Tratado do Rio de Janeiro (1909)

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O Tratado do Rio de Janeiro, assinado em 8 de setembro de 1909, estabeleceu as fronteiras atuais do estado do Acre. O Tratado foi firmado entre o Brasil e o Peru.

Pelo Tratado foi reduzido em 40 000 km² o território do Acre estabelecido no Tratado de Petrópolis, que se estendia até as cabeceiras do rio Purus.[1]

Mapa que apresenta as pretensões peru-bolivianas na região do Território do Acre.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

A Questão do Acre foi bem mais complexa do que crê a maioria. Pretensões peruanas, bolivianas e brasileiras se sobrepunham em uma área enorme, a maior até hoje a ser objeto de uma arbitragem.[2]

De acordo com o Barão do Rio Branco, depois da publicação da Geografia do Peru, de Paz Soldán, em 1863, começou essa República a considerar incompleta a sua fronteira com o Brasil e a reclamar a linha Javari-Madeira, do Tratado de 1777.[3] Essas pretensões vinham de encontro ao estabelecido no Tratado de Comércio, Navegação e Limites de 1851 celebrado entre Brasil e Peru.[3]

Sendo assim, o litígio sobre fronteiras com o Peru surgiu em 1863. Não foi, portanto, uma conseqüência do Tratado, que se chamou de Petrópolis, concluído entre o Brasil e a Bolívia em 17 de novembro de 1903.[3]

Cabe salientar que a base única da pretensão peruana era o Tratado Preliminar de 1777 entre Portugal e Espanha, já reconhecido sem valor pelo próprio Peru em 1851, e cuja validade o Brasil nunca admitiu no ajuste de seus limites com as demais Repúblicas confinantes: Venezuela, Colômbia, Equador, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai.[3]

Ao passo que o Peru demandava territórios que o Brasil considerava seus, devido ao risco da Bolívia se aliar ao Paraguai no Gerra do Paraguai, o Brasil se apressou em celebrar um acordo de fronteiras com os bolivianos. Assim nasceu o Tratado de Ayacucho, em 1867.[3]

Frente a isso, e apesar de desde muitos anos, inúmeros brasileiros terem se internado pelas regiões setentrionais do país, explorando imensas zonas incultas e ali se estabelecendo pacificamente na exploração da goma da seringueira, o Peru protestou contra o diploma em nota de 20 de dezembro daquele ano, ao Governo de La Paz.[3]

No Juruá, como faz lembrar o Barão do Rio Branco, estendiam-se os brasileiros, já em 1870, até às margens do Amônea e do Tejo; e, no Purus, ocupavam desde 1883 a confluência do Araçá, depois chamado Chandless, e findavam no mesmo ano, mais acima, sobre as duas margens do rio principal, os estabelecimentos de Porto, Mamoreá e Triunfo Novo; e, em 1884, os de Refugio, Fronteira do Cassiano e Novo lugar. E, aliás, como ainda acentua o ministro, o Purus desde 1861, já fora explorado pelo sertanejo brasileiro Manuel Urbano da Encarnação, até perto do Curanja e, em 1867, com o auxílio do governo brasileiro, por William Chandless, em companhia do mesmo Manuel Urbano, até pouco além da confluência do Cavaljani, isto é, até às vizinhanças de sua nascente principal.[3]

Em várias ocasiões, especialmente em 1868, 1870 e 1874, o Peru tentou obter do Brasil e da Bolívia uma conferência tríplice para resolver as suas questões de limites. Finalmente, em 1903, quando se efetuavam as negociações de que resultou o Tratado de Petrópolis, renovou a mesma tentativa que não logrou o assentimento do Governo brasileiro, como já havia acontecido no tempo do Império com as três outras. O barão do Rio Branco tendo em vista a experiência do próprio Peru, em outras circunstâncias, julgava que uma negociação tríplice acabaria por se romper sem resultado prático, com a agravação das relações entre os três países. O seu tirocínio no manejo dos negócios internacionais o conduziu a separar a questão bolívio-peruana da brasília peruana e a tratar primeiramente com a Bolívia, ressalvando os direitos do Peru, e em seguida com este país.[4] Ademais, acreditava que o Peru nada possuía ao oriente do Javari, e que era com a Bolívia que o Brasil se devia entender no tocante às regiões do Juruá e do Purus.[5]

Arbitragem argentina sobre a pendência bolívio-peruana[editar | editar código-fonte]

Como não estava pacificada a posse dos territórios da região do Acre, Peru e Bolívia decidiram levar a questão à arbitragem. E o Brasil, por sua vez, aguardou o resultado antes de celebrar um tratado definitivo com o Peru.[4]

De acordo com o compromisso bolívio-peruano, o árbitro devia atribuir à Bolívia todo o território que em 1810 pertencia à Audiência de Charcas, dentro dos limites do Vice-Reinado de Buenos Aires, por atos do antigo soberano espanhol, e ao Peru todo o território que nessa mesma data e por atos de igual procedência, pertencia ao Vice-Reinado de Lima.[4]

Segundo a sentença arbitral, baseada em tais atos, o Vice-Reinado de Lima nada possuía a leste de 69°30' de longitude ocidental de Greenwich, do rio Tauamano para o norte, e portanto naquela direção o Peru nada podia pretender. Assim mais da metade do território que esta República reclamava ao Brasil ficou fora da questão, isto é, ficou incontestàvelmente brasileira toda a área limitada ao norte pela linha Javari- Madeira, do Tratado de 1777; ao oeste pelo meridiano de 69°, a leste pelo rio ,Madeira; ao sul pelas fronteiras estabelecidas entre o Brasil e a Bolívia no Tratado de Petrópolis.[4]

As Negociações[editar | editar código-fonte]

O mapa mostra como ficou a região alvo do Tratado do Rio de Janeiro.

Assinado o Tratado de Petrópolis, tornou-se oportuna a abertura das negociações com o Peru, de acordo com a declaração contida no seu artigo VIII. Elas foram iniciadas em 8 de maio de 1904 e conduziram desde logo a dois ajustes assinados em 12 de julho do mesmo ano. O primeiro, provisório, tinha por fim prevenir novos conflitos entre brasileiros e peruanos, como já havia acontecido no Alto Purus e no Alto Juruá, e dar tempo aos dois Governos para concluírem com calma e amigavelmente um tratado definitivo que resolvesse a sua questão de limites. O segundo criava no Rio de Janeiro um Tribunal Arbitral para julgar as reclamações de brasileiros e peruanos por prejuízos ou violências que tivessem ou pretendessem ter sofrido naquelas regiões.[4]

O artigo III neutralizava os territórios em litígio nas bacias do Alto Juruá e do Alto Purus. O artigo IV estabelecia duas Comissões Mistas para o policiamento dos territórios neutralizados e o artigo IX criava duas outras Comissões Mistas, incumbidas de fazer um reconhecimento rápido dos rios Purus e Juruá, na zona neutralizada.[4]

Os comissários de ambos os países puderam verificar que, no Juruá, ao norte do rio Breu, e no Purus, ao norte do Santa-Rosa, quase toda a população era brasileira e possuidora da maior parte dos estabelecimentos. Somente ao sul desses limites é que foram encontrados peruanos em agrupamentos de palhoças chamados caserios.[4]

Com a terminação destes trabalhos ficaram os dois Governos habilitados a entrar em negociações, pois que ficou suficientemente conhecida a região litigiosa. Mas o Governo brasileiro julgou conveniente aguardar que o presidente da República Argentina, árbitro eleito pelo Peru e pela Bolívia, desse o seu laudo sobre a questão de fronteiras que lhe fora submetida pelos dois países .[4]

Lavrada a sobredita sentença arbitral, em 9 de julho de 1908, puderam prosseguir as negociações entre o Brasil e o Peru, o primeiro representado pelo barão do Rio Branco e o segundo pelo seu plenipotenciário Hernan Velarde; e delas resultou o Tratado assinado no Rio de Janeiro em 8 de setembro de 1908, no qual os dois Governos tomaram por base o uti possidetis atual, conforme as verificações feitas pelos comissários técnicos em 1906.[4]

Todos os territórios de que o Brasil estava efetivamente de posse, povoados quase que exclusivamente por brasileiros, ficaram pertencendo ao Brasil; e ao Peru ficaram pertencendo, com um pequeno acréscimo entre o paralelo do Catai e o rio Santa-Rosa, os territórios do Alto Purus e do Alto Juruá que tinham sido neutralizados em 1904, e onde só havia peruanos.[4]

A área litigiosa era de 442 000 quilômetros quadrados, segundo o barão do Rio Branco; destes ficaram pertencendo ao Brasil 403 000 quilômetros quadrados e ao Peru a parte restante.[4]

Referências

  1. JORNALEGO
  2. Cunha, Euclides da. PERU VERSUS BOLÍVIA. [S.l.]: MINISTÉRIO DA CULTURA Fundação Biblioteca Nacional Departamento Nacional do Livro. ISBN 9798673809976  line feed character character in |editora= at position 22 (ajuda)
  3. a b c d e f g O Tratado de Limites Brasil-Peru (PDF). Brasília: Senado Federal. 2009 
  4. a b c d e f g h i j k Pereira, Renato Barbosa Rodrigues (1945). «O BARÃO DO RIO BRANCO E O TRAÇADO DAS FRONTEIRAS DO BRASIL». Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA (Ano VII n°2): 43  line feed character character in |periódico= at position 19 (ajuda); line feed character character in |título= at position 22 (ajuda);
  5. Rio Branco, Barão do (2012). obras do barão do rio branco v questões de limites exposições de motivos (PDF). Brasília: Ministério das Relações Exteriores Fundação Alexandre de Gusmão. p. 109  line feed character character in |editora= at position 35 (ajuda); line feed character character in |título= at position 29 (ajuda)