Anarquismo contemporâneo

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Anarquismo é uma ideologia política que se opõe a todo tipo de hierarquia e dominação, seja ela política, econômica, social ou cultural, como o Estado, o capitalismo, as instituições religiosas, o racismo e o patriarcado.[1][2][3][4][5][6]

Desde o último terço do século XX, anarquistas tem estado envolvidos em movimentos estudantis de protesto, movimentos pacifistas e o movimento antiglobalização, entre outros. Hoje, tradicionais organizações anarquistas continuam a existir ao redor do globo e, nos anos recentes, o anarquismo como uma filosofia política ganhou um perfil mais bem definido como um resultado do movimento "antiglobalização"[7]

Visão geral[editar | editar código-fonte]

A quinta onda é caracterizada pelo momento posterior ao colapso do modelo socialista soviético e pela generalização do neoliberalismo ao redor do mundo. O fim da União Soviética possibilitou a reorganização do movimento anarquista em vários países do antigo bloco e movimentos antes clandestinos tornaram-se públicos; na América Latina, o fim das ditaduras também fez com que fosse possível a rearticulação dos anarquistas; bem como o fim do apartheid na África do Sul e o fim das ditaduras na Ásia e no Leste Europeu.[8] Na quinta onda, configurou-se a influência anarquista minoritária no campo da esquerda em geral, e das lutas populares em particular, ainda que a queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética tenham proporcionado uma potencialização do anarquismo nos países então socialistas.[7] Também permaneceram as questões que chegaram com a influência da Nova Esquerda[9] e diversos setores do movimento anarquista vêm enfatizando a necessidade de os anarquistas retomarem o protagonismo em movimentos sociais e lutas populares.[10]

A quinta onda continuou a ser marcada pelas iniciativas internacionais precedentes como a IFA e a AIT anarcossindicalista; entre as novas iniciativas internacionais, destaca-se o projeto Anarkismo.net, criado em 2005 e que reúne, em torno de um site, organizações plataformistas de diversas partes do mundo. Com o advento da internet, surgiram fóruns de discussão e projetos para divulgação de notícias, como o Centro de Mídia Independente (CMI) e o A-Infos; também passaram a ser articuladas em diversos países Feiras do Livro Anarquistas.[11]

Os anarquistas também tiveram papel relevante no movimento antiglobalização, entre os meados da década de 1990 e o início da década de 2000, e estiveram articulados, em grande medida, na Ação Global dos Povos, criada em 1998. Com o foco das mobilizações em torno da luta contra o neoliberalismo, o movimento desdobrou-se em protestos massivos em todo o mundo, contra instituições como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e também contra acordos como o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA) e a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), além de manifestações contra as guerras promovidas pelos Estados Unidos no Oriente Médio.[12] Durante esses protestos, a tática black bloc ganhou popularidade.[13]

Na Europa, os anarquistas continuam investindo em iniciativas sindicais e em organizações específicas anarquistas; na Grécia em especial, desde 1990, vem crescendo uma tradição insurrecionalista.[14] Outro país que viu um ressurgimento da tradição insurrecionalista foi a Itália, com o surgimento da Federação Anarquista Informal (FAI/FRI), inspirada pelas ideias de Alfredo Bonanno.[15][16] Com o fim do regime soviético, destaca-se o surgimento e o crescimento de organizações na Polônia, Tchecoslováquia e na própria Rússia, além da Armênia, Bielorrússia, Cazaquistão e Ucrânia.[17]

Subcomandante Marcos, líder do EZLN, organização que liderou o levante em Chiapas em 1994

Nas Américas, o anarquismo foi significativamente marcado pelo movimento antiglobalização. Nos Estados Unidos, os protestos contra o encontro da OMC em Seattle destacaram-se como um dos mais significativos eventos com participação anarquista durante o movimento antiglobalização.[18] Também destacou-se a participação dos anarquistas no movimento Occupy Wall Street em 2011.[19] No México, o Exército Zapatista de Libertação Nacional, de significativa influência anarquista, realizou um levante em 1994, e após a revolta, formaram-se vários grupos anarquistas de apoio aos zapatistas no país;[18] em 2006, os anarquistas mexicanos também participaram da rebelião de Oaxaca em 2006, onde, a partir de uma greve de 70 mil professores, articularam-se trabalhadores sindicalizados, camponeses e estudantes na luta contra o governo de Ulises Ruiz Ortiz, estabelecendo a Asamblea Popular de los Pueblos de Oaxaca (APPO), que tomou prédios públicos, estabeleceu organizações de mulheres, como a Comisión de Mujeres de Oaxaca, tomou rádios e televisões e terminou sendo duramente reprimida pelo governo.[20]

Na região sul do continente, destacou-se a influência da FAU na difusão do especifismo, auxiliando no estabelecimento de organizações anarquistas em outros países, como no Brasil, com a Federação Anarquista Gaúcha (FAG) e a Federação Anarquista do Rio de Janeiro (FARJ). Organizações especifistas também foram fundadas na Argentina e no Chile. Essas organizações vêm tendo participação relevante, ainda que na maioria dos casos minoritária, em movimentos sociais do continente, dentre os quais se encontram sindicatos, associações comunitárias e de bairro, movimentos rurais, de estudantes, desempregados, sem-teto, sem-terra e outros; dentre as grandes mobilizações ocorridas na América do Sul que contaram com participação anarquista relevante, destacam-se as manifestações de 2001 na Argentina, em resposta à crise econômica que assolava o país;[21] as mobilizações estudantis em 2006 no Chile[22] e as manifestações de 2013 no Brasil.[23]

Na África, experiências baseadas no sindicalismo revolucionário tem tido relevância, bem como a formação de organizações específicas anarquistas como a Zabalaza Anarchist Communist Front (ZACF), na África do Sul.[24]

No Oriente Médio, o anarquismo surgiu na Turquia durante a década de 1990, com a criação de grupos como a Anarchist Youth Federation (AGF), Anatolian Anarchists (AA) e o Karasin Anarchist Group (KAG); o anarquismo ganhou também influência entre os curdos[18] e tanto no norte da África como no Oriente Médio os anarquistas tiveram participação significativa na chamada Primavera Árabe.[25] Anarquistas vindos de diversos países, mas principalmente da Turquia e da Grécia, mantém uma participação na frente curda da Guerra Civil Síria como voluntários internacionais. Essa participação se dá dentro de organizações anarquistas que compõe o Batalhão Internacional da Liberdade, como a União Revolucionária para a Solidariedade Internacionalista (ΕΣΔΑ),[26] a Luta Anarquista (TA)[27] e as antigas Forças Guerrilheiras Internacionais e Revolucionárias do Povo (IRPGF),[28] ou como participação individual dentro de outras frentes internacionais não-anarquistas, como a montada pelo Partido Comunista Marxista-Leninista (MLKP). Algumas ideias do teórico anarquista Murray Bookchin influenciaram o desenvolvimento do Confederalismo democrático de Abdullah Öcalan, que atualmente serve de orientação política para o Partido dos Trabalhadores do Curdistão.[29]

Na Ásia, há pouquíssimas referências anarquistas contemporâneas. Na Oceania, algumas experiências anarcossindicalistas têm tido relevância na Austrália.[30]

Referências

  1. «Anarchism». International Encyclopedia of Political Science. Thousand Oaks: Bertrand Badie. 2011 
  2. Malatesta, Errico. «Towards Anarchism». Los Angeles: International Group of San Francisco. MAN!. OCLC 3930443 
  3. Agrell, Siri (14 de maio de 2007). «Working for The Man». The Globe and Mail 
  4. «Anarchism». Encyclopædia Britannica. Encyclopædia Britannica Premium Service. 2006. Consultado em 29 de agosto de 2006 
  5. «Anarchism». The Shorter Routledge Encyclopedia of Philosophy. 14 páginas. 2005. Anarchism is the view that a society without the state, or government, is both possible and desirable. 
  6. Slevin, Carl. "Anarchism." The Concise Oxford Dictionary of Politics. Ed. Iain McLean and Alistair McMillan. Oxford University Press, 2003.
  7. a b Corrêa 2012, p. 64.
  8. Corrêa 2012, p. 60.
  9. Corrêa 2012, p. 65.
  10. Corrêa 2012, p. 64-65.
  11. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome Anarquismo corr60b
  12. Corrêa 2012, p. 61.
  13. «Autonomia and the Origin of the Black Bloc». A-Infos. Consultado em 12 de setembro de 2015 
  14. Corrêa 2012, p. 61-62.
  15. Corrêa, Felipe (1 de outubro de 2020). «Anarquismo Contemporâneo: Anarquismo, Anarcossindicalismo e Sindicalismo Revolucionário no mundo todo (1990-2019)». Instituto de Teoria e História Anarquista. INDIVÍDUOS E GRUPOS INSURRECIONALISTAS. Consultado em 5 de março de 2023 
  16. Marone, Francesco (2014). «A Profile of the Informal Anarchist Federation in Italy». Combating Terrorism Center. CTC Sentinel (em inglês). 7. Consultado em 26 de novembro de 2021 
  17. Corrêa 2012, p. 62.
  18. a b c Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome Anarquismo corr62b
  19. Graeber, David. «Occupy and anarchism's gift of democracy». The Guardian. Consultado em 12 de setembro de 2015 
  20. Corrêa 2012, p. 62-63.
  21. Corrêa 2012, p. 63.
  22. Moraga Lovera, Marcos. «En las revueltas estudiantiles hay un germen anarquista potente». La Nación. Consultado em 10 de agosto de 2015 
  23. Avelino, Nildo. «As revoltas de junho no Brasil e o anarquismo». Espaço Acadêmico. Consultado em 10 de agosto de 2015 
  24. Corrêa 2012, p. 63-64.
  25. Tashjian, Yeghig. «The Fruits of "Arab Spring"; Islamism, Anarchism & Feminism» (PDF). Strategic Outlook. Consultado em 26 de setembro de 2015 
  26. Νίνη, Άννα (9 de outubro de 2017). «Έλληνες Αναρχικοί Στέλνουν Χαιρετίσματα από τη Ράκκα της Συρίας». Vice (em grego). Consultado em 12 de junho de 2023 
  27. Vandaw (23 de setembro de 2020). «Entrevista Exclusiva: Tekoşîna Anarşîst – Anarquismo e a Luta pela Vida no Norte da Síria». Facção Fictícia. Consultado em 12 de junho de 2023 
  28. «Interview with the International Revolutionary People's Guerrilla Forces». Kurdish Question. 1 de maio de 2017. Consultado em 12 de junho de 2023. Arquivado do original em 15 de junho de 2017 
  29. Bookchin, Debbie (15 de junho de 2018). «How My Father's Ideas Helped the Kurds Create a New Democracy». The New York Review. Consultado em 12 de junho de 2023 
  30. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome Anarquismo corr64b

Bibliografia[editar | editar código-fonte]