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Usuário(a):Nunoguimaraescoelho/União Europeia: cenários do pós consolidação orçamental

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União Europeia: Haverá vida para além da Consolidação Orçamental?

Sumário[editar | editar código-fonte]

A União Europeia (EU) vive actualmente num clima de incertezas e riscos tanto ao nível da sua economia como ao nível da sua legitimação/utilidade aos olhos dos cidadãos europeus.

A crise europeia teve a sua génese imediata num excesso de liquidez fomentado por baixas taxas de juro e fácil acesso ao crédito que levou a um sobre-endividamento da sociedade europeia, afectando mais uns países do que outros. O excesso de endividamento conjugado com uma falta de disciplina orçamental das finanças públicas levou às actuais decisões difíceis para fazer face aos atuais tempos de austeridade e de pagamento das dívidas acumuladas.

É uma Europa envolta em mares revoltos de hesitações políticas, falta de liderança que congregue os esforços colectivos e refém dos mercados especulativos mundiais que enfrenta os desafios da estagnação da economia e de uma consolidação orçamental forçada.

Vivemos apenas mais um complexo passo na evolução da União Europeia, com negociações ferozes ou estamos perante o cenário catastrófico do fim do euro e da existência da União Europeia? Faltará o espírito comunitário como refere Jacques Delors? Enfrentarão os povos europeus o fim do seu modelo de Estado-providência? Terá a sociedade europeia capacidade de desenvolver a solidariedade entre estados e uma maior intervenção na comunidade e dota-la de legitimidade democrática? Conseguirá a UE criar a coesão económica e social no seu espaço? Terá o sector produtivo capacidade de criar riqueza? São vários os cenários possíveis à evolução da união europeia.


O contexto Político, económico e social da actual crise económica na união Europeia[editar | editar código-fonte]

Com a criação da UE através do Tratado de Maastricht de 1992 a Europa defrontou-se três grandes desafios: 1. O processo de alargamento a Leste da Europa de forma a completar o projeto de reconciliação da família europeia iniciado em 1950. Este objetivo foi perfeitamente alcançado, com a entrada de 15 novos membros. 2. A criação da União Monetária e o lançamento do Euro como moeda europeia. Este objetivo apenas foi parcialmente atingido pois apenas 17 dos 27 Estados-Membros fazem parte da zona euro (ou seja 63% dos membros da UE). Na zona Euro, a união monetária traduzida numa moeda única e numa política monetária comum permitiu uma estabilidade financeira, a eliminação de custos cambiais, a estabilidade dos preços e uma maior transparência do mercado comum, permitindo de uma forma fácil a comparação de preços ao nível dos consumidores europeus. 3. A coesão económica e social dos Estados-Membros da União. Este objetivo foi o que obteve piores resultados, a UE não conseguiu atenuar/eliminar os contrastes entre a Europa do Norte e a Europa do Sul nos diferentes níveis de desenvolvimento económico, social e de educação. O Estado social europeu foi construído em cima do mito de que os gloriosos anos pós-guerra se prolongariam eternamente (entre 1947-1974 a generalidade dos países da UE tiveram crescimentos populacionais significativos e crescimentos dos PIB na ordem dos 5%/ano). Foi este o chamariz para a adesão dos restantes Estados-membros.


O euro e a crise[editar | editar código-fonte]

A crise atual teve as suas origens imediatas na bolha tecnológica e na crise hipotecária dos EUA em 2007. A atual crise financeira nasceu da especulação imobiliária assente no subprime, na criatividade da invenção financeira (produto tóxicos) e na excessiva facilidade de acesso ao crédito para as famílias e empresas, o que levou a uma erosão das poupanças e a um sobre-endividamento da sociedade o que teve como principal manifestação o colapso da Lehman Brothers em 2008. Esta foi a ponta do iceberg que provocou a crise generalizada na economia real mundial. Para resolver a crise financeira bancária, pois esta crise começou por ser um problema das instituições financeiras perfeitamente localizado, os Estados Membros da União e outros aumentaram os seus défices, para pôr cobro ao eventual descalabro das instituições financeiras. Foi este sobre-endividamento da sociedade e o agravamento dos défices públicos face a mercados financeiros desregulados e com um apetite feroz por especulação que tornaram os Estados as vítimas prediletas desta crise. Surgiu assim a crise das dívidas soberanas.

O euro proporcionou uma proteção cambial para os países da zona euro, permitindo taxas de juro baixas, o que inicialmente criou um efeito positivo no incentivo ao investimento e ao planeamento de longo prazo, pois a procura tinha aumentado pela via da maior disponibilidade de dinheiro pelas famílias, mas no longo prazo teve um efeito pernicioso pois essas mesmas taxas de juro incentivaram os cidadãos e as empresas da zona euro a consumir mais, inflacionando artificialmente o consumo sem um aumento real da produtividade da economia, levando a um endividamento e a uma significativa erosão da taxa de poupança a nível europeu.

O grau de endividamento dos países foi maior em casos como o grego, o espanhol, o irlandês, o italiano e claro está do português. Esta crise veio realçar as estreitas relações que existem entre as economias nacionais dos 27 Estados-Membros, com repercussões reciprocas, em especial na zona euro, como se pode ver no caso grego.

Deste modo uma crise que começou por ser uma crise das instituições financeiras nos EUA espalhou-se pelo globo e no final do ano de 2011 a UE teve de reconhecer que a crise financeira se tornou global e sistémica e que agora a estratégia centrava-se em restabelecer a consolidação orçamental e no crescimento económico. Contudo esta crise cada vez mais se está a transformar numa crise social e política, colocando a UE numa situação perigosa não só a nível económico, ou seja, com o risco de acelerar o seu relativo declínio económico face ao poder crescente das economias emergentes mas também ao nível da sua sobrevivência enquanto união, da sua legitimidade perante os cidadãos europeus como a nível da sua credibilidade internacional enquanto bloco, especialmente aos olhos da China e dos EUA.

Os handicaps da Economia Europeia[editar | editar código-fonte]

Na análise das trocas comerciais entre a UE e os EUA verifica-se que os exportadores europeus especializaram-se em produtos topo de gama (Dior, Prada, Mercedes, Vuitton, etc) enquanto os exportadores americanos se especializaram em produtos de alto grau de tecnologia, mais baratos mas mais inovadores. Assim podemos dizer que a fragilidade do comércio europeu reside no facto de estar refém de especializações passadas.

Por outro lado a maioria do comércio é intraeuropeia e o comércio intraeuropeu é horizontal, ou seja, existe uma troca de bens similares, o que deixa a europa mal preparada para o 3º paradigma do comércio internacional1, caracterizado pela desintegração do trabalho vertical2 e pelo domínio das plataformas-empresarial, numa lógica de competitividade sectorial, numa escala que ultrapassa por completo a lógica das economias nacionais ou mesmo dos blocos de economias.

Na actual globalização as empresas europeias sofrem uma concorrência desleal no que toca aos custos da mão-de-obra, com especial enfase nos custos de protecção/segurança social. As protecções sociais europeias encontram-se desajustadas face à nova realidade da demografia europeia, isto é, com o envelhecimento da população, o que tem implicações orçamentais nas contas públicas.

Os Estados foram criando estruturas administrativas pesadas, com demasiadas pessoas, para fazer face ao alargamento das responsabilidades sociais que conjugado com uma deficiente gestão das finanças públicas, levou os Estados-Membros a um afastamento do cumprimento dos critérios de convergência (ou critérios de Maastricht) que obrigavam a uma solidez nas finanças públicas e a um reduzido défice orçamental e dívida pública.

A “cereja em cima do bolo” foi o rebentar da crise financeira internacional e dos suprime de 2008 e a acumulação da dívida privada que teve como consequência o resgate “forçado” por parte dos Estados da dívida dos privados o que aliado a um sistema financeiro internacional desregulado, especulativo e por vezes fraudulento que despoletou o actual ataque ao euro por parte do exterior e à actual crise da dívida soberana da zona euro.

Na emissão do programa Plano Inclinado3, o Prof. Ernani Lopes e o Prof. João Duque explicam que a crise financeira se deveu à desacoplagem dos fluxos financeiros em conjunto com um mercado sem freio regulador e especulativo que procura a maior rendibilidade das suas aplicações. Os fluxos financeiros autonomizaram-se das operações de pagamentos que eram a sua razão de ser.

Para vários estudiosos da situação4, os governos foram cegos para as consequências desta desacoplagem financeira, fenómeno que se iniciou há mais de 15 anos e cujo desfecho já era previsível.

Ciente destes handicaps, a UE já em 2000 reconheceu um atraso estrutural da europa face aos EUA e Japão, reconhecendo que no longo prazo, o desempenho económico dos Estados seria fortemente influenciado pela Inovação Tecnológica e pela I&D. Foi esta consciencialização que levou ao nascimento da Estratégia de Lisboa, como resposta da UE face à sua perda de competitividade à escala global.

A Estratégia de Lisboa fixou como objetivo transformar a UE até 2010, na região mais competitiva do Mundo e as suas metas passavam por alcançar uma taxa de crescimento económico de 3% e a criação de 20 milhões de postos de trabalho até 20105.

Em 2005 as conclusões do balanço intercalar da Estratégia de Lisboa apontavam para resultados moderados com especial destaque para os resultados alcançados em matéria de emprego. Assim e fim de dar um novo impulso à Estratégia de Lisboa, a Comissão Europeia propôs um processo de coordenação simplificado e uma concentração de esforços nos planos de ação nacionais (PAN). Deixa de dar prioridade aos objetivos quantitativos, retendo unicamente o objetivo de 3% do PIB em 2010 para a investigação e o desenvolvimento.

Entretanto em 2007 despoleta-se a crise mundial financeira o que obrigou os Estados-Membros a aplicar medidas de curto prazo de estabilização financeira, de relançamento da economia e proteção de emprego, o que veio reforçar os desequilíbrios orçamentais e o aprofundamento da dívida pública culminando na atual crise das dívidas soberanas.

O ataque dos mercados à zona euro e a necessidade do reequilíbrio orçamental dos Estados-Membros veio pressionar a linha de orientação da Estratégia de Lisboa e mostrou uma europa a duas velocidades, sendo que a economia alemã vai na frente do pelotão6, vendo aumentado ainda mais as disparidades económicas, sociais e territoriais na UE.

Em 2000 a Estratégia de Lisboa centrou-se na estratégia da construção da sociedade do conhecimento, em que as qualificações, a ciência e a tecnologia e a inovação são os fatores-chave do progresso. Em 2010 foi lançada a Estratégia Europa 20207 que estabelece três prioridades que se reforçam mutuamente e que deverão ajudar a UE e os Estados-Membros a atingir níveis elevados de emprego, de produtividade e de coesão social:  Crescimento inteligente – desenvolver uma economia baseada no crescimento e na inovação  Crescimento sustentável – promover uma economia mais eficiente em termos de utilização de recursos, mais ecológica e mais competitiva  Crescimento inclusivo – fomentar uma economia com níveis de emprego que assegurem a coesão social e territorial

Cenários do pós consolidação orçamental[editar | editar código-fonte]

A crescente integração das economias da zona Euro retirou graus de liberdade aos Estados-Membros nas suas políticas, nomeadamente na cambial e monetária. Apesar desta menor liberdade os Estados-Membros não deixaram de gastar para fazer face não só às suas políticas distributivas, de suporte aos seus modelos de Estado Social, do aumento da coesão social e das ações de suporte público às economias para contrariar a crise financeira dos últimos anos. Assim os países europeus (sobretudo do Sul) aumentaram os seus défices orçamentais e os seus níveis de endividamento.

Agora a chamar para si o controlo orçamental, através da pré-aprovação dos orçamentos nacionais, a UE retira mais um grau de liberdade aos governos dos Estados-Membros. O que mais uma vez pode estar em jogo, segundo alguns analistas é uma rutura social do equilíbrio europeu: «reequilibra-se orçamentalmente», mas corre-se um grave risco de uma fratura social mais grave8.

Este é o maior desafio que se pôs à UE desde a sua criação, pois desde o inicio os vários Estados recusaram a ideia de Estados Unidos da Europa, de um modelo federalista e preferiram a via da integração económica, agora que a crise económica ameaça todos e se sente uma crescente desconfiança das populações europeias da elite política europeia e das suas instituições, esvaziadas de legitimidade democrática9, corre-se um sério risco da via populista e nacionalista que advoga um aumento do proteccionismo interno e externo.

O esforço exigido às populações em nome da disciplina e solidez orçamental emerge cenários até à data nunca equacionados como a eventual saída de Estados–Membros porque são incapazes de pagar a sua divida soberana, ao fim da moeda única ou mesmo a um retrocesso no projecto europeu.

O projecto europeu criou as condições para a exploração económica sustentada na biodiversidade dos povos europeus, forjando dessa forma um espaço de paz e prosperidade sem precedentes na história mundial, através de uma organização híbrida entre o federalismo e a confederação de estados, muito sui generis. Hoje em dia este projecto enfrenta o maior desafio desde a sua constituição.

A actual crise pôs a nu o divórcio entre o intergovernamentalismo orçamental e o federalismo monetário, assente em estruturas ineficazes de decisão e a incoerência entre a política macro e microeconómica da zona euro, da sustentabilidade do modelo social e a vontade de coesão. Mas o mais importante é que pôs o dedo na ferida da falta de identificação do povo europeu dos actuais problemas como um problema da Europa e não apenas dos Estados que promova a unidade e a solidariedade indispensáveis ao desenho e implementação de uma estratégia comum.

Importa agora refletir não só sobre a utilidade e finalidade da UE mas também equacionar como deverão as instituições financeiras tomar as decisões e de acordo com que valores.

Será que o euro conseguirá sobreviver através da mera imposição de regras contidas nos critérios de convergência ou se pelo contrário não dispensará uma evolução do modelo de união que avance para uma união política e económica que promova a criação de um modelo federal baseado numa Constituição.

Sendo previsível a curto prazo que se caminhe para um modelo federalista monetário, fiscal e financeiro importa saber quais as consequências sob o ponto de vista da legitimação do Projeto Europeu9 e das suas instituições no actual contexto marcado pela sensação de aprofundamento do défice democrático das instituições e dos decisores europeus sentidos pelas populações dos vários estados da UE. Mais importante ainda é imperativo avaliar a componente ideológica e discursiva, ou seja, avaliar o que os cidadãos europeus pensam, sentem e falam sobre a UE e das suas instituições, à luz das suas identidades, valores e discursos políticos.

A receita da resolução do actual impasse na evolução/extinção da UE tal e qual a conhecemos passa por uma liderança motivadora dos povos europeus, acompanhada por um discurso político coerente e persuasivo de todos os Estados-Membros e pela abertura das instituições europeias à participação e fiscalização por parte dos cidadãos europeus. Tudo isto temperado com uma boa dose de imaginação e de ideias inovadoras em matéria de reforma institucional que envolva todos os europeus à volta do ideal do Projecto Europeu.  


Textos/vídeos/links complementares[editar | editar código-fonte]

1. Os Paradigmas/Modelos da Economia Internacional.


In Lopes, Ernâni, «A Economia no Futuro de Portugal, Ed. Jornal Sol, pág. 62, 1ª Edição: 2009

2. A desintegração vertical do trabalho, segundo Cohen não é mais do que o desmembramento da cadeia de produção Fordista. A concepção do produto é desligada da produção. Na nova divisão internacional de trabalho, os países ricos vendem os bens imateriais (com maior valor acrescentado) e compram os bens materiais aos países pobres. Link: http://en.wikipedia.org/wiki/Daniel_Cohen_(economist)

3. Link «plano inclinado», com Prof. Ernâni Lopes

http://videos.sapo.pt/MyeqOBCz5YZlVQzC7EvP

4. Segundo o Prof. Vinhas da Silva «os governos não atuaram com prudência na regulação das atividades de instituições do sistema financeiro, nem das empresas, que assumiram riscos desnecessários e, em muitos casos, se desviaram do seu core business, para se aventurarem em terreno pantanoso e em áreas que desconheciam plenamente»

In Silva, Rui Vinhas da, «Os Novos Desafios da Economia Global» Ed. Caleidoscópio, 2010

5. Link:http://europa.eu/legislation_summaries/employment_and_social_policy/eu2020/growth_and_jobs/c11325_pt.htm

6. Link: http://pt.wikipedia.org/wiki/Economia_da_Alemanha

7. Link: http://ec.europa.eu/europe2020/index_pt.htm

8. Link: http://www.economist.com/node/17149082

9. O problema de legitimação da UE pode ser analisado sob três principais dimensões:

• A legitimação de output – avaliada através da eficácia das instituições da UE e da qualidade dos resultados por elas atingidos na perspetiva de bem-estar dos povos europeus.

• A legitimação de input – avaliada através da relação entre as preocupações dos cidadãos europeus e as respostas criadas pela UE e do alcance da participação e representatividade dos cidadãos e da sua capacidade de influenciar e fazer ouvir a sua voz juntos das instituições da união.

• A legitimação social – avaliada através do nível da transparência, responsabilidade e eficiência das instituições europeias nos processos de decisão, bem como a sua abertura à fiscalização, consulta e envolvimento pluralista com os cidadãos europeus.

In Manual do LO5 – Unidade 5 – Recurso Multimédia


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1. Manual do LO3 – Unidade 3 – Recurso Multimédia http://moodle.maiseuropa.com/file.php/11/L3_CESAE_mais_Europa2012_1_.pdf

2. Manual do LO5 – Unidade 5 – Recurso Multimédia http://moodle.maiseuropa.com/file.php/11/L5_CESAE_mais_Europa2011_Ofuturo_da_Europa.pdf

3. Reconsidering the Social Contract after the crisis – Anke Hassel http://library.fes.de/pdf-files/id/ipa/06676-20090909.pdf

4. Europe After the crisis – Charles A.E. GoodHart http://ineteconomics.org/blog/inet/charles-goodhart-europe-after-crisis