Usuário:DAR7/Testes/História do Brasil/Invasões francesas do Brasil

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As invasões francesas ao Brasil se registram desde os primeiros tempos da colonização portuguesa, chegando até ao ocaso do século XIX. Em algum momento, em contato com um diplomata de Espanha, a frase que seria encarregada de imortalizar, foi proferida pelo monarca francês, Francisco I: “Gostaria de ver a cláusula do testamento de Adão que me afastou da partilha do mundo…”. O rei de França fazia referência de maneira evidente ao Tratado de Tordesilhas — o acordo geográfico que tinha sido assinado pelos reinos de Portugal e Castela no ano de 1494, ao dividir o mundo entre os dois países, com a benção do papa.[1]

Segundo esses contratos, ambos os reinos ibéricos garantiam não só a soberania que estaria sobre as “terras que tinham descoberto ou por descobrimento” assim no Ocidente como no Oriente: conseguiam, também, e, sobretudo, que a navegação fosse exclusiva nas águas salgadas do oceano Atlântico. Costumava ser justamente contrário à doutrina do “mare clausum” (mar fechado) que Francisco I de França levantava sua voz, porque a tese do “mare liberum” (oceano livre à navegação para todos os países) era defendida pelos franceses — que os ingleses e os holandeses imitaram depois. De qualquer modo, controvérsias jurídicas foram logo atropeladas pela Corte de França, que se dispôs a tornar letra-morta as rendições de Tordesilhas. Também por causa de muitas circunstâncias da geografia, da economia, da náutica e até da política —, a mais importante finalidade das invasões de corsários e piratas de França teria se tornado a desprotegida costa brasileira. Dessa forma, nas cinco décadas seguintes à época em que Cabral desembarcou, contrabandistas de pau-brasil — que, geralmente, vieram da Normandia e da Bretanha — desempenhariam um papel-chave no passado da ocupação e da colonização do Brasil. Isso simplesmente uma vez que quase tudo o que foi feito na colônia pelos lusos não foi bem mais que uma pura reação à perseguição progressivamente ousada dos “entrelopos” (como eram denominados os traficantes de “pau-de-tinta”). Em, no mínimo, duas épocas — nos anos de 1530 e 1548 — o Brasil colonial tinha estado prestes a ter se tornado, ainda que de maneira momentânea, um território de França. Bem menos pesquisada que ambas as incursões “oficiais” — os acontecimentos chamados de “França Antártica” e “França Equinocial” —, a época relativamente nebulosa que vai entre 1504 e 1548 era, realmente, um período de atividade febril no decorrer do litoral do Brasil, que bretões e normandos percorreram. Estes franceses tinham mais frequência que os mesmos portugueses e mesma desenvoltura que os lusos.[1]

As relações dos marinheiros de França com a costa da América do Sul começaram a se tornar estreitas quatro janeiros depois que o Brasil foi descoberto oficialmente. No final de 1503, um navio com a finalidade de chegar à Índia foi armado pelo navegador e comerciante Paulmier de Gonneville. Já que os pilotos de Portugal, que foram contratados de maneira secreta por ele em Lisboa, foram perdidos em alto-mar, aportou a expedição na costa do hoje estado de Santa Catarina — de modo provável na ilha atualmente denominada de São Francisco do Sul. Naquele lugar, desde janeiro de 1504, Paulmier e seus homens entraram em contato com os carijós no decorrer de seis meses. Partindo de seu retorno a França, conduziram com eles o jovem “príncipe” denominado de Essomericq (duvidosamente Içá-Mirim), cujo pai foi o “cacique” Arosca. Essomericq deveria ser trazido novamente ao Brasil no período de “vinte dias” por Paulmier — apenas se o guerreiro indígena aprendesse a “construir canhões” com os homens de França. Uma vez que tinha naufragado na costa normanda, Binot Paulmier de Gonneville nunca voltou para as Américas. Essomericq era casado com a filha de quem o “raptou” e morou por cerca de meio século em França. Morreu sem que revesse o lugar onde nasceu, em 1583 — provavelmente com 94 anos.[1]

Apesar do resultado da viagem de Gonneville em sua própria bancarrota, estimulantes e novos horizontes foram abertos por ela aos navegadores da Bretanha e da Normandia. Na época em que se tomou conhecimento de que o território que fora visitado por ele era cheio de pau-brasil, uma equação explosiva foi articulada nos portos de Dieppe, Saint-Malo e Rouen, ao misturar longeva tradição de biopirataria e demanda crescente por corantes naturais. Essa demanda foi provocada pelas fábricas de roupas em França — cujo centro se localizava precisamente nessas cidades portuárias. Desde então, uma constante movimentação de expedições “ilícitas” para o Brasil começou a ser enviada por comerciantes e armadores de França, que dispunham da omissão dissimulada ou do apoio formal de seu monarca, Francisco I. Os traficantes de “pau-brasil” não chegavam com disposição de se instalarem de forma permanente na nova terra a ser explorada, nem com planos de povoá-la. Por causa disso, uma aliança com povos indígenas, pelos quais o litoral brasileiro era ocupado — especialmente com os caetés, os potiguares e os tamoios, podia ser estabelecida pelos “entrelopos”. Diversas zonas da costa do Brasil — mormente o Ceará, o Rio Grande do Norte, a Paraíba, porções de Pernambuco e, depois, o Rio de Janeiro — se tornaram áreas controladas quase absolutamente pelos franceses, onde os navios lusos podiam se aventurar raramente. No ano de 1530, uma das mais importantes razões que tinham levado o monarca D. João III de Portugal a mandar a expedição liderada por Martim Afonso de Sousa era justamente reprimir os contrabandistas de pau-brasil de França. Os traficantes franceses tomavam e se instalavam numa feitoria portuguesa situada na ilha de Itamaracá, em Pernambuco. Em 1548, novamente o perigo francês (estendido na época ao Rio de Janeiro, ao ameaçar a própria sobrevivência da então capitania de São Vicente) estimulou que D. João estabelecesse um Governo-Geral no Brasil, ao tornar a colonização da América Portuguesa finalmente responsabilidade oficial do Reino de Portugal. Mesmo assim, o novo regime somente teria se solidificado após a autorrevelação da capacidade do terceiro governador-geral, o desembargador Mem de Sá, para escorraçar os franceses os quais, no ano de 1555, se instalavam no Rio de Janeiro.[1]

A França Antártica e o almirante Coligny[editar | editar código-fonte]

Em meados do século XVI, após cinquenta anos a percorrer pela costa do Brasil, os franceses tinham concluído que chegou a hora de munir de armas uma expedição colonizadora para que fossem lançadas as bases de um vindouro império de ultramar. Em cinco décadas, normandos e bretões reconheciam e cartografavam a maioria da costa brasileira e estabeleciam com os indígenas uma relação que rendesse mais e, duvidosamente, que tivesse mais equilíbrio do que os portugueses — porque a escravidão dos índios jamais tivera estado dentre suas finalidades mais importantes. Para se alçarem numa peripécia colonialista, lhes faltava somente o homem certo. Quem poderia imaginar que Nicolas Durand de Villegaignon não deixava de ser o homem errado?[2]

Cavaleiro da Ordem de Malta, formado em universidade e guerreiro por temperamento, recruta, navegante, diplomata, historiógrafo, estudioso e até filólogo — considerado como homem togado e armado de espada” —, Villegaignon possuíra, até aquela época, uma carreira inteligente. Nasceu em 1510, tivera sido colega de Calvino, formado com diploma em Ciências Jurídicas, participado da tomada de Argel, no continente africano, ao combater do lado de Carlos V e, sobretudo, ludibriava de maneira brilhante os ingleses conduzindo, por via marítima, a rainha Maria da Escócia para a França. Foi para isso que ela tinha se casado com o herdeiro da coroa francesa, Francisco II, cujo pai foi o monarca Henrique II. Indicado vice-almirante da Bretanha, Villegaignon se desentendeu com o governador local no começo de 1555 e, triste com o apoio que o rei deu a seu desafeto, provou mais uma vez sua importância, ao fundar uma colônia de França no Rio de Janeiro.[2]

Para que seu projeto fosse concretizado, procurou ser apoiado por pessoas famosas como o Cardeal de Lorena, a autoridade católica que mais influenciava em França, e o almirante Gaspard de Coligny, chefe dos huguenotes — calvinistas de França, que já naquela época passavam a serem perseguidos. Tinha prometido para dois toda a liberdade de religião na nova colônia e com esse compromisso, tinha conseguido a liberação de cerca de dez mil francos e a armação de um navio de carga à expedição e dois de guerra pelo rei. Como soldados e tripulantes tinham sido contratados mais de seiscentos homens, mas sem mulher alguma — o que se tornaria uma das maiores questões a Villegaignon, que tentava a concretização de seu plano para ocupar e colonizar o Rio de Janeiro.[2]

A partir do começo tudo tinha saído errado. Tenebrosa tempestade logo colheu a expedição, que saíra de Havre no dia 12 de julho de 1555, e a forçou que ancorasse em Dieppe, em que quase quaisquer dos tripulantes abandonaram, assustados com o “aviso dos céus”. Para Villegaignon sobraram somente certas dezenas de pessoas degredadas, enquanto os demais oitenta homens que conseguiram ser por ele arregimentados pelas ruas de Dieppe, tinham sido recrutados dentre “desclassificados, mercenários e vagabundos”. Enfim, em 10 de novembro, depois de uma travessia cheia de contratempos, as embarcações de França, com mais de 130 homens a bordo, penetraram nas águas salgadas da baía da Guanabara. O acampamento de Villegaignon foi instalado em uma ilhota com um diâmetro de 1,5 quilômetro, denominada Serigipe pelos índios. Situada perto do continente, na frente do hoje aeroporto Santos Dumont, em pleno centro do Rio de Janeiro, a ilha atualmente contém a Escola Naval.[2]

Naquele local, Villegaignon ordenou a construção de um baluarte feito de madeira, que denominou de forte Coligny, nome que homenageia a pessoa mais importante que patrocinou o projeto de ocupação da cidade do Rio de Janeiro. Depois, iniciou o projeto da edificação do vilarejo de Henriville, que ele queria construir no continente, nos arredores do que é hoje o morro da Glória, quase em frente à ilha. No entanto, as dificuldades se reiniciaram depois. Os alimentos e as bebidas eram escassas, e isso forçou que os homens se alimentassem com raízes ao invés de pão, e a tomar água como substituta de vinho. Os trabalhos de construção e de aterro das paliçadas eram cansativos e os lucros, muito baixos. Um regime rigidamente disciplinar foi estabelecido por Villegaignon e a ausência de mulheres provocou o recrudescimento do mau humor e da violência dos “recrutas”, a maioria deles nada moralmente sensatos nem adequadamente instruídos para a guerra. A reação do comandante foi despótica e severa ao desentendimento que se instaurou na ilha — e com esse problema antecipou o dramático fim da infelicidade denominada de França Antártica.[2]

Gaspard Comte de Coligny, nasceu em 1519 e foi cavaleiro da Ordem do Rei, almirante de França e já era governador de Paris no momento em que pediu para o seu companheiro pessoal, o monarca Henrique II de França, que apoiasse o projeto de colonização de Villegaignon. Por se converter para a Igreja Calvinista e liderar os huguenotes — como ficavam conhecidos os protestantes de França —, fez um investimento de grande parte de sua riqueza na expedição que fundou a França Antártica. Foi morto em 24 de agosto de 1572, no denominado Massacre da Noite de São Bartolomeu, que a rainha Catarina de Médicis, mulher de Henrique II, planejou.[2]

A derrocada da França nos trópicos[editar | editar código-fonte]

Embora os abusos de Villegaignon e conflitos religiosos gerassem os desentendimentos, as posições dos franceses conseguiram ser solidificadas no Rio de Janeiro. Realmente, no decorrer dos cinco primeiros anos de invasão, entre 1555 e 1560, reforços franceses foram recebidos pelos “dominadores”, cuja aliança foi estreitada com os tamoios (os mais antigos habitantes da baía da Guanabara à época). Segundo narrativa de Mem de Sá, terceiro governador-geral do Brasil, o forte Coligny foi transformado pelos “invasores” em “uma das mais sólidas fortificações cristãs, invencível às forças do homem”.[3]

Não obstante, a fortificação ser aparentemente sólida, graves problemas interiores minaram a colônia de França. Os conflitos se alastravam a partir de fevereiro de 1556, durante uma exigência feita por Villegaignon a um marinheiro francês (que já se instalou no Rio de Janeiro antes dos novos colonizadores chegarem) para ele ser casado ou separado de uma mulher indígena com quem morava há sete anos. Revoltado, este marinheiro tinha armado uma intriga para assassinar o chefe de França Antártica. No entanto, os temerosos guarda-costas de Villegaignon, naturais da Escócia, acabaram descobrindo o plano e cinco dos 26 conspiradores tinham sido executados e presos.[3]

Após este acontecimento, Villegaignon tinha se tornado aos poucos desconfiado e despótico, ao transformar a prática da fortificação em uma série de conspiradores, torturados, desertores e presos. Mesmo assim, no mês de março de 1557, um novo alento seria ganho pelo projeto colonial de França: foi durante a chegada de Bois Le-Comte, cujo tio foi Villegaignon, ao Rio de Janeiro com 290 homens e três embarcações. Entretanto, o que deveria ser uma ajuda extraordinária se revelou mais um ponto de tensão: já que o senhor de Le-Comte tivera trazido com ele 14 pastores calvinistas (eleitos pelo mesmo Calvino e dentre eles Jean de Lery), o conflito de protestantes com católicos tinha recrudescido na colônia. Isso transformou em algo que não se podia se sustentar a já complicada postura de Villegaignon. Enfim, no mês de outubro de 1558, o homem, que deu a si mesmo o título de “Rei do Brasil”, menosprezou seu tão sonhado projeto de estabelecimento de uma “nova França” na zona tropical e se retirou em direção à Europa.[3]

As tropas francesas ficaram desanimadas e desmoralizadas, e isso perdurou durante a entrada do governador-geral Mem de Sá, que se encarregou da missão de desalojar os dominadores, na baía de Guanabara, no dia 21 de fevereiro de 1560, diante de uma esquadra portuguesa. Quando amanhecia no dia 15 de março, após manter o sítio do forte da ilha de Serigipe por um período de três semanas, Mem de Sá pediu aos inimigos a se renderem, mas Bois-le-Comte tinha se recusado a ceder.[3]

Apesar de serem apoiados por mais de mil militares tamoios, os franceses que na época ficavam dentro do forte Coligny foram somente 74 — os outros desertaram para morar dentre os índios, ou retornavam à Europa. Naquele tempo, em 18 de março, mais de 120 lusitanos e seus 140 correligionários indígenas (em sua maioria temiminós e tupiniquins — antepassados inimigos dos tamoios), tinham deflagrado sua última ofensiva. Os franceses se renderam 48 horas depois, em 20 de março de 1560, após um marinheiro lusitano ter conseguido nadar em direção à ilha e explodido o paiol de munições, ao encerrar as lutas. Naquela época o mesmo Mem de Sá já estava pensando em ter desistido do combate. Derrotados os inimigos, tanto o jesuíta Manoel de Nóbrega como o governador-geral e demais historiógrafos dessa batalha decisiva tinham atribuído a glória ao “poder divino”, que “não desejou que nesta terra [o Brasil] fossem plantadas pessoas de tão indesejáveis ideias [os protestantes]”.[3]

O projeto de ultramar feito por Villegaigon ruía. No entanto, os sobreviventes franceses, que se aliaram aos tamoios, ainda resistiriam por um período de sete longos janeiros. Os portugueses apenas conquistariam o Rio de Janeiro no ano de 1567.[3]

A conquista do Rio pelos portugueses, o “cacique” Cobra Feroz e a vez dos corsários[editar | editar código-fonte]

Retornando para a Bahia no final de março de 1560, após ter arrasado por completo, Mem de Sá, o então governador-geral do Brasil, não tinha podido ter estabelecido base portuguesa alguma em plena baía de Guanabara: lhe estavam faltando equipamentos e tropas. Apesar de se poder ter acusado o governador de omitir ou desleixar, a verdade é que tal descautela teria tido indesejáveis efeitos aos portugueses.[4]

Finalmente, cinco janeiros depois, Estácio de Sá, cujo tio foi Mem de Sá, de quem foi seu braço direito, voltou para o Rio de Janeiro, no dia 9 de fevereiro de 1565, e comandava nove embarcações e 220 homens. Naquela época, foram por ele encontrados os franceses sobreviventes e seus aliados tamoios escondidos atrás de três paliçadas resistentes — e estavam prontos a um novo conflito. Em 1.º de março, Estácio se fixou num arraial em plena encosta do Pão de Açúcar (núcleo inicial da sede do atual município do Rio de Janeiro) e naquele lugar permaneceu por um período de dois janeiros, ao combater raramente o inimigo à medida que esperava a vinda de reforços.[4]

Durante o ano inteiro de 1566, continuamente ajudados pelos franceses dissidentes, os tamoios tinham dado bastante trabalho para os portugueses, ao organizar numerosas ciladas, ao travar uma guerra cheia de guerrilhas e ao tentar trazê-los de maneira constante a lutas em pleno mar. No mês de julho desse ano, foi travada a famosa batalha que tinha passado para a história com a denominação de “combate das canoas”. Os portugueses foram atraídos a uma emboscada numa das muitas reentrâncias localizadas na baía de Guanabara, pelos tamoios, que possuíam um contingente de mais de 180 enormes canoas, onde tinham se amontoado duvidosamente cerca de 2 mil militares. Quando os portugueses aparentavam estarem certamente derrotados, um depósito de pólvora situado dentro duma canoa, foi atingido por um tiro disparado por uma reduzida peça de artilharia, que causou enorme incêndio e assustou profundamente os índios. Cercados pela fumaça, certos portugueses tinham julgado que viram a imagem de São Sebastião, que combatia do lado dos lusitanos contra “os pagãos e os hereges”.[4]

Em 18 de janeiro de 1567, Mem de Sá finalmente voltou para o Rio, com novas milícias, cerca de 200 homens, que se distribuíram em três galeões e seis caravelas. Dois dias depois — 20 de janeiro, dia de São Sebastião — as posições rivais em Uruçumirim (hoje Morro da Glória), foram atacadas pelos portugueses, apoiados pelos índios temiminós, liderados por Araribóia. Depois de uma batalha, cujo tempo de duração foi durante o dia inteiro, 600 tamoios e cinco franceses foram mortos, e vários tinham sido feitos prisioneiros. Um dia depois, dez franceses foram enforcados, ao passo que a paliçada da ilha de Paranapuã (atualmente do Governador) era atacada pelos portugueses, os quais escravizavam os mais de mil tamoios, que capitularam sem condições. Apesar do terror do combate, somente um português foi morto naquela luta.[4]

A glória, no entanto, não pôde ter sido celebrada com muito barulho: machucado por uma seta envenenada, em pleno combate de Uruçumirim, Estácio de Sá teria morrido um mês mais tarde, depois de estar agonizado por muito tempo.[4]

De qualquer maneira, o Rio de Janeiro enfim era de Portugal. Apesar de serem decisivos e violentos, as lutas resultantes no fracasso de França Antártica e na ocupação portuguesa do Rio tinham mobilizado menos de meio milhão de europeus: as tropas, em sua maioria, que tinham se defrontado à sombra dos morros do Pão de Açúcar, era formado por indígenas. Os europeus, que foram mortos naqueles combates, eram menos de trinta, enquanto, dentre os índios, morreram mais de mil soldados.[4]

O apoio, que Araribóia (do tupi, “Cobra Feroz”) deu, tinha sido decisivo aos portugueses no combate para repelir os franceses do Rio de Janeiro. Ex-chefe da ilha de Paranapuã (hoje do Governador), o líder dos temiminós costumava ser inimigo antepassado dos tamoios — que mandavam no resto da baía de Guanabara. No ano de 1555, os temiminós, que eram banidos de sua ilha pelos tamoios, se mudaram ao Espírito Santo, para morar em suas terras que seus aliados lusos ocuparam. Muito leal aos portugueses, tinha se tornado Araribóia, que se batizou com a denominação de Martim Afonso de Souza. Depois de vencer os tamoios e os franceses, Araribóia ganhou o título de cavaleiro da Ordem de Cristo e recebeu uma grande sesmaria no Morro de São Lourenço, que originou o município de Niterói. No entanto, em 1574, o governador Antônio Salema repreendeu Araribóia, porque o índio cruzava as pernas quando o repreensor estava presente. Por isso, Araribóia ficou ofendido, se refugiou em Niterói e dali jamais partiu até morrer, em 1589, devido a uma grande epidemia de varíola, que assolou a aldeia de São Lourenço.[4]

O Rio de Janeiro aparentava ter sido uma obsessão de França. Quase cem janeiros após o fracasso de França Antártica (mais de um século depois de uma tentativa infrutífera de colonização do Maranhão), um novo ataque contrário ao Brasil foi protagonizado por Duclerc — também no mesmo lugar de onde os patrícios dele eram expulsos no ano de 1566. Sendo apoiado pelo monarca Luís XIV de França, Duclerc veio para Rio de Janeiro com cinco embarcações e mil homens, em 6 de agosto de 1710. Após diversos desentendimentos com os portugueses, aportou na periferia de Guaratiba, balneário perto da Barra da Tijuca e, ao entrar pela área rural, tinha atacado a cidade através da retaguarda em plena madrugada de 11. Entretanto, ajudado por estudantes e voluntários, o governador Castro Morais tinha resistido. Cerca de trezentos franceses morreram e os outros, foram aprisionados, incluindo Duclerc e 41 oficiais dele. Dois homens disfarçados, provavelmente familiares do francês e a pedido do governador Castro Morais, assassinaram Duclerc, preso em uma das mais bem-sucedidas residências da urbe, em março de 1711.[4]

A França Equinocial e a vingança de Duguay-Trouin[editar | editar código-fonte]

Apesar de ser um acontecimento menos divulgado, menos pesquisado e, muito menos famoso que o de França Antártica, outra invasão francesa para o Brasil causou risos bem maiores ao domínio lusitano na América Portuguesa, ao ameaçar de maneira grave a unidade territorial da colônia por cerca de dez anos. Foi a peripécia colonizadora da denominada “França Equinocial” — como era chamada a invasão francesa no Maranhão, da qual o resultado foi que a cidade de São Luís tinha sido fundada no ano de 1612 (ainda atualmente, a capital desse estado brasileiro).[5]

Ao invés de França Antártica — enclave fundado num território que os portugueses já colonizavam de maneira razoável e conheciam bastante —, a ação de França no Brasil setentrional aconteceu numa parte da costa que não só os lusos nunca ocupavam antes como também desconheciam praticamente. Os franceses, em contrapartida, já costumavam navegar faz mais de três décadas, através das águas inseguras do Maranhão, estabelecendo não somente forte aliança entre eles e as tribos da região como descobrindo também o mais bem-sucedido caminho dentre correntes oceânicas muito perigosas.[5]

Jacques Riffault, o pirata, contrabandista de pau-brasil e aventureiro foi o pioneiro daqueles ataques, que a partir de 1590 tinha ancorado sua nau em plena foz no rio Potengi, na periferia da que é hoje a cidade de Natal (RN). Desde esse ponto, expandia seu domínio pelo litoral inteiro em direção ao Maranhão. No ano de 1593, ao retornar para França após inspecionar a então chamada ilha do Maranhão, Riffault tinha conseguido persuadir um endinheirado cavalheiro de França, Charles Des Vaux, para que eles investissem seu dinheiro em uma expedição colonizadora. No dia 15 de março de 1594, Riffault e Des Vaux saíram em direção ao Maranhão, com mais de 150 colonizadores e recrutas a bordo de três embarcações. Muitos outros problemas e um naufrágio fracassaram a empresa.[5]

No ano de 1604, no entanto, Charles Des Vaux voltou para França para dar uma informação às autoridades de que os tupinambás maranhenses desejavam fazer a sua conversão para a Igreja Católica e se aliarem contra os portugueses. Dessa forma, após lentas preparações e diversas viagens de inspecionamento, no mês de março de 1612, finalmente, saíram de França em direção para o Maranhão três embarcações e 500 homens, liderados por Daniel de la Touche de la Ravardière. No dia 12 de agosto, celebrou-se a mais antiga missa e em 8 de setembro começou a ser construído o forte que originaria a cidade de São Luís, dessa forma nomeada em honra ao rei-menino Luís XIII.[5]

Durante a propagação da novidade da invasão, foi determinado pelo monarca Felipe II de Espanha — o qual mantinha a união de Espanha e Portugal sob a Coroa de Castela — que as tropas de Ravardière fossem atacadas. No mês de novembro de 1614, os franceses, que se renderam, foram vencidos pelo exército da América Portuguesa, liderado pelo mameluco Jerônimo de Albuquerque. Entretanto, uma rendição incondicional foi exigida por Felipe II de Espanha, e, em novembro de 1615, São Luís foi entregue pelo colono francês Daniel de la Touche, que saiu a Lisboa para ser preso e sem poder ser indenizado. Por três janeiros, ele continuaria aprisionado na Torre de Belém, final infeliz de mais uma desventurada tentativa gaulesa de estabelecimento de uma colônia em pleno Brasil.[5]

Seis meses depois que Duclerc morreu misteriosamente, e com um provável plano de vingança, o Rio de Janeiro foi atacado por outro pirata de França. Era René Duguay-Trouin o qual, em 20 de setembro de 1711, diante duma esquadra com 18 embarcações, 740 peças de artilharia, 5 764 homens e 10 morteiros, não achava difícil invadir a cidade, esvaziada pelo governador Castro Morais. Para que o Rio de Janeiro não fosse destruído, cem caixas de açúcar, 600 mil cruzados e duzentos bois foram exigidos por Trouin. O governador fez o pagamento do resgate — no entanto, tinha perdido o cargo e recebeu uma alcunha ofensiva: “Vaca”. Trouin, no entanto, tinha desfrutado pouca coisa do endinheirado butim: em plena viagem de volta, uma tormenta atingiu sua esquadra e ambos dos mais bem-sucedidos navios naufragaram, com mil e duzentos homens e bastante riqueza a bordo. Mesmo assim, a expedição dava muito lucro e o monarca Luís XIV de França promoveu Duguay-Trouin a chefe de esquadra.[5]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Notas

Referências

  1. a b c d Bueno 2003, pp. 72–73.
  2. a b c d e f Bueno 2003, pp. 75–76.
  3. a b c d e f Bueno 2003, pp. 77–78.
  4. a b c d e f g h Bueno 2003, pp. 79–80.
  5. a b c d e f Bueno 2003, pp. 80–81.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Bueno, Eduardo (1997). História do Brasil: os 500 anos do país em uma obra completa, ilustrada e atualizada. São Paulo: Folha de São Paulo 
  • Bueno, Eduardo (2003). Brasil, uma história: a incrível saga de um país. 2ª ed. São Paulo: Ática 
  • Bueno, Eduardo (2012). Brasil, uma história: cinco séculos de um país em construção. Rio de Janeiro: Leya 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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