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Venerável Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos de Goiás

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VENERÁVEL IRMANDADE DO SENHOR BOM JESUS DOS PASSOS
 
Brasão VENERÁVEL IRMANDADE DO SENHOR BOM JESUS DOS PASSOS
sigla
V.I.S.B.J.P.
Tipo: Irmandade religiosa
Local e data da fundação: Goiás1745 [1]



Atividades: Religiosa e Cultural
Sede: Igreja São Francisco de Paula [2]
Site oficial: Site da Irmandade
Portal Catolicismo · uso desta caixa

A Venerável Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos, situada na cidade de Goiás, é uma associação pública de fiéis católicos que foi fundada em 1745. Desde 1863, a irmandade está estabelecida canonicamente na Igreja São Francisco de Paula, um belo templo cuja construção remonta a 1761. Esta igreja é reconhecida como Patrimônio Histórico e Artístico do Brasil, tendo sido tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1950.[3][4][5][6]

A principal missão da Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos é promover o culto ao Senhor dos Passos na Paróquia Catedral de Sant'Ana, a primaz de Goiás. Entre as suas atividades, destacam-se a organização das tradicionais e solenes celebrações da Festa de Passos, que incluem a procissão de Passos e a procissão do Encontro. A irmandade também realiza uma missa mensal às sextas-feiras, fortalecendo assim os laços de fé entre os devotos.[7]

A Irmandade abriga um valioso acervo patrimonial, protegido por tombamento e registros de acordo com as legislações municipal, estadual e federal. Este acervo é composto por itens que datam do período colonial e imperial brasileiro, incluindo imagens sacras, lanternas e cruzes de procissão, turíbulos, navetas, pálios, esquifes, sinetas, alfaias, paramentos e diversos objetos litúrgicos em prata e ourivesaria. Esses bens estão preservados na sede da Irmandade, no Museu da Irmandade e no Museu de Arte Sacra da Boa Morte.

Ao longo de sua história, a Irmandade tem exercido uma influência significativa sobre as manifestações tradicionais do catolicismo em Goiás. Suas atividades se entrelaçam com festividades como a festa da Padroeira da cidade, Nossa Senhora Sant’Ana, a festa do Divino, e a Festa de São Francisco de Paula. Além disso, a irmandade participa das celebrações da Semana de Passos, da Semana das Dores e da Semana Santa, que atualmente estão em processo de registro pelo IPHAN para reconhecimento das Procissões da Semana Santa da cidade de Goiás como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. Essa trajetória destaca a importância da Irmandade na preservação e promoção das tradições religiosas da região.[8]

Século XVIII: ciclo do ouro, irmandades, confrarias e a construção das igrejas

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Arraial de Sant'Anna

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Ver artigo principal: Povos indígenas do Brasil
Goiás em 1830, por Johann Axmann.

Antes da chegada dos europeus ao continente americano, a região central do Brasil, atualmente conhecida como Goiás e sua antiga capital, Vila Boa, era habitada por diversos grupos indígenas pertencentes ao tronco linguístico macro-jê. Entre esses povos nativos estavam os javaés, xacriabás, acroás, xavantes, caiapós, entre outros. Com o contato com os colonizadores europeus, muitas dessas comunidades passaram por processos de catequização.[9][10]

O surgimento dos centros urbanos em Goiás no século XVIII foi profundamente influenciado pela exploração do ouro, que atraiu numerosos aventureiros em busca de riqueza. As minas de ouro da época eram predominantemente garimpos rudimentares, localizados em encostas de morros e margens de córregos, ribeirões e rios, frequentemente situados em vales profundos, como nas proximidades do Rio Vermelho.

Nesse cenário de exploração, os bandeirantes desempenharam um papel fundamental. Ao estabelecerem-se nas margens do Rio Vermelho, fundaram Vila Boa, que mais tarde veio a ser conhecida como Goiás. Esse assentamento foi o primeiro núcleo de mineração na região e marcou o início do desenvolvimento urbano em Goiás.

Igreja São Francisco de Paula

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São Francisco de Paula padroeiro da Igreja São Francisco de Paula.

Localizada em um outeiro às margens do Rio Vermelho, no Centro Histórico da cidade de Goiás, a Igreja de São Francisco de Paula foi construída em 1761 por iniciativa do então governador Antônio Tomás da Costa. Inicialmente erguida com paredes de taipa de pilão e telhado de telha de barro canal, ao longo dos anos passou por modificações que alteraram sua estrutura original. Apresenta uma fachada plana, com um cruzeiro de madeira no adro e uma torre sineira do século XIX separada do corpo principal da igreja.

O forro da igreja foi decorado com patrocínio da Irmandade em 1869 por André Antônio da Conceição, um destacado artista local, com cenas da vida de São Francisco. Uma das obras notáveis dentro da igreja é a imagem de São Francisco, esculpida por Veiga Valle, que adorna um dos altares laterais. Apesar da simplicidade de sua fachada colonial, a igreja abriga uma valiosa coleção de imagens sacras. Durante a Procissão do Fogaréu, o edifício assume um simbolismo especial associado ao Monte das Oliveiras.

A igreja é palco de festividades como a Festa de São Francisco e a Semana Santa, atraindo tanto devotos quanto turistas. Tombada pelo IPHAN em 1950, é protegida como patrimônio histórico e cultural do Brasil, contribuindo significativamente para a preservação das tradições locais e atraindo visitantes interessados na história e na arquitetura colonial.

Além de ser um espaço de culto, a Igreja de São Francisco de Paula desempenha um papel central na vida cultural de Goiás, ao ser a sede da Irmandade, hospeda várias celebrações religiosas organizadas pela Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos.[nota 1]

Irmandade dos Passos

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Santa Missa tradicional de sexta-feira de quaresma na sede da Irmandade a Igreja São Francisco de Paula em 2024.

No século XVIII, o culto a Jesus Cristo ganhou considerável popularidade, especialmente em Goiás. Contribuíram para a disseminação desse culto as Irmandades do Senhor Bom Jesus dos Passos, estabelecidas nas igrejas principais de Santana de Vila Boa, São José do Tocantins (atualmente Niquelândia), Nossa Senhora do Pilar em Pilar de Goiás, e posteriormente na Igreja Nosso Senhor do Bonfim em Pirenópolis.[11]

De acordo com o historiador João da Costa Oliveira, a irmandade foi fundada pelo padre João Perestello de Vasconcellos Espinola no ano de 1745. Documentos históricos confirmam que o padre Perestello, originário de Sevilha, na Espanha, esteve presente em Goiás durante a metade do século XVIII.[12][13]

Com a criação da Irmandade dos Passos, o padre Perestello introduziu celebrações dedicadas ao Senhor dos Passos e a Nossa Senhora das Dores, além de fortalecer as tradições da Semana Santa. A primeira menção documental de sua influência é encontrada em registros históricos que indicam a renovação da Matriz de Sant'Ana em 1743, sob sua supervisão. A reforma foi concluída a tempo para a Semana Santa de 1745, o que sublinha o envolvimento do padre na vida religiosa local.

Adicionalmente, um conflito registrado na Casa de Câmara de Goiás em 1749 entre o Provedor da Irmandade, Sr. Manoel Antunes da Fonseca, e o Vigário da Vara e Matriz, padre Perestello, fornece mais evidências sobre a existência e atividade da irmandade. O Provedor solicitou permissão para expor o Santíssimo Sacramento no altar do Senhor dos Passos durante a festa da Invenção da Santa Cruz. A permissão foi eventualmente concedida para o Altar Mor, indicando que a irmandade já estava estabelecida e que a imagem do Senhor dos Passos era utilizada no culto.

Esses registros históricos ajudam a ilustrar a importância da Irmandade dos Passos na configuração religiosa e cultural de Goiás desde o século XVIII.

Século XIX: Estagnação da província de Goiás

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Ver artigo principal: História de Goiás
Senhor Bom Jesus dos Passos, padroeiro da Irmandade, peça restaurada no século XIX por Veiga Valle.

No século XVIII, a mineração de ouro foi a principal atividade econômica da Província de Goiás, trazendo uma prosperidade efêmera à região devido à riqueza mineral abundante. No entanto, o ciclo da mineração aurífera em Goiás estava destinado a se encerrar, devido ao esgotamento das jazidas e ao declínio econômico da província. Além disso, o isolamento geográfico impunha desafios logísticos significativos para o transporte de mercadorias, aumentando os custos da importação de alimentos e itens essenciais para a sobrevivência da população. Esses fatores motivaram uma transição gradual para atividades econômicas baseadas na agricultura e em outros setores, enquanto a capital ainda concentrava o poder administrativo e financeiro da região.

Neste contexto, provincianos eram obrigados a deixar suas localidades, a fim de alcançarem prestígio, como o ocorrido com José Joaquim da Veiga Valle. Nascido em Meia Ponte, ele ocupou diversos cargos públicos, incluindo vereador, juiz municipal e major da Guarda Nacional. Ele também se associou à Irmandade do Santíssimo Sacramento, antes de se mudar para a cidade de Goiás em 1841, o mesmo ano em que se casou com Joaquina Porfiria Jardim, filha do então governador, José Rodrigues Jardim. Em Goiás, ele inicialmente se dedicou à douração dos altares da igreja matriz, posteriormente expandindo seu trabalho para a escultura de imagens sacras, atendendo diversas igrejas e irmandades na região, como a dos Passos, a qual se filiou.[14][15][16][17]

Notas

  1. Sobre a sede da Irmandade “Capítulo I - HISTÓRICO E DENOMINAÇÃO: A Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos da cidade de Goiás, foi fundada em 1745, pelo Padre espanhol Dr. João Perestello de Vasconcelos Spíndola, solteiro religioso então domiciliado nesta cidade de Goiás, funcionando desde aquela época até 1870, na antiga Catedral de Sant’Ana, transferindo-se naquele mesmo ano seu padroeiro e a sede de sua irmandade para a Igreja de São Francisco de Paula desta cidade. Essa Igreja, construída em 1761 é de propriedade da diocese de Goiás, sendo Monumento tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), tendo sua guarda e zelo sempre feitos pela Irmandade desde que nela se instalou.”, in ESTATUTO DA IRMANDANDE DO SENHOR BOM JESUS DOS PASSOS - CIDADE DE GOIÁS/GO - (2001), p. 118.

Referências

  1. ROSA, Rafael Lino (2012). A Irmandade dos Passos e a formaçao da identidade cultural da Cidade de Goiás (PDF). [S.l.]: PUC-GO, Tese de Doutorado, 2012). Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  2. «Itinerários da Paixão vilaboense: nos Passos da Irmandade - Opinião Diário da Manhã». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  3. «Portal Iphan: História - Goiás (GO)». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  4. «Igreja São Francisco - Ipatrimonio». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  5. «Portal Iphan: Monumentos e Espaços Públicos Tombados - Goiás (GO)». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  6. «Iphan entrega obras de restauração na igreja São Francisco de Paula, na cidade de Goiás (GO)». Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  7. MORAES,Cristina de Cássia P (2014). Do corpo místico de Cristo: Irmandades e Confraria na Capitania de Goiás 1736-1808. [S.l.]: Paço Editorial,). Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  8. «IPHAN: Processo de registro das Procissões da Semana Santa da cidade de Goiás está em avaliação pelo Iphan». Consultado em 1 de agosto de 2024 
  9. CHAIM, M. M. Aldeamentos Indígenas (Goiás 1749-1811). Segunda edição. São Paulo: Nobel, 1983. p. 48
  10. LOURENÇO, Luís Augusto Bustamante (2005). A oeste das minas: escravos, índios e homens livres numa fronteira oitocentista Triângulo Mineiro (1750-1861) (PDF). [S.l.]: SciELO Books - Scientific Electronic Library Online. Consultado em 30 de julho de 2024 
  11. Citado em: ENES, Maria Fernanda. Signo, ed. Reforma Tridentina e a religião vivida. 1991. Ponta Delgada: [s.n.] 
  12. CASTRO, José Luiz de (1998). A organização da igreja católica na capitania de goiás ( 1726 – 1824 ). (PDF). [S.l.]: Dissertação de Mestrado em História das Sociedades Agrárias, da UFG Universidade Federal de Goiás. Consultado em 30 de julho de 2024 
  13. Citado em: SILVA, Cônego José Trindade da Fonseca. Escolas profissionais Salesianas, ed. Lugares e Pessoas. 1948. São Paulo: [s.n.] 
  14. SANTOS, Fernando Martins dos (2023). Veiga Valle: recepção em estudos de identidade e tradição (1940-2001). [S.l.]: Tese de Doutorado em História, da UFG Universidade Federal de Goiás. Consultado em 7 de agosto de 2024 
  15. MACHADO, Raquel de Souza. (2017). Representações da singularidade estética em Goiás a partir de Veiga Valle (1806-1874). [S.l.]: Revista Faces da História, S. l., v. 1, n. 1, p. 203–223, UNESP-Universidade Estadual Paulista. Consultado em 7 de agosto de 2024 
  16. Citado em: FILHO, Amphilophio Alencar. Rev. Goiana de Artes v. 5, n.1, jan./jun., ed. Cinco Santeiros goianos - uma apreciação. 1984. Goiânia: [s.n.] 
  17. SANTOS, Fernando Martins dos (2019). Veiga Valle (1806-1874) como possibilidade de um estudo de história regional. Uma comparação da divulgação do “santeiro goiano” e o silenciamento de Octo Marques (PDF). [S.l.]: 31° Simpósio Nacional de História da ANPUH Associação Nacional de História. Consultado em 7 de agosto de 2024 
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