Departamento Municipal de Água e Esgotos

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Prédio da Hidráulica Moinhos de Vento, atualmente um patrimônio histórico municipal[1] e sede da Diretoria Geral do DMAE[2]

O Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE), é uma autarquia da prefeitura da cidade brasileira de Porto Alegre, que administra os serviços de água e esgotos. Foi criado pela Lei nº 2.312, de 15 de dezembro de 1961.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

A criação do Departamento Municipal de Água e Esgotos se insere em um longo processo de modernização e qualificação dos serviços de abastecimento de água e coleta de esgoto da cidade que havia iniciado ainda no século XIX. Inicialmente os serviços eram entregues principalmente à iniciativa privada, sob a supervisão do município.[3][4]

Em 1904 os serviços foram encampados pela Intendência, sob a justificativa de que as empresas responsáveis haviam falhado em prestar um bom atendimento.[3] Em 1907 foi criado um departamento especial, a Seção de Hidráulica Municipal, para administrar os serviços, a Comissão Municipal de Saneamento passou a fiscalizar as obras sanitárias domiciliares e em 1911 uma lei regulamentou a disposição do esgoto doméstico.[5] Em 1925 foi criada a Diretoria de Água e Esgoto, transformada em 1928 na Diretoria Geral de Saneamento (DGS), pela qual a água passava a ser tratada.[3]

Criação e estrutura do Departamento[editar | editar código-fonte]

Em 1956 a DGS transformava-se em Secretaria Municipal de Água e Saneamento, e com o empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o município pôde investir em saneamento básico e no tratamento da água. Por exigência do Banco, a secretaria foi transformada em uma autarquia pela Lei nº 2.312 de 15 de dezembro de 1961, que ao mesmo tempo criou em seu lugar o Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE). Seu primeiro diretor foi Eduardo Martins Gonçalves Netto.[6][7]

Sua estrutura administrativa atual é o resultado de uma reforma de 2012, que organizou seus setores da seguinte maneira:[6]

  • Diretoria Geral, assessorada por:
    • Diretoria Geral Adjunta
    • Procuradoria
    • Conselho Deliberativo
    • Delegação de Controle
    • Equipe de Tecnologia da Informação e Inovação
  • Diretorias:
    • Gestão e Desenvolvimento
    • Tratamento e Meio Ambiente
    • Operações
    • Relacionamento com o Cliente
    • Gestão Administrativa

Gerentes setoriais, Coordenadores e Líderes de Equipe se responsabilizam pela distribuição e supervisão das tarefas. Há ainda uma Universidade Corporativa para treinamento de funcionários e uma Unidade de Comunicação Social.[6]

Atividades[editar | editar código-fonte]

Em seus primeiros anos de atividade foram criadas novas hidráulicas nos bairros Tristeza, Menino Deus e São João, mas a prioridade era ampliar significativamente a rede de coleta do esgoto. O tratamento do esgoto, no entanto, não entrou nos planos, sendo recomendando que fosse lançado in natura no meio do canal de navegação do lago Guaíba, através de um emissário subfluvial, a partir da Ponta da Cadeia.[4]

A esta altura aumentava a preocupação com a qualidade da água coletada do Guaíba, já muito contaminada com efluentes domésticos, industriais e agrotóxicos. Nos anos 1970 foram realizados estudos para avaliar essa questão, concluindo-se que a água era de boa qualidade após o devido tratamento,[4] e em 1975 iniciou o processo de fluoretação.[8] Nesta década foram realizados grandes investimentos, e em 1981, 98% da população de Porto Alegre tinha água tratada. No mesmo ano foi concluído o Plano Diretor de Abastecimento de Água, revisto em 1993, analisando a tendência de crescimento da demanda e estabelecendo diretrizes.[7]

A coleta e tratamento dos esgotos continuavam em segundo plano, a despeito de já haver desde o início da década de 1960 o Plano Diretor de Esgotos Sanitários e desde 1973 o Plano Integrado de Esgotos Cloacais. Em 1975 apenas 41,4% do esgoto era coletado, e praticamente nada era tratado. Em 1978 ainda não era possível dizer que a cidade dispunha de um sistema integrado de coleta e tratamento de esgotos, e o que existia eram ações descoordenadas e sem planejamento. Em 1980 foi publicado o Plano Integrado dos Esgotos Sanitários, mas os avanços nesta área continuavam lentos, e ao final da década cerca de 50% do esgoto era coletado e menos de 2% era tratado. Na década de 1990 essa situação foi em parte revertida com recursos próprios financiados pela tarifa e com o apoio do Orçamento Participativo e do Programa Guaíba Vive. Em 1992 foi inaugurada a primeira grande estação de tratamento de esgotos, situada no bairro do Lami, o que inclusive recuperou a balneabilidade das praias locais, há muito interditadas. Até 2002 foram implantadas mais cinco estações, nos bairros Rubem Berta, Belém Novo, Vila Esmeralda e sobretudo as grandes estações de Ipanema e São João/Navegantes, as maiores obras realizadas pelo DMAE nos últimos 20 anos, com capacidade de tratamento respectivamente de 246 e 444 litros por segundo.[7]

Segundo dados da Prefeitura de Porto Alegre, em 2024 mais de 99,5% da população da capital era atendida com abastecimento de água. O DMAE mantinha seis estações de tratamento, seis estações de bombeamento de água bruta, 88 estações de bombeamento de água tratada, 104 reservatórios e mais de 4.200 quilômetros de redes de distribuição. Eram consumidos mais de 200 milhões de metros cúbicos de água tratada por ano, sendo 88% para uso residencial.[9] 91,3% da população era atendida com coleta de esgoto, mas apenas 57% do esgoto era tratado.[10]

Precarização[editar | editar código-fonte]

Em 2008 o DMAE recebeu o certificado ISO 9001:2000 pela boa qualidade de seus serviços, mas nos últimos anos vem sofrendo com cortes de verbas, redução nos investimentos, redução acentuada no número de servidores e perda de grande parte da sua autonomia administrativa, financeira e econômica, além de ter diversos setores terceirizados.[11][12][13] O resultado, segundo Oliveira et alii, tem sido uma queda na qualidade dos serviços, queda na receita, abandono de projetos e demora no atendimento de queixas e solução de problemas. Também iniciou uma pressão para a privatização da autarquia.[12]

Os problemas começaram no governo do prefeito Nelson Marchezan Júnior (2017-2020). Em 2017 o decreto municipal nº 19.650 criou o Comitê de Gestão Orçamentária e Financeira, vinculado ao Gabinete do prefeito, centralizando as decisões referentes aos órgãos e entidades da Administração Pública Municipal. No mesmo ano, o decreto nº 19.651 instituiu o Comitê para Gestão de Despesas de Pessoal, e pela lei complementar nº 810 a gestão do DMAE foi vinculada à Secretaria Municipal de Infraestrutura e Mobilidade Urbana. Essas mudanças tiveram o efeito de reduzir a autonomia da autarquia.[13] Em 2019 foi extinto o Departamento Municipal de Esgotos Pluviais (DMEP), e em 2021 o DMAE passou a se responsabilizar por parte das suas funções de planejamento, execução de obras e contratação de projetos, enquanto outros serviços foram transferidos para as Secretarias de Serviços Urbanos e de Obras e Infraestrutura. O DMAE recebeu apanas parte da estrutura e do pessoal do DMEP, que não têm sido suficientes para cumprir as novas funções.[11]

Em fevereiro de 2021, o Tribunal de Contas do Estado publicou um relatório sobre a situação. Conforme o tribunal, Marchezan Júnior teve "conduta contrária ao interesse público, desarrazoada e imprudente" na gestão da empresa para privatizá-la. Como resultado, os serviços foram prejudicados, implicando em aumento de interrupções no fornecimento de água de mais de 40% em relação ao último ano do governo anterior.[14]

Conforme o relatório, o então prefeito procrastinou a contratação de serviços essenciais para a empresa, mesmo após reiterados alertas dos gestores. Nos quatro anos de gestão do prefeito, as perdas de faturamento tiveram um aumento de R$ 41 milhões, em consequência das atitudes do governante em relação à empresa. Além da não contratação de serviços, Marchezan Júnior negou-se a repor pessoal e retirou-lhe a autonomia, para que ela não pudesse fazê-lo.[14]

Em 2023 o procurador do Ministério Público de Contas emitiu parecer em que declarou ter havido "ingerência ilegal" da Prefeitura na autonomia do DMAE durante a gestão Marchezan e determinou que o seu sucessor, Sebastião Melo (2021-), garantisse essa autonomia, recomendando que se instaurasse processo para acompanhar a tendência percebida de desestatização do órgão.[12]

O DMAE tem um quadro funcional de 3.632 cargos estatutários, mas em 2019 estavam preenchidos somente 1.411,[13] e de acordo com dados do Portal da Transparência de Porto Alegre, em janeiro de 2024 o número havia caído para 1.070.[11] Em 2022 havia sido pedida a contratação emergencial de 400 trabalhadores, mas o pedido foi negado pela Prefeitura, que autorizou a realização de um concurso viabilizando apenas 33 vagas. Na avaliação de Sandra Darui, coordenadora do Conselho de Representantes Sindicais do Departamento Municipal de Água e Esgotos, o sucateamento da autarquia é proposital e nas condições atuais é impossível dar conta da demanda, acrescentando que o sucateamento se reflete em perda de competência técnica e queda na qualidade dos serviços prestados.[11]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. "Lista bens Tombados e Inventariados em Porto Alegre". Prefeitura de Porto Alegre, outubro de 2013
  2. "Alunos da Ufrgs conhecem a Estação Moinhos de Vento". Prefeitura de Porto Alegre, consulta em 13 de maio de 2024
  3. a b c Franco, Sérgio da Costa. Porto Alegre: Guia Histórico. Porto Alegre: EDIUFRGS, 2006, pp. 15-19
  4. a b c Prestes, Antônio João Dias & Rückert, Fabiano Quadros. "A cidade de Porto Alegre e as águas do Guaíba: uma história de encontros e desencontros". In: Cadernos de História, 2017; 18 (29)
  5. Rückert, Fabiano Quadros. "A intendência de Porto Alegre e o controle das águas na Primeira República". In: Clio — Revista de Pesquisa Histórica, 2015;33 (2)
  6. a b c Garss, Carlos Fabiano Alteneta. O princípio da eficiência aplicado nas licitações, modalidade pregão eletrônico, no Departamento Municipal de Água e Esgotos de Porto Alegre - RS. Especialização. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2019, pp. 9-19
  7. a b c Soares, Sérgio Rodrigues Ayrimoraes. Planejamento de Sistemas de Saneamento em Centros Urbanos: Fundamentos para a Formulação de um Modelo Conceitual. Mestrado. Universidade de Brasília, 2002, pp. 96-101
  8. Barros, Eduardo R. Corrêa de. "Antecedentes da fluoretação das águas de abastecimento público no município de Porto Alegre". In: Revista da Faculdade de Odontologia, 1991; 32 (2): 18-21
  9. "Informações Água". Prefeitura de Porto Alegre, consulta em 11 de maio de 2024
  10. "Informações Esgoto Cloacal". Prefeitura de Porto Alegre, consulta em 11 de maio de 2024
  11. a b c d Velleda, Luciano. "Em processo de sucateamento, governo Melo retém R$ 400 milhões no caixa do Dmae". Sul 21, 11 de maio de 2024
  12. a b c Oliveira, Edson Zomar de et al. "DMAE: uma história de resistência". In: Revista da ASTEC, 2024; 23 (51)
  13. a b c Puchalski, Edison. A governança pública na Prefeitura de Porto Alegre e as implicações para a autonomia de gestão no Departamento Municipal de Água e Esgoto – DMAE: uma análise da administração indireta no governo Marchezan. Especialização. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2019, pp. 68-78
  14. a b «Marchezan sucateou o Dmae porque queria privatizá-lo, conclui TCE-RS». Matinal. 10 de fevereiro de 2021. Consultado em 11 de fevereiro de 2021 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]