José Célio Mil-Homens Filipe

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José Célio Mil-Homens da Silva Filipe. Caricatura por Carlos Melo

José Célio Mil-Homens da Silva Filipe (Bombarral, 18 de Agosto de 1928 - Caldas da Rainha, 28 de Maio de 2009) foi um político e técnico de farmácia português.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Nascido no Bombarral, foi o segundo filho de Augusto da Silva Filipe (Alvito, 5 de Novembro de 1899 - Bombarral, 19 de Maio de 1971), empresário e técnico de farmácia, e de Mariana Mil-Homens da Silva Filipe (Bombarral, 8 de Outubro de 1898 - Bombarral, 23 de Fevereiro de 1988). Irmão de Maria Natália Mil-Homens da Silva de Mora Féria, farmacêutica e professora.[1]

Participou no MUD (Movimento de Unidade Democrática) juvenil, na segunda metade dos anos 40, e apoiou activamente as campanhas do General Norton de Matos à Presidência da República, em 1949, com sessão de candidatura realizada no Teatro Eduardo Brazão,[2] e do General Humberto Delgado, em 1958. Integrou o movimento unitário CDE, desde o seu início, e participou nas Campanhas Eleitorais de 1969 e 1973. Eleito pelo Partido Comunista Português (PCP), integrou a vereação da Comissão Administrativa da Câmara Municipal do Bombarral após a revolução do 25 de Abril, tendo exercido funções entre 14 de Agosto de 1974 e Fevereiro de 1976.[3] Foi eleito presidente da mesma Comissão a partir de 27 de Fevereiro de 1975. Após este período, José Célio Mil-Homens Filipe foi vereador eleito da Câmara Municipal do Bombarral durante 14 anos, entre 1976 e 1990. Foi ainda membro da Assembleia Municipal entre 1990 e 1993, tendo participado em 36 sessões. No decurso da sua actividade municipal, desenvolveu um papel importante na defesa dos interesses locais das populações do seu concelho.

Desempenhou, igualmente, diversas funções directivas em várias Associações culturais, desportivas, recreativas e humanitárias, do concelho do Bombarral, de que se destacam o Cine Clube do Bombarral, a União Cultural e Recreativa do Bombarral, a Associação Humanitária Bombeiros Voluntários do Bombarral (2 anos como director e sócio desde os 18 anos), o Teatro Eduardo Brazão e o Sport Clube Escolar Bombarralense (SCEB). Deste último, fez parte da direcção durante 7 anos, foi atleta (ganhou, por exemplo, primeiros prémios em ténis de mesa) e massagista. Nos final dos anos 50, integrou a sociedade de quotas "Amigos do Café Imperial", contribuindo para a recuperação deste espaço comercial bombarralense.

Simultaneamente, exerceu a profissão de técnico/gerente no estabelecimento de família, Farmácia Hipodérmia, Bombarral, onde durante várias décadas exerceu um papel marcante junto da população. Residiu na Foz do Arelho nos últimos anos de vida. Faleceu em 28 de Maio de 2009, nas Caldas da Rainha, tendo sido sepultado no Cemitério de São Brás, no Bombarral. Ficou na memória como um cidadão íntegro, culto e firme das suas convicções políticas, em defesa da liberdade. Sendo caracterizado por uma personalidade fraterna e humanista, mereceu sempre a admiração de todos os funcionários da autarquia, dos restantes eleitos e da população do concelho.[4]

José Célio Mil-Homens Filipe

Juventude[editar | editar código-fonte]

Residente no Bombarral (Rua Luís de Camões, 36), contactou, desde jovem, com cidadãos anti-fascistas, dos quais se podem destacar a família Maldonado Freitas, Dr. Orlando Lindim Ramos, Jorge de Almeida Monteiro, Humberto Sousinha Macatrão, entre outros, com os quais manteve relação de amizade ao longo da vida. Tendo sido grandemente influenciado por este grupo de pessoas, também o aspecto profissional teve um papel preponderante. Aos 16 anos, em Setembro de 1944, termina o Curso de Comércio na Escola Industrial e Comercial de Rafael Bordalo Pinheiro, nas Caldas da Rainha e assume funções na farmácia da família. É ao balcão da farmácia que ganha consciência da falta de resposta das entidades responsáveis para o sector da saúde, contribuindo para o despertar da sua consciência política, tendo participado no MUD juvenil, e apoiado activamente as campanhas do general Norton de Matos e do general Humberto Delgado. Nos anos 40, integrou o clube de futebol "Os Bairristas", do Bombarral.

Sociedade do Café Imperial, Bombarral, 1961. José Célio - fila de cima, 4º a contar da esq.

25 de Abril de 1974[editar | editar código-fonte]

Antes do 25 de Abril, estando o PCP já organizado no Bombarral, vários membros eram presos constantemente, existindo uma "célula" principal na empresa Capristano e Ferreira. Nesta fase, dezenas de bombarralenses, famílias inteiras, não tinham direito a voto, sendo o seu nome escrito a vermelho nos cadernos eleitorais, nomeadamente por altura das eleições do General Humberto Delgado. Enquanto activista, José Célio conseguiu sempre receber o boletim de voto pelo correio, sendo obrigado depois a enviar por um carteiro de confiança.[5] "Eu fui uma das vítimas, apesar de nunca ter estado preso, ao contrário de muitos bombarralenses. Na véspera da revolução recebi uma intimação e é natural que fosse, juntamente com o padre Alfredo Cerca, detido pelas forças policiais. Pelo menos era essa a informação que estava no Forte de Peniche, para que passássemos, pelo menos 24 horas encarcerados. Éramos os chamados reviralhistas, uma vez que fui sempre uma pessoa que nunca se calou e que tomava determinadas atitudes que poderiam ser prejudiciais a certos movimentos que existiam. Mas como não tinha liberdade de acção, não pertenci a nenhum movimento partidário. No entanto, fui durante 7 anos director do Bombarralense e nunca tomei posse do cargo porque nunca quis subscrever um documento, obrigatório na altura, em como não pertencia a organizações subversivas. Pertenci a muitas associações, como a dos Bombeiros, do Cineclube e nunca fui sancionado pelo organismo estatal que tutelava os organismos associativos.".

No dia 25 de Abril de 1974, José Célio tinha um compromisso profissional e constatou que a vila ficara praticamente deserta, uma vez que, minutos antes, tinha havido um apelo na rádio para os estabelecimentos comerciais fecharem e para as pessoas se manterem em casa. Tendo ocorrido, entretanto, a passagem de viaturas militares que se dirigiam para Peniche, dado existirem diversos presos políticos no Forte (nenhum bombarralense). Tal como a maior parte da população, José Célio foi apanhado de surpresa, nunca pensando que, passado um mês após a revolta das Caldas da Rainha, se iria dar a revolução, dado que todas as forças policiais, incluindo a PIDE, estavam de sobreaviso. No dia 26 de Abril, ocorreu, de forma espontânea, uma manifestação popular, com grande emoção da maioria da população.

Após a revolução, com a demissão do Dr. Pedro Pires, os serviços da autarquia ficaram a cargo do sr. Henrique Cortes. No dia 26 de Abril, José Célio e outros, reuniram com o novo dirigente, indicando que estavam indigitados para tomar posse da Câmara, poder este dado por Leiria, através do Governo Civil. Deslocaram-se ao quartel bombarralense onde pediram para retirar as fotografias de Américo Tomás e Marcelo Caetano. Quando se deslocaram à Câmara, no sentido de passar o testemunho, tudo correu dentro da normalidade. São organizadas reuniões no Teatro Eduardo Brazão, por convites, com cerca de 120 pessoas, onde foram discutidos os passos seguintes, das quais saiu uma comissão, que teria de se submeter a um sufrágio, que teve lugar no Campo de Futebol, onde estiveram centenas de pessoas. O acto foi sancionado pelo Movimento das Forças Armadas e pelo Dr. José Vareda (advogado), após um escrutínio popular, dado o período revolucionário que decorria. A Comissão Administrativa resultou composta por: António Costa (eleito presidente), Dr. Fernando Neto Ferreirinha, José Célio Mil-Homens Filipe, Albertino Monteiro Crespo, Antero Furtado, Dário Melo Bruno e Rodérico Souto Patuleia. Tomaram posse a 1 de Agosto de 1974, nos Paços do Concelho, no Bombarral. Mais tarde, em Abril de 1975, o Sr. António da Costa abandona a presidência e os restantes membros elegem José Célio como Presidente da Comissão. Por alvará do Sr. Governador Civil, tomou posse em 28 de Abril de 1975.[5]

Por ocasião do Verão Quente de 1975, o Bombarral esteve em estado de sítio durante três dias. Foram efectuados diversos assaltos, nomeadamente ao Banco Português do Atlântico e às sedes do PCP e do Movimento de Esquerda Socialista, às quais foi ateado fogo. Surgiram grupos extremistas, auto-intitulados de comunistas, quando eram apenas contra a situação, com atitudes que acabaram por dar uma má imagem da esquerda. Nesta fase, José Célio Filipe e mais dois elementos da Comissão Administrativa - Albertino Monteiro Crespo e Dr. Fernando Neto Ferreirinha, foram obrigados a deslocar-se ao Quartel das Caldas da Rainha, com o objectivo de falar com o Governador Civil, dado que a vila estava a saque. Nomeadamente, houve grupos do Bombarral e de povoações dos concelhos em redor que, munidos de espingardas, matracas e pistolas, levaram o comércio a fechar.[5]

Entretanto, afastam-se dois elementos muito influentes no trabalho da Comissão Administrativa, Albertino Monteiro Crespo e Antero Furtado, devido a discordâncias com o Governador Civil de Leiria. José Célio fica praticamente isolado nesta fase, tendo continuado a gerir a Câmara até Fevereiro de 1976. Esteve ano e meio na Câmara, o que o levou a deixar a farmácia maioritariamente a cargo de sua mulher, Maria Leonide Carvalho Castelo Filipe. Em Junho de 1975, três elementos da Comissão Administrativa tomam uma opção política e filiam-se no PCP, começando a ser perseguidos por pessoas que, até essa altura, lhes tinham dado apoio. Sucede-se uma tentativa de novas eleições, defronte dos Paços do Concelho, organizada pelos chamados "amarelos", sendo José Célio colocado numa lista eleitoral sem o terem consultado. Tal lista obteve pouco mais de trinta votos quando, previamente, no campo de futebol do SCEB, tinham existido centenas de votos. Nas palavras de José Célio: "a manobra foi tal que enganaram o oficial da Força Aérea, vindo da Esquadra do Montejunto e que, ao inteirar-se da situação, se foi embora completamente ofendido com a situação criada. Foi uma coisa carnavalesca!". Bombarralenses, ligados à política, chegaram a mandar tocar o sino a rebate com o objectivo de colocar a Comissão Administrativa fora da Câmara, invadindo o edifício dos Paços do Concelho, no intuito de expulsar José Célio da autarquia. Mais tarde, com a saída de outros elementos da Comissão devido a discordâncias políticas, José Célio foi convidado a presidir a nova comissão, tendo recusado, por uma questão de lealdade com os colegas. Sucede-lhe o Dr. Fernando Mouga, que assegurou funções até às eleições autárquicas.[5]

No final da entrevista dada ao jornal "Área Oeste", em 1995, diz: "Hoje choca-me mais a hipocrisia e a subserviência, estando o respeito a ser substituído pelo medo e pelo ódio, mercê da sociedade de consumo em que hoje vivemos. O futuro está na juventude...".

Família[editar | editar código-fonte]

Casou com Maria Leonide Carvalho Castelo Filipe em 1955, no Santuário do Senhor Jesus do Carvalhal, e tiveram uma filha, Regina Manuela Castelo Filipe, a qual casou casou e teve um filho, Pedro Castelo Filipe Moreira dos Santos.

Referências

  1. «Presidentes da Câmara Municipal do Bombarral - 10». Nuno Ferreira. 1 de abril de 2013 
  2. Serra, João B. (2019). Artista à procura da sua história : Luís Ferreira da Silva. Caldas da Rainha: ESAD.CR - Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha. OCLC 1156389103 
  3. PIRES DE ALMEIDA, MARIA ANTONIA (2013). O Poder Local do Estado Novo à Democracia: Presidentes de câmara e governadores civis, 1936-2012. [S.l.]: Leya. ISBN 9892036638, 9789892036632 Verifique |isbn= (ajuda) 
  4. «Necrologia». Avante!. 18 de Junho de 2009 
  5. a b c d Silva, José Victor; Paulo Ribeiro (6 de Maio de 1995). «Memórias de Abril». Área Oeste 
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