Lineamento Transbrasiliano

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O Lineamento Transbrasiliano (LTB) é uma estrutura geológica de sutura referente ao fechamento do oceano Goiás-Farusiano [1]. Compreende colisão entre os blocos continentais Amazonia-West Africa e Africano Central. O LTB é uma parte importante da amalgamação do supercontinente Gondwana, há cerca de 600 Ma, e divide o Brasil entre os domínios geológicos Amazônico e Brasiliano, sendo um corredor tectônico com uma zona de cisalhamento, que corta desde o nordeste brasileiro até o Paraguai e a Argentina. Além disso, apresenta continuidade no continente africano, estendendo-se do Togo até a Argélia, sendo representado pelos lineamentos Hoggar 4º50’ e Kandi. A extensão total estimada do LTB é de aproximadamente 4000km.

Caracterização Estrutural[editar | editar código-fonte]

O LTB é um dos maiores sistemas de falha transcorrente do mundo, e se estende desde as Sierras Pampeanas, Argentina, até o Oceano Atlântico, com uma direção aproximada NE. Além disso, esse sistema se manifesta como uma descontinuidade magnética de escala continental[2]. O lineamento evoluiu durante o Precambriano e passou por, pelo menos, três episódios de reativação [3]. Sua superfície está exposta evidentemente na porção central do Brasil, onde afloram rochas Precambrianas, mas, com exceção de onde foi reativado, não aflora em terrenos Paleozóicos [4]. O Lineamento Transbrasiliano marca o contato entre o Cráton da Amazônia, a NW, com os arcos magmáticos e blocos alóctones das faixas móveis Neoproterozóicas, a SE[3]. A nordeste, o lineamento é limitado pela plataforma continental brasileira do Atlântico Sul. A direção principal da porção norte do lineamento é a mesma do lineamento Hoggar 4°50’, que se estende a partir da Argélia central até a costa do Togo [5][6]. O lineamento é recoberto por sedimentos na porção da Bacia do Paraná [7], e usando modelamento de velocidade de ondas S, Feng et al 2004 [8] reconheceram a extensão sudoeste do lineamento, assim como um trend estrutural para Oeste próximo a faixa móvel Paraguai. O lineamento corresponde ao ultimo episódio tectônico associado com a orogenia Pan-Africana-Brasileira no Neoproterozóico [1] e mostra evidência estrutural de uma cinemática transcorrente dextral [4] Na extensão sul do Arco Magmático de Goiás, pequenas intrusões alongadas de granito apresentam foliação milonítica pronunciada, que corta estruturas dúcteis deformacionais anteriores [9]. Esses granitos se apresentam como bandas finas afetadas pela foliação milonítica, e deslocadas cerca de 8 km ao longo da falha[10]. O lineamento passou por pelo menos três fases de reativação durante o Fanerozóico. Pequenas bacias do tipo pull-apart como Jaibaras, no Ceará[11], e Água Bonita, no Tocantins[12] são resultados de episódios de reativação durante os perídos Cambriano-Ordoviciano e Siluriano-Devoniano, respectivamente. Um terceiro episódio, decorreu da abertura do Oceano Atlantico durante o Cretácio, e é marcado por uma série de falhamentos normais, por vezes, cortando sequencias Paleozoicas e causando deslocamentos maiores do que 500 metros[13].

Estruturas do lineamento relacionadas à subducção[editar | editar código-fonte]

É possível correlacionar rochas magmáticas e eclogíticas nos estados do Ceará e Goiás ao Lineamento Transbrasiliano, como produto de zonas de subducção e magmatismo juvenil, relacionado ao processo de fechamento do paleoceano Goiás Farusiano. No estado de Goiás, o LTB é marcado pelo arco magmático de Goiás, enquanto no estado do Ceará é marcado pelo Arco de Santa Quitéria e pelos eclogitos de Forquilha.

Arco Magmático de Goiás[editar | editar código-fonte]

Segundo Brito Neves (1999)[3], o Arco Magmático de Goiás resultou de colagem de sistemas de arcos neoproterozoicos, pois acontecia um processo de colisão entre diversos blocos cratônicos, entre eles o Amazônico e São Francisco. Uma das consequências desse processo de colisão foi o fechamento do paleoceano Goiás-Farusiano. Portanto, o lineamento é uma das principais estruturas que ajudam a entender a evolução da Faixa Brasília. O Arco Magmático de Goiás é composto por dois arcos menores, divididos por um bloco arqueano. O arco sul é chamado de Arenópolis e o norte de Mara Rosa. Um fato comum entre esses dois arcos é que sua evolução iniciou há cerca de 900 milhões de anos, como arcos de ilha oceânicos, e terminou por volta de 600 milhões de anos, com o fechamento do paleoceano Goiás-Farusiano [14]. O Arco Magmático de Goiás compreende dois principais pacotes rochosos: uma sequência supracrustal (menor profundidade) e uma sequência plutônica. A sequência supracrustal compreende rochas vulcânicascalc-alcalinas, xistos, quartzitos e mármore. A sequência plutônica compreende rochas plutônicas calc-alcalinas, metamorfizadas e deformadas, cortadas por intrusões bimodais de granito pós-tectônico. Dados geoquímicos de datação absoluta indicam evidências de três eventos magmáticos na região do Arco Magmático de Goiás, com idades de 900-804 Ma, 790-786 Ma e 669-630 Ma [14]. Esses dados de ativação magmática são compatíveis com o contexto de amalgamação de continentes e fechamento de oceano estimados para a época.

Arco de Santa Quitéria[editar | editar código-fonte]

O Arco Magmático de Santa Quitéria é composto por uma associação litológica diversificada interpretada como resultado de magmatismo proveniente de subducção. A associação de rochas no arco compreende gabros, tonalitos, granodioritos, monzogranitos e granito. Segundo Santos [15], o Arco Magmático de Santa Quitéria é um arco continental, situado em um contexto de colisão entre duas placas cratônicas. Esse contexto de colisão gerou também simplificadamente três estruturas: nappes (blocos de rocha movidos a uma distância maior que 2km) contendo sedimentos de margem continental passiva; nappes contendo rochas sedimentares e ígneas (máficas e ultramáficas); e nappes contendo gnaisses e rochas mais antigas. O Arco Magmático de Santa Quitéria seria a representação magmática desse grande contexto colisional continental. Segundo Amaral [16], as rochas do arco tem idade de cristalização de 660 a 614 milhões de anos, e apresenta características geoquímicas da série das plutônicas félsicas de alto potássio. Os estudos geoquímicos indicam que essas rochas foram oriundas de processos magmáticos juvenis.

Faixa Eclogítica de Forquilha[editar | editar código-fonte]

As rochas eclogíticas encontradas no Ceará estão expressas na Faixa Eclogítica de Forquilha. No local há uma complexa organização heterogênea das rochas. Há gnaisses com diferentes graus de migmatização e eclogitos que sofreram retrometamorfismo, envolvidos pelos migmatitos sob a forma de lentes. Além disso na região são encontradas rochas cálcio-silicáticasboudinadas [17]. Dentre as características da Faixa Eclogítica de Forquilha é possível observar a presença de faixas de gnaisses milonitizados, orto, paragnaisses e augengnaisses. A presença de heterogeneidade da fusão parcial dessas rocha, gerando unidades leucocráticas em algumas regiões. As rochas cálcio-silicáticas e retroeclogiticas encontram-se encaixadas nos gnaisses, ambas em um lineamento de direção praticamente N-S, sob a forma de boudins (muitas vezes os eclogitos apresentam formas de boudins semelhantes a lentes [17]. Os eclogitos encontrados na região apresentam metamorfismo retrógrado heterogêneo, que sofreu influência de percolação de fluidos metamórficos durante o processo de exumação. O retrometamorfismo foi bem mais intenso nas bordas das estruturas e foi causado principalmente por descompressão e percolação de fluidos (desestabilizou a paragênese da fácies eclogito para granulito). Dados geoquímicos [16] indicam que os retroeclogitos de forquilha apresentam afinidade com basaltos N-MORB, os mesmos das dorsais oceânicas, o que sugere que essas rochas foram produto de fato de zonas de subducção.

Continuidade no continente africano[editar | editar código-fonte]

Mais uma evidência da tectônica de placas, o LTB mostra claros sinais de que se estende no continente africano. Esta continuidade é sugerida por reconstruções paleogeográficas através de evidências geológicas, geocronológicas e paleomagnéticas. O lineamento Hoggar-Kandi seria o correspondente ao LTB na África, estando relacionado ao mesmo fechamento oceânico. Os lineamentos são coerentes e marcados por anomalias magnéticas lineares, tanto na África quanto no Brasil. A Zona do Eclogito de Forquilha, uma zona de sutura, caracterizada no nordeste brasileiro relacionada ao LTB, é interpretada como uma extensão de zonas de sutura bem definidas no continente africano, relacionadas ao lineamento Hoggar-Kandi.


Terremotos relacionados ao Lineamento Transbrasiliano[editar | editar código-fonte]

O LTB é responsável por recorrentes abalos sísmicos que ocorrem na bacia sedimentar do Pantanal. Esta região está sujeita a abalos sísmicos, pois ocorrem rupturas nas formações rochosas que compõem sua formação basal. A movimentação dos blocos implica na alteração do nível de base da região, acarretando mudanças no curso dos rios e acomodações de sedimentos, dentre eles o Taquari. O Lineamento Transbrasiliano exerce um forte papel na dinâmica de sedimentação e erosão, além de ser responsável pelo leque aluvial do Taquari, possuindo uma área de aproximadamente 50 000 Km quadrados. Os principais registros de sismos no Brasil ocorreram na bacia d o Pantanal, com os maiores tremores registrados em Miranda,em 1964 com magnitude de 5.4 na escala Richter e do Coxim,também em MS,mas correndo em 2009 com magnitude de 4.8. Ambos os municípios apresentam uma baixa altitude, 125 m em Miranda e 238 m em Coxim. Os danos em Coxim foram rachaduras em casas,vidraças quebradas,ondas sísmicas chegaram a atingir a capital sulmatogrossense a 300 Km de distância. Registros mostram que vários sismos menores já ocorreram em outras regiões do Pantanal, como Porto Murtinho, Ladário e Corumbá.

Referências

  1. a b Cordani, Umberto & Pimentel, Márcio &Ganade de Araujo, Carlos &Fuck, Reinhardt. (2013). The significance of the Transbrasiliano-Kandi tectonic corridor for the amalgamation of West Gondwana. BrazilianJournalofGeology. 43. 583-597.
  2. Fairhead, J., and S. Maus (2003), CHAMP satellite and terrestrial magnetic data help define the tectonic model for South America and resolve the lingering problem of the pre-break-up fit of the South Atlantic Ocean, Leading Edge, 22, 779–783, doi:10.1190/1.1605081.
  3. a b c Brito Neves, B. B., M. C. Campos Neto, and R. A. Fuck (1999), From Rodinia to Western Gondwana: An approach to the Brasiliano-Pan African Cycle and orogenic collage, Episodes, 22(03), 155–166.
  4. a b Dantas, E. L.,R.A.Fuck, C. G.deOliveira,M.M. Pimentel,D.A.Sordi,andT.Almeida (2007), Geometria Côncava do Sistema de Empurrões no Arco Magmático de Mara Rosa, Goiás, XI Simpósio Nacional de Estudos Tectônicos, Natal-RN, Extended Abstracts, vol. 1, pp. 202–204, SBG, São Paulo, SP, Brazil.
  5. Cordani, U. G., B. B. Brito Neves, and M. S. D’ Agrella-Filho (2003), From Rodinia to Gondwana: A review of the available evidence from South America, Gondwana Res., 6(2), 275–284, doi:10.1016/S1342-937X(05)70976-X.
  6. Arthaud, M. H. (2007), Evolução neoproterozóica do Grupo Ceará (Domínio Ceará Central, NE Brasil): da sedimentação à colisão continental brasiliana, Ph.D thesis, Instituto de Geociências, Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brazil.
  7. Milani, E. J., and V. A. Ramos (1998), Orogenias paleozóicas no domínio sul-ocidental do Gondwana e os ciclos de subsidência da Bacia do Paraná, Rev. Bras. de Geociências, 28(4), 527–544.
  8. Feng, M., M. S. Assumpção, and S. Van Der Lee (2004), Group-velocity tomography and lithospheric S-velocity structure of the South American continent, Phys. Earth Planet. Inter., 147, 315–331, doi:10.1016/j.pepi.2004.07.008.
  9. Pimentel, M. M., and R. A. Fuck (1987), Late Proterozoic granitic magmatism in southwestern Goiás, Brazil, Rev. Bras. de Geociências, 17, 415–425.
  10. Seer, H. J. (1985), Geologia, deformação e mineralização de cobre no complexo vulcanossedimentar de Bom Jardim de Goiás, M.S. Dissertation, Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brazil.
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  13. de Alvarenga, C. J. S., E. M. Guimarães, M. L. Assine, and J. A. de Perinotto (1998), Sequência Orodovício-Siluriano e Devoniano no Flanco Norte da Bacia do Paraná, Anais da Academia Brasileira de Ciências, 70(3), 587–606.
  14. a b Pimentel M.M., Fuck R.A., Jost H., Ferreira-Filho C.F., Araújo S.M. 2000. The basement of the Brasília Fold Belt and the Goiás Magmatic Arc.
  15. SANTOS, Ticiano José SaraivaWERNICK, EberhardROSA, Fernando Ferreira . O arco magmático de Santa Quitéria, Ceará: caracterização e importância geotectônica. 2008.
  16. a b Amaral W.S., Santos T.J.S. &Wernick, E. 2011. Occurrence and geochemistry of metamafic rocks from the ForquilhaEclogite Zone, Central Ceará (NE Brazil): geodynamic implications. GeologicalJournal, 46(2-3):137-155.
  17. a b Ancelmi, Matheus & Santos, Ticiano& Augusto Reginato, Rafael & Amaral, Wagner & Monteiro, Lena. (2013). Geologia da Faixa Eclogítica de Forquilha, Domínio Ceará Central, noroeste da Província Borborema. Brazilian Journal of Geology. 43. 235-252.