Relaxamento (cinética química)

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O Relaxamento em Cinética Química ou Método do Relaxamento (Relaxation Methods) é um método para determinar a taxa de reações químicas muito rápidas, que não podem ser determinada pelos métodos clássicos. O relaxamento se baseia no princípio de perturbar um sistema inicialmente em equilíbrio através das variáveis que determinam tal condição (temperatura, pressão, concentração). Em seguida, pode-se determinar as constantes de taxa seguindo a abordagem do sistema para sua nova posição de equilíbrio, isto é, a partir de uma medição do tempo necessário para o sistema relaxar.[1][2][3]

Descrição das técnicas[editar | editar código-fonte]

Três técnicas são comumente usadas para determinar as constantes de taxa no método do relaxamento: salto de temperatura (Temperature jump), salto de pressão (Pressure jump) e o salto de campo elétrico (Electric field pulse). Em todos eles o princípio é o mesmo: o sistema é perturbado por um impulso repentino para determinar as constantes de taxas durante o tempo em que o sistema alcança o novo estado de equilíbrio.[3]

Salto de temperatura[editar | editar código-fonte]

No salto de temperatura, a variável que determina a condição de equilíbrio a ser perturbado é a temperatura. Nessa técnica, um capacitor eleva a temperatura do sistema inicialmente em equilíbrio de para através de um condensador de alta voltagem. Logo, ao ser aquecido, o equilíbrio do sistema é perturbado, alcançando um novo estado de equilíbrio.

A magnitude das mudanças de concentração é ditada pelas leis da termodinâmica. Tomando-se a constante de equilíbrio como:

E derivando em função da temperatura:
A dependência da temperatura pela Energia de Gibbs de modo que derivando equivale a . Logo:

Esta equação mostra explicitamente que uma diferença de entalpia é necessária para que haja qualquer mudança mensurável na composição química do equilíbrio.[4] O sistema, dessa forma, será perturbado por um salto de temperatura se qualquer uma das reações for caracterizada por uma mudança de entalpia diferente de zero.[5] Por meio dessa técnica, é possível induzir um aumento de temperatura de até 10 °C em um microssegundo. Uma série de catalisadores enzimáticos foi estudada desta forma.[2][3]

Salto de pressão[editar | editar código-fonte]

No salto de pressão, a condição inicial de equilíbrio do sistema é perturbada pela mudança repentina de pressão. Esse método depende da existência de uma mudança de volume na reação em estudo. Uma vez que o progresso da maioria das reações químicas em solução é acompanhado por uma mudança no volume, logo, de acordo com o Princípio de Le Chatelier's, a posição de equilíbrio de uma reação reversível pode ser deslocada alterando a pressão aplicada à solução a reação.[6]

A constante de equilíbrio pode ser escrita como:

Derivando a equação em função da pressão, tem-se:

Como a Energia de Gibbs depende da pressão, logo :

Onde é mudança de volume padrão para a reação, e é a constante de equilíbrio.[7] A mudança de volume torna possível deslocar as concentrações de reagentes de suas concentrações de equilíbrio em uma atmosfera, uma vez que:

Logo, ao ser afetado por uma mudança de pressão, a cinética da reação fica:
Essa técnica é eficaz para reações com alterações de volume relativamente altas. O método mais conveniente de induzir um salto de pressão é por uma onda de choque ou uma liberação de pressão hidrostática de um diafragma de ruptura.[2][3]

Salto de campo elétrico[editar | editar código-fonte]

No método de salto de campo elétrico, um campo elétrico repentinamente aplicado muda o equilíbrio de uma reação que envolve uma mudança no momento dipolo total [2][8]. Este método tem sido usado para medir constantes de taxa de muitas reações de protonação e desprotonação, todas as quais são cerca de . Essas reações são controladas por difusão.

Base teórica[editar | editar código-fonte]

O equilíbrio do sistema ao ser perturbado por uma das variáveis que determinam a condição de equilíbrio, alcança um novo estado de equilíbrio, isto é, o sistema relaxa para um novo estado. Logo, considerando que o equilíbrio inicial esteja em , tem-se:

Onde as velocidades das reações direta e inversa são, respectivamente e . Logo:
Ao ser perturbado pelo aumento repentino de temperatura o sistema relaxa para novas concentrações em favorecendo os reagentes. As concentrações no novo equilíbrio são e .Fazendo a diferença entre as concentrações dos diferentes equilíbrios, tem-se:
A taxa da reação pode ser reescrita em termos de desvio , isto é, . A equação 1, substituindo , e , fica:

Quando o equilíbrio é alcançado, a razão . Também o desvio de é pequeno, de modo que .

Como é desprezível, tomando a equação 3 e substituindo em 2, negligenciando entre os parênteses, tem-se:

Integrando:

Definido , onde é o tempo de relaxamento:

Como , a equação final fica:

Aplicações[editar | editar código-fonte]

Modelagem cinética da dinâmica conformacional a partir dos dados de salto de temperatura

O método de relaxamento possui muitas aplicações. Uma dessas aplicações é o fornecimento de dados de processos elementares em dobramento de proteínas. Um exemplo da aplicação do método é na obtenção de  dados críticos nas escalas de tempo dos processos elementares em dobramento de proteínas, como a formação α-hélice a e β-grampo, que foram essenciais para a compreensão dos primeiros eventos no dobramento de proteínas globulares.[9][10] Outra aplicação do método do relaxamento consiste no estudo do dobramento de oligonucleotídeos. Aqui é utilizado um salto de temperatura de laser (T-jump), onde a cinética é monitorada medindo a mudança na fluorescência de 2-aminopurina (2AP), um análogo fluorescente da base de adenina, que é substituído em vários locais ao longo da haste do grampo de cabelo.[11] Outras aplicações se estendem à dinâmica de reações enzimáticas. Aqui a espectroscopia de relaxamento de salto de temperatura induzida por laser é ser usada, juntamente com abordagens computacionais (ou seja, cálculos de dinâmica molecular e assim por diante) e outros, para determinar a dinâmica do movimento da proteína.[4]

Referências

  1. Eigen, M. (1954). «Methods for investigation of ionic reactions in aqueous solutions with half-times as short as 10 –9 sec. Application to neutralization and hydrolysis reactions». Discuss. Faraday Soc. (em inglês) (0): 194–205. ISSN 0366-9033. doi:10.1039/DF9541700194. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  2. a b c d Levine, Ira N., 1937- (2009). Physical chemistry 6th ed. Boston: McGraw-Hill. OCLC 191024171 
  3. a b c d Avery, H. E. (Harold Eric) (1974). Basic reaction kinetics and mechanisms. [London]: Macmillan. OCLC 886832 
  4. a b Callender, R (1 de outubro de 2002). «Probing protein dynamics using temperature jump relaxation spectroscopy». Current Opinion in Structural Biology (em inglês) (5): 628–633. doi:10.1016/S0959-440X(02)00370-6. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  5. French, Thayer C.; Hammes, Gordon G. (1969). «[1] The temperature-jump method». Elsevier (em inglês): 3–30. ISBN 978-0-12-181873-9. doi:10.1016/s0076-6879(69)16004-8. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  6. Knoche, W. (1975). Wyn-Jones, E., ed. «Pressure-Jump Methods». Dordrecht: Springer Netherlands. NATO Advanced Study Institutes Series (em inglês): 91–102. ISBN 978-94-010-1855-5. doi:10.1007/978-94-010-1855-5_10. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  7. Takahashi, M. T.; Alberty, R. A. (1 de janeiro de 1969). «[2] The pressure-jump method». Academic Press. Fast Reactions (em inglês): 31–55. doi:10.1016/s0076-6879(69)16005-x. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  8. Chen, Chih-ping; J. Heinsohn, R.; N. Mulay, L. (15 de agosto de 1968). «Effect of Electrical and Magnetic Fields on Chemical Equilibrium». Journal of the Physical Society of Japan (em inglês) (2): 319–322. ISSN 0031-9015. doi:10.1143/JPSJ.25.319. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  9. Kubelka, Jan (2009). «Time-resolved methods in biophysics. 9. Laser temperature-jump methods for investigating biomolecular dynamics». Photochemical & Photobiological Sciences (em inglês) (4). 499 páginas. ISSN 1474-905X. doi:10.1039/b819929a. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  10. Eaton, William A.; Muñoz, Victor; Thompson, Peggy A.; Henry, Eric R.; Hofrichter, James (novembro de 1998). «Kinetics and Dynamics of Loops, α-Helices, β-Hairpins, and Fast-Folding Proteins». Accounts of Chemical Research (em inglês) (11): 745–753. ISSN 0001-4842. doi:10.1021/ar9700825. Consultado em 24 de setembro de 2020 
  11. Ansari, Anjum; Kuznetsov, Serguei V.; Shen, Yiqing (3 de julho de 2001). «Configurational diffusion down a folding funnel describes the dynamics of DNA hairpins». Proceedings of the National Academy of Sciences (em inglês) (14): 7771–7776. ISSN 0027-8424. PMC 35417Acessível livremente. PMID 11438730. doi:10.1073/pnas.131477798. Consultado em 24 de setembro de 2020