capa e batina botoada.[5]
Iniciou a frequência dos cursos de Matemática e Filosofia, os quais concluiu com distinção em 1894 e 1895, respectivamente. Matriculou-se de seguida no curso de Medicina e até 1896 foi a única aluna da Universidade. Quando se doutorou em Medicina, em 1904, com 16 valores, teve por madrinha a rainha D. Amélia de Orleães.[6]
Concluída a formação universitária, passou a exercer clínica em Lisboa, como médica na Assistência Nacional aos Tuberculosos, mas optou por ingressar num lugar de professora efectiva no Liceu de D. Maria Pia, a primeira escola secundária criada em Portugal para o sexo feminino. Aquela escola ministrava apenas o Curso Geral, pelo que as raparigas que desejassem fazer o Curso Complementar teriam que matricular-se nos liceus masculinos. Ao leccionar a disciplina de Matemática, coube a Domitila de Carvalho, que era a primeira mulher portuguesa licenciada em Matemática, tornar-se também na primeira mulher portuguesa a ser professora daquela disciplina.
Para além de professora de Matemática, foi reitora do Liceu D. Maria Pia desde a sua fundação, em 23 de Fevereiro de 1906, até Novembro de 1912. Até à sua aposentação, continuou a leccionar Matemática no mesmo liceu, que Sidónio Pais elevou a liceu central em 24 de Dezembro de 1917, com o nome de Liceu de Almeida Garrett e que mais tarde adoptou o nome de Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho.
No Liceu D. Maria Pia leccionou várias disciplinas, tendo ficado somente com a disciplina de Matemática quando o Liceu passou a designar-se Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho.
Paralelamente às suas actividades como docente e médica, dedicou-se à escrita, tendo publicado alguns livros de versos, um dos quais foi impresso em Coimbra em 1909 e com prefácio de Afonso Lopes Vieira. Também se dedicou à realização de conferências sobre assuntos literários e de educação. A sua notoriedade levou a que fosse eleita sócia correspondente da Academia das Ciências de Lisboa e feita vogal do Conselho Superior de Instrução Pública. Era também membro destacado da organização dos Médicos Católicos Portugueses e de várias organizações ligadas à Igreja Católica e aos movimentos de beneficência. Em 1936 foi nomeada vogal da direcção da Obra das Mães pela Educação Nacional (OMEN).
A 11 de abril de 1931, foi agraciada com o grau de Comendador da Ordem da Instrução Pública.[7]
Em 1934 foi uma das três mulheres convidadas pela União Nacional para integrarem a lista única de candidatos a deputados na I Legislatura da recém-criada Assembleia Nacional do Estado Novo. A eleição realizou-se em Dezembro de 1934, e durante duas legislaturas (1934-1938 e 1938-1941), foi com Maria Guardiola e Maria Cândida Parreira uma das três primeiras deputadas portuguesas. Tinha 64 anos quando tomou posse do cargo de deputada à Assembleia Nacional.
Monárquica e conservadora, aderiu aos princípios político-ideológicos do Estado Novo, destacando-se no seio da pequena da elite feminina que apoiava o salazarismo nascente. A sua condição de monárquica levou a que fosse a interlocutora entre Salazar e a ex-rainha D. Amélia de Orleães, com quem mantinha correspondência. Apesar das suas visões conservadoras Católicas, ela decidiu assinar em 1909 uma petição a favor do divórcio.
Apesar de nunca ter casado e não ter filhos, demonstrou grande interesse pelas questões infantis e pela problemática da família, proferindo, em Maio de 1936, uma conferência sobre o "Comunismo contra a infância", na qual defendeu o papel educativo da família e condenou o "fanatismo do Estado colectivista", que arrancava as crianças aos pais. Na Assembleia Nacional, interveio sobre mortalidade infantil e esteve na origem da introdução de cursos de frequência obrigatória de higiene geral e de puericultura nos liceus e escolas do ensino secundário femininos. Participou também na discussão sobre a reforma educativa liderada por Carneiro Pacheco (1936), pronunciando-se a favor da obrigatoriedade de afixação do crucifixo nas escolas primárias e contra o ensino laico, responsável, segundo ela, pela desnatalidade que estava a assolar a Europa liberal.[8].
Encontra-se colaboração da sua autoria na revista Serões[9] (1901-1911) e na Mocidade Portuguesa Feminina: boletim mensal[10] (1939-1947).
Morreu a 11 de novembro de 1966, na freguesia dos Prazeres, em Lisboa, aos 95 anos.[4]
Legado
[editar | editar código-fonte]Em 2017, a Universidade de Coimbra, sua alma mater, organizou um ciclo de conferências denominado “Raras e Discretas”, com o objectivo de "dar a conhecer a história e as investigações realizadas sobre o acesso das mulheres ao ensino superior, em particular à Universidade de Coimbra (UC), nos séculos XIX e XX", onde a figura de Domitilla de Carvalho esteve em destaque.[11]
Obras publicadas
[editar | editar código-fonte]Domitila de Carvalho é autora, entre outras, das seguintes obras:
- Para o alto. Porto : [s.n.], 1957.
- Maria Amália Vaz de Carvalho. Lisboa : [s.n.], 1930.
- Versos. Coimbra : F. França Amado, 1909.
- Terra de amores. Coimbra : Coimbra Ed., 1924.
- Lição às alunas do Liceu de Garrett, no 30.º dia do falecimento do Sr. Dr. Sidónio Paes. Lisboa : Oficinas Gráficas Editoras, 1919.
Referências
- ↑ Coimbra, Universidade de. «Raras e Discretas, conhecer um pouco da história das primeiras mulheres da Universidade de Coimbra». uc.pt. Consultado em 7 de setembro de 2023
- ↑ Irene Flunser-Pimentel, História das organizações femininas do Estado Novo. Lisboa : Temas e Debates, 2001, p. 419.
- ↑ «Biografia de Domitilla de Carvalho no Parlamento» (PDF)
- ↑ a b «Livro de registo de baptismos da Paróquia de Travanca (1871-1883)». digitarq.adavr.arquivos.pt. Arquivo Distrital de Aveiro. p. a fls. 7, assento 11
- ↑ Maria Alice Samara, Operárias e Burguesas. As Mulheres no Tempo da República. Lisboa : Esfera dos Livros, 2007.
- ↑ Maria José Remédios, "Domitila Hormizinda de Carvalho" in Zília Osório de Castro & João Esteves (coordenadores), Dicionário no Feminino. Lisboa : Livros Horizonte, 2005, pp. 284-285.
- ↑ «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 1 de agosto de 2020
- ↑ «Nota biográfica de Domitila de Carvalho». historiaeciencia.weblog.com.pt.
- ↑ Rita Correia (24 de Abril de 2012). «Ficha histórica: Serões, Revista Mensal Ilustrada (1901-1911).» (PDF). Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 23 de Setembro de 2014
- ↑ Helena Roldão (2 de maio de 2014). «Ficha histórica: Mocidade Portuguesa Feminina : boletim mensal (1939-1947).» (PDF). Hemeroteca Municipal de Lisboa. Consultado em 27 de Maio de 2014
- ↑ Coimbra, Universidade de. «Raras e Discretas, conhecer um pouco da história das primeiras mulheres da Universidade de Coimbra». uc.pt. Consultado em 7 de setembro de 2023
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Domitila de Carvalho (1871-1966) - Um percurso singular (página inexistente; link de reserva em Archive.org)
- Nota biográfica de Domitila de Carvalho(página inexistente; link de reserva em Archive.org)
- A narratividade educativa na 1ª fase da governação de Oliveira Salazar. A voz das mulheres na Assembleia Nacional portuguesa (1935-1945)(página inexistente; link de reserva em Archive.org)
- Nascidos em 1871
- Mortos em 1966
- Mulheres
- Médicas de Portugal
- Deputados da Assembleia Nacional de Portugal
- Mulheres de Portugal na política
- Poetas de Portugal do século XIX
- Poetas de Portugal do século XX
- Escritoras do século XIX
- Escritoras do século XX
- Poetas
- Mulheres na literatura
- Alumni da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra
- Alumni da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
- Comendadores da Ordem da Instrução Pública
- Académicos da Academia das Ciências de Lisboa
- Monárquicos de Portugal