Pois que dos reys Nostro Sennor

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Pois que dos reys Nostro Sennor, no Códice de Toledo das Cantigas de Santa Maria

Pois que dos reys Nostro Sennor AFI/ˈpojs ke dos rejs ˈnɔstɾo seˈɲoɾ/[1] (em português atual: Pois que dos reis Nosso Senhor), é uma das Cantigas de Santa Maria (CSM 424), conjunto de composições em galego-português do século XIII, atribuída a Afonso X, o sábio. É a segunda do grupo das Cinco Cantigas das Cinco Festas de Nosso Senhor, com que se conclui a obra.

O tema da composição, pouco comum no conjunto das cantigas, é a história da viagem e adoração dos Reis Magos (como os tres Reis Magos vẽeron a Beleen aorar a Nostro Sennor Jesu Cristo e Lle ofereron seus dões).

A sua importância advém do facto de ser muito possivelmente a mais antiga cantiga de Natal em vernáculo da Península Ibérica que chegou aos nossos dias [2].

Fontes e datação[editar | editar código-fonte]

A cantiga aparece completa no códice de Toledo (To) e fragmentária no códice rico do Escorial (T). O códice de Toledo, e por isso também a esta composição, está datado entre os anos 1257 e 1277.[3]

Letra[editar | editar código-fonte]

Como os tres Reis deron sa oferta a Jesu Cristo, iluminura do Códice do Escorial.

O texto narra a viagem e adoração dos três Reis Magos[3], usando como fontes a narração bíblica do Evangelho de Mateus (Mateus 1:1–16 e Mateus 2:1–12) e a tradição:

Original
(Códice de Toledo)
Tradução livre
Refrão:

Pois que dos reys Nostro Sennor
quis de seu linage decer,
con razon lles fez est'amor
en que lles foi apareçer.

Refrão:

Visto que Nosso Senhor
quis descender da linhagem dos reis,
é justificada a sua demonstração de amor
quando lhes foi aparecer.

Esto foi quand'en Beleen
de Santa Maria naçeu
e a treze dias desen
aos Tres Reys apareçeu
que cada ũu per seu sen
ena estrela connoçeu
com'era Deus Rey; e poren
de longe o foron veer.

Isto foi quando em Belém
de Santa Maria nasceu
e treze dias depois
aos três Reis apareceu.
Que cada um por seu entendimento
na estrela conheceu
como era Deus Rei; e por isso
de longe o foram ver.

Ben das ínsoas de Saba
e de Tarsso, que son no mar,
e d'Arabia, u gran gent'a
e muitas terras de passar.
Mas pero eran lonj'ala
mui toste os fezo chegar
a Beleen aquel que a
sobre todas cousas poder.

Desde as ilhas de Sabá
e de Tarso, que são no mar,
e da Arábia, onde muita gente há
e muitas terras a passar.
Mas, ainda que estavam lá longe,
muito rápido os fez chegar
a Belém aquele que tem
sobre todas as coisas poder.

Ena estrela lles mostrou
com'era om'e rey e Deus;
poren cada ũu lle levou
oferta dos tesouros seus.
E a estrela os guiou
ate ena terra dos judeus,
u Erodes lles demandou:
“Que vẽestes aqui fazer?”

Na estrela lhes mostrou
como era homem, rei e Deus;
Por isso cada um lhe levou
oferta dos tesouros seus.
E a estrela os guiou
até à terra dos judeus,
onde Herodes lhes perguntou:
“Que viestes aqui fazer?”

Eles responderon-ll'assi:
“Na estrela vimos que rey
mui nobre naçera aqui,
Sennor dos judeus e da lei.”
Diss'Erodes: “Creed'a mi,
ca bon conssello vos darei:
id'e pois tornardes desi,
ar y-lo-ei eu connoçer.”

Eles responderam-lhe assim:
“Na estrela vimos que um rei
muito nobre nascera aqui,
Senhor dos judeus e da Lei.”
Disse Herodes: “Crede em mim
que bom conselho vos darei:
ide e depois tornai de lá
que também o irei eu conhecer”.

Eles foron-sse logu'enton
e viron a estrela yr
antessi de mui gran randon,
e começarona seguyr;
mas quand'en Beleen foi, non
se quis de sobr'ela partir,
ata que entraron u Don
Jesu-Cristo viron seer

Eles foram-se logo, então
e viram a estrela ir
ante deles a grande velocidade,
e começaram-na a seguir;
mas quando chegou a Belém, não
se quis mover de cima dela,
até que entraram onde Dom
Jesus Cristo viram estar

Nos braços da que muit'afan
sofreu con el e muito mal.
E eles logo manaman
deron-lle sa oferta tal:
ouro de que aos reis dan,
encensso por espirital,
mirra de que os mortos van
ungir por nunca podreçer.

Nos braços da que muitas dores
sofreu com Ele e muito mal.
E eles, logo de imediato,
deram-lhe sua oferta, assim:
ouro (que aos reis se dá),
incenso (como espiritual),
mirra (com que se costuma aos mortos
ungir para nunca apodrecer).

Esto, ca non maravidis,
ofereron a Deus los reys;
porend'assi os guardar quis
aquele que juntou as leis,
que per sonnos os fez ben fis,
que sonnaron vel cinc'ou seis
vezes que fossen a Tarssis
passa-lo mar por guareçer.[1][4]

Isto, e não maravedis,
ofereceram a Deus os Reis;
por isso, assim os guardar quis
aquele que juntou as Leis;
Porque por sonhos os fez sabedores,
que sonharam cinco ou seis
vezes que fossem a Társis
passar o mar para se salvarem.

Música[editar | editar código-fonte]

Pois que dos reys Nostro Sennor é um virelai de ritmo binário.[3]


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Referências

  1. a b Andrew Casson. «Cantigas de Santa Maria for Singers» (em inglês). Consultado em 5 de janeiro de 2015 
  2. Xosé Filgueira Valverde (1992). Estudios sobre lírica medieval: Traballos dispersos (1925-1987) (em galego) 1 ed. [S.l.]: Galaxia. p. 101 
  3. a b c Eduardo Paniagua (2010). «Cantigas de Nuestro Señor» (em espanhol). Consultado em 25 de janeiro de 2015 
  4. Afonso X. «Cantigas de Santa Maria (Códice de Toledo)» (em Galaico-português). Biblioteca Digital Hipánica. pp. 290 e 291. Consultado em 25 de janeiro de 2015