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Desenho de modelo vivo

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Desenho de modelo vivo é o exercício do desenho da figura humana (corpo humano) na presença de um modelo nas suas várias formas e posições. Com raízes conhecidas remontando à civilização da Grécia Antiga, a prática da representação do corpo humano através da observação direta de um modelo humano permanece como uma das componentes básicas da formação artística contemporânea.[1]

Leonardo da Vinci, Estudo da cabeça e ombros de um homem, tinta e caneta sobre papel, 28,7 x 19,6 cm

Ao longo de séculos o desenho do corpo humano a partir da observação do real tem sido uma prática comum, enquanto atividade autónoma ou como etapa essencial à gestação de outras obras (pinturas e esculturas). Embora haja indícios anteriores, os vestígios seguros dessa prática datam da Grécia Antiga, prolongando-se pela civilização romana. Interrompida na época medieval, a observação e registo do real seriam retomados no renascimento; Leonardo da Vinci (1452 – 1519), Albrecht Durer (1471 – 1528) e Miguel Ângelo (1475 – 1564) são marcos incontornáveis desse período. Artistas como Jacopo Pontormo (1494 – 1557), Poussin (1594 – 1665), Rembrandt (1606 – 1669), Watteau (1684 – 1721), Jacques-Louis David (1748 – 1825), Ingres (1780 – 1867), Edgar Degas (1834 – 1917), Rodin (1840 – 1917) ou Renoir (1841 – 1919) atestam a importância desta prática em épocas posteriores. Já no século XX o desenho de modelo irá sobreviver de múltiplas maneiras, refletindo a profunda renovação dos modos de pensar e fazer arte; Matisse (1869 – 1954) e Picasso (1881 – 1973) contam-se entre os que impulsionaram a representação do corpo em novas direções.[1][2]

Pedro Weingärtner, Estudo de nu, 1878

Base de trabalho a partir do início do Renascimento, abordado de forma continuada na Academia de São Lucas, Roma (desde 1593), no ensino de Rembrandt ou em todo o sistema académico francês (desde 1648), o desenho de modelo foi um dos pilares do ensino das artes durante séculos. Ao longo do século XIX e mesmo depois, a prática académica do desenho de modelo (veja-se, por exemplo, Estudo de nu, de Pedro Weingärtner) iria cristalizar, ficando progressivamente desfasada das intenções da arte mais avançada. Veríamos um número significativo de artistas praticá-lo de forma mais liberta e consonante com os novos modos de pensar.[3]

Embora as formas de ensinar se tenham alterado significativamente no decurso do século XX e muitas instituições o tenham abandonado enquanto componente curricular obrigatória, a prática do desenho de modelo sobrevive um pouco por todo o lado como atividade optativa e continua a integrar os sistemas pedagógicos de diversas instituições prestigiadas de ensino artístico.[1][4]

Na Academia Imperial de Belas Artes, por exemplo, existiu a disciplina de "Desenho de modelo vivo" até ao ano de 1915;[5] na Slade School, Londres, essa prática permaneceu central ao longo de grande parte do século XX;[6] as academias livres parisienses como a Grande Chaumière ou a Colarossi ficaram famosas pelas suas sessões de modelo abertas a todos; na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa tal como noutras instituições de ensino artístico do presente, o desenho de modelo continua a ser uma componente dos programas das cadeiras de desenho.[4] A Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto, organizou em 1965 a exposição "Dois Séculos de Modelo Vivo, 1765-1965" em que foram expostos os desenhos de 52 artistas representativos de quatro gerações.[7]

Muitos livros sobre o ensino do desenho referem-se longamente ao desenho de modelo, dedicando-lhe por vezes capítulos específicos.[8][2] Outros centram-se prioritariamente nesse território, como acontece com The Natural Way to Draw[9] de Kimon Nicolaïdes, editado pela primeira vez em 1941 e que a partir dessa data se tornou numa referência incontornável a nível do ensino do desenho.

Michiel Sweerts, A aula de desenho, c. 1657

O desenho de modelo pode ser realizado de uma forma rápida, simples e sintética, ou lenta, laboriosa, detalhada; e pode socorrer-se de toda a gama de elementos do desenho, da linha de contorno mais singela às gradações de claro-escuro capazes de acentuar a sugestão de massas e volumes. No que respeita à técnica, têm sido utilizados os mais diversos materiais e instrumentos do desenho (lápis, carvão, tinta-da-china aplicada com caneta ou pincel, aguarela, etc., quase sempre sobre papel). E quanto às opções de ordem formal, encontramos ao longo dos tempos representações de grande fidelidade ao real a par de outras, mais libertas e expressivas, que viriam a radicalizar-se com as ruturas que pontuaram a arte do século XX.[2][10]

Para distinguir aqueles que se destacam em desenho de modelo vivo, diversas instituições criaram diversos prémios como o Prémio José da Costa Meireles Rodrigues Júnior (atribuído pela ESBAP),[11] "John Lincoln Life-Drawing Award" (atribuído pela California State University Long Beach),[12] "Most Outstanding Life Drawing Award" e "High Commendation Life Drawing Award" ( atribuídos pela Art Gallery of South Australia),[13] "Jen Beattie Memorial Award" (atribuído pela Robert Gordon University),[14] etc.

Ligações externas

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Referências

  1. a b c «Life Drawing: A Short History». Consultado em 28 de dezembro de 2013 
  2. a b c Goldstein, Nathan – Figure Drawing: the stucture anatomy, and expressive design of human form. New Jersey: Prentice Hall Inc., 1976.
  3. Goldstein, Carl – Teaching Art: Academies and Schools from Vasari to Albers. Cambridge; New York: Cambridge University Press, 1996, p. 30, 37, 40, 41, 159-185, 274. ISBN 0-521-55988-X
  4. a b Arruda, Luísa d’ Orey Capucho. «DESENHO IV - PINTURA E ESCULTURA» (PDF). Consultado em 29 de dezembro de 2013. Arquivado do original (PDF) em 30 de dezembro de 2013 
  5. «O Ensino de Pintura e Escultura na Academia Imperial das Belas Artes». Dezanove Vinte. Consultado em 24 de Dezembro de 2013 
  6. «Slade School Drawings Collection». UCL Art Museum. Consultado em 29 de dezembro de 2013 
  7. «Dois Séculos de Modelo Vivo, 1765-1965». Universidade do Porto. Consultado em 28 de Dezembro de 2013 
  8. Simmons, Seymour; Winer, Marc – Drawing: The Creative Process (1977). New York: Prentice Hall Press, 1986.
  9. Nicolaïdes, Kimon – The Natural Way to Draw (1941). London: André Deutsch, 1979.
  10. Eisler, Georg – From Naked to Nude: Life Drawing in the Twentieth Century. London: Thames and Hudson, 1977
  11. «Duarte Gustavo Roboredo e Castro (Tito Roboredo)». Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto. Consultado em 28 de Dezembro de 2013 
  12. «Brian Borlaug» (em inglês). The McKnight Foundation and Walker Art Center. Consultado em 28 de Dezembro de 2013 [ligação inativa]
  13. «Student Drawing Exhibition 2013». Art Gallery of South Australia. 2013. pp. inglês. Consultado em 28 de Dezembro de 2013 
  14. «Student life-drawing award remembers artist and friend» (em inglês). Robert Gordon University. Consultado em 28 de Dezembro de 2013