Tipologia de Myers-Briggs
A tipologia de Myers-Briggs,[1][2] indicador tipológico[3] ou ainda classificação tipológica de Myers-Briggs[4] (do inglês Myers–Briggs Type Indicator - MBTI) é um instrumento utilizado para identificar características e preferências pessoais que utiliza reivindicações pseudocientíficas. Katharine Cook Briggs e sua filha Isabel Briggs Myers[5] desenvolveram o indicador durante a Segunda Guerra Mundial, baseadas nas teorias de Carl Gustav Jung sobre os Tipos Psicológicos.[6] O CPP Inc., editor do instrumento MBTI, o chama de "a avaliação de personalidade mais amplamente utilizada no mundo",[7] com até dois milhões de avaliações administradas anualmente. O CPP e outros defensores afirmam que o indicador atende ou ultrapassa a confiabilidade de outros instrumentos psicológicos[8][9] e inclui relatos do comportamento individual.[10]
Apesar de sua popularidade, a tipologia foi apontada como pseudocientífica por pesquisadores.[11][12][13] Estudos têm encontrado divergências frente à validade, consistência interna e confiabilidade (teste-reteste), mesmo havendo sido observadas algumas oscilações.[14][15] Entretanto, alguns psicólogos acadêmicos criticaram o indicador, afirmando que este "carece de dados válidos convincentes".[16][17][18] O uso do MBTI como um prognosticador do sucesso profissional não recebe suporte em estudos,[19][20] e seu uso com este propósito é expressamente desencorajado no Manual.[21]
Conceitos
[editar | editar código-fonte]Tipo e dicotomia
[editar | editar código-fonte]Um conceito fundamental para o MBTI é "Tipo Psicológico". A ideia é que os indivíduos acham certas maneiras de pensar e agir mais fáceis que as outras. O MBTI postula a existência de quatro pares opostos de maneiras de pensar e agir, chamados dicotomias (dimensões).[22] As preferências são normalmente indicadas por letras maiúsculas que indicam cada uma destas quatro preferências.
As quatro dicotomias
[editar | editar código-fonte]Extroversão | Introversão |
Sensação | iNtuição |
Pensamento (Thinking) | Sentimento (Feeling) |
Julgamento | Percepção |
Os quatro pares de preferências ou "dicotomias" são apresentadas na tabela à direita.
Os termos usados para cada dicotomia têm significados técnicos específicos relacionados ao MBTI, que diferem do seu significado cotidiano. Por exemplo, pessoas com uma preferência para julgamento em relação à percepção não são, necessariamente, mais críticos ou menos perceptivos.
Além disto, o MBTI não mede as aptidões: apenas mostra que uma preferência se sobressai a outra. Uma pessoa que informa alta pontuação para extroversão em relação à introversão não pode ser corretamente descrita como mais extrovertida: ela simplesmente tem uma preferência evidente.
Os 16 tipos
[editar | editar código-fonte]Às quatro dicotomias correspondem 16 tipos psicológicos que podem ser divididos em 4 grupos de temperamentos (ordenados segundo a frequência na população nos Estados Unidos em How Frequent Is My Type?):[23]
SJs ou Guardiões (46,1%) SPs ou artesãos (27%) NTs ou Racionais (10,4%) NFs ou Idealistas (16,5%)
O MBTI é frequentemente utilizado nas áreas de aconselhamento de carreira, pedagogia, dinâmicas de grupo, orientação profissional, treino de liderança, aconselhamento matrimonial e desenvolvimento pessoal, entre outros.[24]
Os 16 tipos são:[25]
- INTP - Lógico
- INTJ - Arquiteto
- ENTJ - Comandante
- ENTP - Inovador
- INFJ - Advogado
- INFP - Mediador
- ENFJ - Protagonista
- ENFP - Ativista
- ISTJ - Logístico
- ISFJ - Defensor
- ESTJ - Executivo
- ESFJ - Cônsul
- ISTP - Virtuoso
- ISFP - Aventureiro
- ESTP - Empresário
- ESFP - Animador
O relatório
[editar | editar código-fonte]O instrumento gera um relatório onde as 4 dicotomias do respondente são representadas niveladamente em um gráfico de barras em que quanto mais longa a barra, mais clara e certa é a preferência. Na sequência, as preferências analisadas serão relacionadas e alinhadas detalhadamente de acordo aos patamares: "Seu estilo de trabalho", "Suas preferências no trabalho", "Seu estilo de comunicação", "Ordem de suas preferências", "Sua abordagem para resolução de problemas".
Precisão e validade
[editar | editar código-fonte][...] uma tarefa importante na interpretação é ajudar os entrevistados com preferências relatadas menos claras a chegar a uma avaliação confortável e precisa de seu tipo. Isso é feito em uma sessão de interpretação principalmente por meio de uma exploração de como as preferências de tipo aparecem nos comportamentos do cliente.
MBTI Manual, Capítulo 6: Interpreting Results of the MBTI and Verifying Type[26]
Apesar de sua popularidade, ele tem sido amplamente considerado como pseudociência pela comunidade científica.[27][28] A validade do MBTI como instrumento psicométrico tem sido objeto de muitas críticas. Relatos da mídia chamaram o teste de "praticamente sem sentido",[29] e "um dos piores testes de personalidade que existem".[30] O psicólogo Adam Grant é especialmente contra o MBTI. Ele o chamou de "a moda que não morre" em um artigo da Psychology Today.[31] O especialista em psicometria Robert Hogan escreveu: "A maioria dos psicólogos de personalidade considera o MBTI pouco mais do que um elaborado biscoito da sorte chinês...".[32] Nicholas Campion comenta que esse é "um exemplo fascinante de 'astrologia disfarçada', mascarada de ciência para reivindicar respeitabilidade".[33]
Estima-se que entre um terço e metade do material publicado sobre o MBTI tenha sido produzido para as conferências especiais do Center for the Application of Psychological Type (que fornece o treinamento no MBTI e é financiado pelas vendas do MBTI) ou como artigos no Journal of Psychological Type (que é editado e apoiado pelos defensores do Myers-Briggs e pelas vendas do indicador).[34] Argumenta-se que isso reflete uma falta de análise crítica.[34] Muitos dos estudos que endossam o MBTI são metodologicamente fracos ou não científicos.[35] Uma revisão de 1996 feita por Gardner e Martinko concluiu que: "Está claro que os esforços para detectar ligações simplistas entre preferências de tipo e eficácia gerencial têm sido decepcionantes. De fato, dada a qualidade mista da pesquisa e os resultados inconsistentes, não é possível chegar a uma conclusão definitiva sobre essas relações."[36][37]
O teste foi comparado a horóscopos, já que ambos se baseiam no efeito Barnum, na lisonja e no viés de confirmação, levando os participantes a se identificarem pessoalmente com descrições que são, de certa forma, desejáveis, vagas e amplamente aplicáveis.[38][39] O MBTI não é recomendado para aconselhamento.[40]
Ver também
[editar | editar código-fonte]- Carl Jung
- Isabel Briggs Myers
- Katharine Cook Briggs
- Personalidade
- Teoria da personalidade
- Tipos Psicológicos (livro)
Referências
- ↑ «O PERFIL PSICOLÓGICO E O ESTILO DE NEGOCIAÇÃO DOS NEGOCIADORES DE ENERGIA ELÉTRICA NO BRASIL» (PDF)
- ↑ «Mapeamento das Relações entre Perfis de Jogadores, Tipos Psicológicos, Emoções e Componentes de Jogos Eletrônicos» (PDF)
- ↑ «Detecção e Correção Automática de Estilos de Aprendizagem em Sistemas Adaptativos para Educação»
- ↑ Fábia Rímoli, Hades, o rei dos ínferos, in: Alvarenga, Maria Zelia (org.) (2007). Mitologia Simbólica: Estruturas da Psique e Regências Míticas. [S.l.]: Casa do Psicólogo. pp. 117 e seg. ISBN 978-85-7396-522-3
- ↑ Myers, Isabel Briggs; Myers, Peter (1995). Gifts Differing: Understanding Personality Type. Peter B. Myers. Mountain View, CA: Davies-Black Publishing. ISBN 0-89106-074-X. OCLC 32051485
- ↑ Jung, Carl Gustav (August 1, 1971). Psychological Types (Collected Works of C.G. Jung, Volume 6. Princeton University Press. ISBN 0-691-09774.
- ↑ «CPP Products». Consultado em 20 de junho de 2009
- ↑ Schaubhut, Nancy A.; Nicole A. Herk and Richard C.Thompson (2009). «MBTI Form M Manual Supplement» (PDF). CPP. 17 páginas. Consultado em 8 de maio de 2010
- ↑ Clack, Gillian; Judy Allen. «Response to Paul Matthews' criticism». Consultado em 14 de maio de 2008. Arquivado do original em 4 de novembro de 2006
- ↑ Tieger, Paul D.; Barron-Tieger, Barbara (1995). Do what you are: discover the perfect career for you through the secrets of personality type. Barbara Barron-Tieger 2nd ed ed. Boston: Little, Brown. ISBN 0-316-84522-1. OCLC 32310807
- ↑ «How thousands of companies ended up using a bogus psychology test on their staff». The Independent (em inglês). 12 de outubro de 2022. Consultado em 5 de maio de 2023
- ↑ Chen, Angus. «How Accurate Are Personality Tests?». Scientific American (em inglês). Consultado em 5 de maio de 2023
- ↑ Burnett, Dean (19 de março de 2013). «Nothing personal: The questionable Myers-Briggs test». The Guardian (em inglês). ISSN 0261-3077. Consultado em 5 de maio de 2023
- ↑ Thompson, Bruce; Borrello, Gloria M. (setembro de 1986). «Construct Validity of the Myers-Briggs Type Indicator». Educational and Psychological Measurement. 46 (3): 745–752. ISSN 0013-1644. doi:10.1177/0013164486463032. Consultado em 4 de fevereiro de 2022
- ↑ Capraro, Robert M.; Capraro, Mary Margaret (agosto de 2002). «Myers-Briggs Type Indicator Score Reliability Across: Studies a Meta-Analytic Reliability Generalization Study». Educational and Psychological Measurement. 62 (4): 590–602. ISSN 0013-1644. doi:10.1177/0013164402062004004. Consultado em 4 de fevereiro de 2022
- ↑ Hunsley J, Lee CM, Wood JM (2004). Controversial and questionable assessment techniques. Science and Pseudoscience in Clinical Psychology, Lilienfeld SO, Lohr JM, Lynn SJ (eds.). Guilford, ISBN 1-59385-070-0, p. 65.
- ↑ McCrae, R. R.; Costa, P. T. (março de 1989). «Reinterpreting the Myers-Briggs Type Indicator from the perspective of the five-factor model of personality». Journal of Personality. 57 (1): 17–40. ISSN 0022-3506. PMID 2709300. doi:10.1111/j.1467-6494.1989.tb00759.x. Consultado em 4 de fevereiro de 2022
- ↑ Stricker, Lawrence J.; Ross, John (janeiro de 1964). «An assessment of some structural properties of the Jungian personality typology.». The Journal of Abnormal and Social Psychology (em inglês). 68 (1): 62–71. ISSN 0096-851X. doi:10.1037/h0043580. Consultado em 4 de fevereiro de 2022
- ↑ Pittenger, David J. (novembro de 1993). «Measuring the MBTI...And Coming Up Short.» (PDF). Journal of Career Planning and Employment (em inglês). 54 (1): 48–52
- ↑ Nowack, K. (1996). Is the Myers Briggs Type Indicator the Right Tool to Use? Performance in Practice, American Society of Training and Development, Fall 1996, 6
- ↑ Myers, Isabel Briggs; McCaulley Mary H.; Quenk, Naomi L.; Hammer, Allen L. (1998). MBTI Manual (A guide to the development and use of the Myers Briggs type indicator). [S.l.]: Consulting Psychologists Press; 3rd ed edition. ISBN 0-89106-130-4
- ↑ Myers, Isabel Briggs; McCaulley Mary H.; Quenk, Naomi L.; Hammer, Allen L. (1998). MBTI Manual (A guide to the development and use of the Myers Briggs type indicator). Consulting Psychologists Press; 3rd ed edition. ISBN 0-89106-130-4
- ↑ «The Myers & Briggs Foundation - How Frequent Is My Type». www.myersbriggs.org. Consultado em 4 de fevereiro de 2022
- ↑ «DinamicaSocial.com is for sale». HugeDomains (em inglês). Consultado em 28 de julho de 2021
- ↑ NERIS Analytics Limited. «16personalities»
- ↑ Myers, Isabel Briggs (2003). MBTI manual: a guide to the development and use of the Myers-Briggs Type Indicator (em inglês) 3.ª ed. Mountain View, California: CPP. p. 116. ISBN 978-0-89106-130-4
- ↑ Stein & Swan 2019.
- ↑ Schweiger, David M. (1 de agosto de 1985). «Measuring managerial cognitive styles: On the logical validity of the Myers-Briggs Type Indicator». Journal of Business Research (em inglês). 13 (4): 315–328. ISSN 0148-2963. doi:10.1016/0148-2963(85)90004-9
- ↑ Eveleth, Rose (26 de março de 2013). «The Myers-Briggs Personality Test Is Pretty Much Meaningless» (em inglês). smithsonianmag.com
- ↑ Chen, Angus (janeiro de 2019). «How Accurate Are Personality Tests?». Scientific American (em inglês). Consultado em 30 de outubro de 2020
- ↑ Grant 2013.
- ↑ Hogan, Robert (2007). Personality and the fate of organizations (em inglês). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates. p. 28. ISBN 978-0-8058-4142-8. OCLC 65400436
- ↑ Campion, Nicholas (2009). A History of Western Astrology (em inglês). II. London: Continuum Books. p. 259. ISBN 978-1-84725-224-1
- ↑ a b Coffield F, Moseley D, Hall E, Ecclestone K (2004). «Learning styles and pedagogy in post-16 learning: A systematic and critical review» (PDF) (em inglês). Learning and Skills Research Centre. Arquivado do original (PDF) em 5 de dezembro de 2008
- ↑ Gardner & Martinko 2016.
- ↑ Gardner & Martinko 2016, p. 77.
- ↑ Pittenger, David J (2005). «Cautionary comments regarding the Myers-Briggs Type Indicator». Consulting Psychology Journal: Practice and Research (em inglês). 57 (3): 210–221. doi:10.1037/1065-9293.57.3.210
- ↑ Whitbourne, Susan Krauss (4 de janeiro de 2014). «What You Don't Know about This Personality Test Can Hurt You» (em inglês). Psychology Today. Consultado em 29 de março de 2024
- ↑ «A Critique of The Myers Briggs Type Indicator (MBTI) – Part Two: a Personal Review» (em inglês). Consultado em 11 de agosto de 2019. Cópia arquivada em 11 de agosto de 2019
- ↑ Healy, Charles C. (abril de 1989). «Negative: The MBTI: Not Ready for Routine Use in Counseling». Journal of Counseling & Development (em inglês). 67 (8): 487–488. doi:10.1002/j.1556-6676.1989.tb02125.x
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Assis, Renata. Revista VocêRH, 1 de outubro de 2012. "Por que mudar um time que está ganhando?" revistavocerh.abril.com.br
- Bourne, Dana (2005); Personality Types and the Transgender Community. Retrieved November 14, 2005
- Falt, Jack; Bibliography of MBTI/Temperament Books by Author. Retrieved December 20, 2004
- Gardner, William L; Martinko, Mark J (2016). «Using the Myers-Briggs Type Indicator to Study Managers: A Literature Review and Research Agenda». Journal of Management (em inglês). 22 (1): 45–83. doi:10.1177/014920639602200103
- Georgia State University; GSU Master Teacher Program: On Learning Styles Arquivado em 20 de novembro de 2004, no Wayback Machine.. Retrieved December 20, 2004.
- Grant, Adam (2013). «Goodbye to MBTI, the Fad That Won't Die». Psychology Today (em inglês). Consultado em 19 de março de 2018
- Jung, Carl Gustav (1965); Memories, Dreams, Reflections. Vintage Books: New York, 1965. p. 207
- Matthews, Paul (2004); The MBTI is a flawed measure of personality. bmj.com Rapid Responses. Retrieved February 9, 2005
- Myers, Isabel Briggs (1980); en:Gifts Differing: Understanding Personality Type. Davies-Black Publishing; Reprint edition (May 1, 1995). ISBN 0-89106-074-X
- Pearman, R., Lombardo, M. Eichinger, R.;(2005); "YOU: Being More Effective In Your MBTI(R) Type." Minn.:Lominger International, Inc.
- Stein, Randy; Swan, Alexander B. (fevereiro de 2019). «Evaluating the validity of Myers-Briggs Type Indicator theory: A teaching tool and window into intuitive psychology». Social and Personality Psychology Compass (em inglês). 13 (2): e12434. ISSN 1751-9004. doi:10.1111/spc3.12434
- Virginia Tech; The Relationship Between Psychological Type and Professional Orientation Among Technology Education Teachers. Retrieved December 20, 2004
- Zacharias, José Jorge de Morais. Tipos: A diversidade humana. São Paulo: Vetor, 2006.