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João Maurício Adeodato

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João Maurício Adeodato
Nascimento 12 de março de 1956
Belo Horizonte, Minas Gerais
Nacionalidade brasileiro
Alma mater Universidade Federal de Pernambuco

Universidade de São Paulo

Ocupação Jurista e filósofo do direito
Ideias notáveis Retórica, Teoria retórica do Direito

João Maurício Leitão Adeodato (Belo Horizonte, 12 de março de 1956Belo Horizonte) é um jurista e filósofo do direito brasileiro. Foi um dos principais responsáveis pela consolidação da pós-graduação stricto sensu em Direito no Brasil, tendo atuado em diversas universidades brasileiras e destacando-se pela atuação no CNPq e na Comissão Nacional de Educação Jurídica da OAB. Em sua atuação como filósofo, realizou a primeira análise crítica da obra de Hannah Arendt no Brasil nos anos 1980 e também se tornou pioneiro na adoção de uma teoria retórica do direito.[1]

Na história da filosofia do Direito, Adeodato é o único brasileiro a participar do Comitê Executivo do Congresso Mundial da Associação Internacional de Filosofia Jurídica e Social – IVR (na sigla em alemão). Em reconhecimento de sua trajetória internacional, recebeu a Comenda Domingos Martins, a mais alta honraria da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, em 2023[2].

Biografia acadêmica e profissional[editar | editar código-fonte]

Nascido em Belo Horizonte (Minas Gerais), transferiu-se ainda criança para Pernambuco. Concluiu seus estudos no Colégio de Aplicação (da Universidade Federal de Pernambuco), ingressando logo em seguida no curso de graduação da Faculdade de Direito do Recife (UFPE). Em 1978, inicia a trajetória como advogado em Pernambuco. No ano seguinte, em 1979, inicia o curso de mestrado em direito na USP, com uma pesquisa sobre "a filosofia do direito de Nicolai Hartmann" sob orientação de Miguel Reale.[3]

Em 1981, Adeodato inicia o curso de doutorado em direito na USP, com a orientação de Tércio Sampaio Ferraz Jr. Desta vez, passa a investigar e analisar criticamente o pensamento de Hannah Arendt. Foi a primeira monografia acadêmica crítica em relação a esse tema, pouco depois da publicação de um livro descritivo sobre Hannah Arendt por outro professor da USP, Celso Lafer, em 1979. Seu doutorado foi concluído em 1986, quando tinha cerca de 30 anos de idade.[4]

Antes de concluir seu doutorado na USP, Adeodato foi aprovado e nomeado para o cargo de Professor Assistente da Faculdade de Direito da UFPE. Depois de obter o doutorado em 1986, se tornou Professor Adjunto naquela Faculdade, alcançando a titularidade (cátedra, carreira máxima acadêmica) em 1990. Desde o final dos anos 1980, Adeodato lecionou Filosofia do Direito para os cursos de pós-graduação em direito da UFPE e também em outros programas brasileiros, consolidando a pós-graduação na área.[3]

A partir de 1984, tornou-se pesquisador do CNPq e criou primeiro e mais longínquo grupo de pesquisa da Faculdade de Direito da UFPE. É Pesquisador I-A do CNPq desde 1997. Desde 1988, realizou uma série de pós-doutorados nas universidades alemãs. Seus primeiros pós-doutorados foram na Universidade de Mainz, onde conheceu filósofos retóricos adeptos do pensamento de Theodor Viehweg. Também realizou seus estudos pós-doutorais na Universidade de Freiburg (1995), de Heidelberg (2000, 2003, 2009, 2011), de Hagen (2014-2015) e de Frankfurt (2018-2019).[3]

Foi também Diretor do Departamento Jurídico da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco no segundo Governo Miguel Arraes e Coordenador dos Cursos de Direito da Uninassau. Também atuou como coordenador científico dos cursos de Pós-Graduação da Escola da Magistratura de Pernambuco. Prestou consultoria acadêmica e jurídica na elaboração, credenciamento e melhoria de dezenas de cursos públicos e privados de graduação e pós-graduação em direito no país. E também atuou como parecerista e consultor jurídico[5].

Em 2011, tornou-se Livre-docente em Filosofia do Direito pela Universidade de São Paulo, após aprovação em concurso público, com a tese: "Uma teoria da norma jurídica e do direito subjetivo numa filosofia retórica da dogmática jurídica".

Após sua aposentadoria na UFPE, permaneceu em suas funções docentes e acadêmicas em outras instituições. É Professor Permanente da Faculdade de Direito de Vitória e da Universidade Nove de Julho. Professor Colaborador da Escola Paulista de Direito. Professor Colaborador do LL.M. Legal Theory da Universidade de Frankfurt.

Adeodato atuou como Professor convidado em diversas instituições estrangeiras: Universidades de Göttingen (1991, 2000, 2015 e 2019), Freiburg im Breisgau (1995), Frankfurt am Main (1995, 2011 e 2015), Duquesne Pittsburgh (1999), Coimbra (2000), Pablo de Ollavide de Sevilla (2000), Augsburg (2000), Kiel (2000, 2018, 2023 e 2024), Lecce (2004), Nacional del Comahue de Bariloche (2006 e 2013), Patras, Grécia (2006), de los Andes e Católica de Chile (2008), Bielefeld (2009), Frankfurt (1995, 2011, 2015 e 2019), Buenos Aires (2011), Lisboa (2012, 2014), Minho (2014), Salzburg (2012, 2014, 2015 e 2019) e no Instituto Tecnológico Autónomo de México (2012)[3].

Pensamento[editar | editar código-fonte]

Pensamento jurídico: retórica realista do direito[editar | editar código-fonte]

A retórica realista de Adeodato se opõe a teses dominantes na cultura ocidental contemporânea no que diz respeito à retórica e ao direito. Retoma as discussões dos sofistas, de Aristóteles e de outros pensadores posteriores como o filósofo cético helenista Sextus Empiricus, cujas obras sempre têm por títulos “contra” (adversus): “contra os filósofos ontológicos”, “contra os retóricos aristotélicos” e “contra os filósofos ontológicos e os retóricos aristotélicos”.[6]

Adeodato defende que a realidade é criada, constituída, conformada pelo relato vencedor, a retórica material. Isso não é o consenso, nem uma essência ontológica. É a linguagem humana, controlada intersubjetivamente na própria linguagem. Todo pensamento e toda percepção humanos se dão na e pela linguagem. Nada escapa da retórica. Isso não implica que a realidade seja subjetiva, pelo menos no sentido de dependente de cada indivíduo: controle público da linguagem. Por isso, Adeodato também combate os "decisionismos" e outras formas de imposição autoritária de decisões jurídicas.[6]

Essa visão da retórica inspira-se, também, em Friedrich Nietzsche, Theodor Viehweg, Ottmar Ballweg e Katharina Sobota. Apesar das influências, Adeodato desenvolve também argumentos originais.

Pensamento político: democracia radical[editar | editar código-fonte]

Em 2016, durante a polêmica do processo de impeachment contra a Presidente da República, Dilma Rousseff, Adeodato se posicionou em entrevista ao Diário de Pernambuco: juridicamente e também de um ponto de vista ético, o impeachment deveria ocorrer; porém, as consequências não seriam boas ao país (pragmatismo)[7].

Adeodato também se posicionou pela pulverização do poder e se declarou um "democrata racial". Nessa mesma entrevista, Adeodato se declarou parlamentarista e democrata de esquerda, criticando os políticos profissionais e os partidos existentes nos seguintes termos:

Não é possível transplantar uma experiência histórica. Eu sou a favor do parlamentarismo, de um Congresso forte, um Judiciário forte, um Ministério Público forte, justamente para fiscalizar esses desmandos que estão por aí. O que o Brasil precisa é ter paciência com a democracia. Eu me tremo todo quando vejo as pessoas pedindo a volta do autoritarismo. Querer isso é muita ignorância, falta de visão. Isso é um horror. Tem que ter democracia com o poder desconcentrado. Sou a favor do parlamentarismo, da Federação, dos estados fortes, de bairros fortes, ruas fortes, associação de rua, não de bairro. O Brasil é um caos porque os filtros democráticos no país estão completamente errados. Eu sei que o brasileiro não é um povo exatamente honesto. Eu tenho vergonha. Mas eu diria que os brasileiros canalhas são em torno de 30% enquanto os políticos canalhas são 95%. Então, está havendo algum problema nos filtros democráticos. Porque o político deve corresponder ao povo. O brasileiro, apesar de ser incompetente e canalha, não é tão incompetente e tão sem ética quanto seus políticos. Corrupção é um problema ético, mas a gente esquece que esses caras são uns analfabetos em termos de gestão. Por que o político fez a avenida e ela agora está cheia de buracos? Ele tem que pagar. Tem que entrar no dinheiro privado dele. Tirar a casa dele na praia para pagar aqueles buracos que ele fez ali. E eu não vejo ninguém do PSOL, do PSTU, do PT, dos partidos que se dizem de esquerda fazendo alguma coisa. Por isso que eu digo que sou radical de esquerda, de extremíssima esquerda[7].

Consultoria acadêmica e honrarias[editar | editar código-fonte]

Dentre as diversas atuações de consultoria nacional em órgãos públicos e honrarias[3]:

  • Consultor ad hoc da CAPES para reconhecimento de programas de pós-graduação (1990-1998), seleção de pesquisadores, bolsas no país e no exterior (desde 1990);
  • Representante da Área de Direito no Comitê de Ciências Sociais Aplicadas do CNPq (1992-1995 e 2000-2003);
  • Presidente do mesmo Comitê e membro do Conselho Diretor do CNPq (1994-1995);
  • Consultor ad hoc de dezenas de Fundações Estaduais de Pesquisa (desde 1990);
  • Avaliador do DAAD para a área de direito (2003-2004);
  • Membro da Comissão do Kyoto Prize da Inamori Foundation (2016);
  • Membro da Comissão de Educação Jurídica do Conselho Federal da OAB (1995-2000, 2005-2007, 2010-2015);
  • Coordenador da Comissão de Implementação das Disciplinas do Eixo Fundamental no Exame de Ordem (2011-2012);
  • Membro do Comitê Executivo da Associação Internacional de Filosofia Jurídica e Social (IVR) (2011-2015, 2016-2019);
  • Membro honorário do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito - CONPEDI (2009);
  • Títulos de Cidadão do Estado de Pernambuco e da Cidade de Olinda;
  • Título de Cidadão do Estado do Piauí;
  • Comenda "Domingos Martins", Assembleia Legislativa do Espírito Santo[2].

Obras[editar | editar código-fonte]

Com mais de uma centena de trabalhos no Brasil e no exterior (Alemanha, Argentina, China, Espanha, Estados Unidos, França, Holanda, Índia, Itália, Portugal e Turquia) em retórica e filosofia do direito, Adeodato é reconhecido como um dos principais filósofos brasileiros do direito. Dentre suas principais obras[3]:

  • Introdução ao Estudo do Direito: Retórica Realista, Argumentação e Erística. Rio de Janeiro: Forense, 2023.
  • Filosofia do direito: uma crítica à verdade na ética e na ciência. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
  • O problema da legitimidade: no rastro do pensamento de Hannah Arendt. 2. ed. Belo Horizonte: D'Plácido, 2016.
  • Uma teoria retórica da norma jurídica e do direito subjetivo. 2. ed. Sao Paulo: Noeses, 2014.
  • Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
  • A retórica constitucional: sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2009.

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. «A filosofia de Pernambuco falando para o mundo». www.diariodepernambuco.com.br. Consultado em 15 de junho de 2024 
  2. a b «Professor do PPGD receberá a Comenda Domingos Martins em solenidade na FDV – FDV – Faculdade de Direito de Vitória». Consultado em 15 de junho de 2024 
  3. a b c d e f «Currículo Lattes de João Maurício Adeodato». buscatextual.cnpq.br. Consultado em 15 de junho de 2024 
  4. «Desembargador do TRT-MA condecora professor Joao Maurício Adeodato | Portal do TRT 16ª Região - Maranhão». www.trt16.jus.br. Consultado em 15 de junho de 2024 
  5. «UNDB - Unidade de Ensino Superior Dom Bosco». www.undb.edu.br. Consultado em 15 de junho de 2024 
  6. a b ADEODATO, João Maurício (2017). «RETÓRICA REALISTA E DECISÃO JURÍDICA». FDV. Revista de Direitos e Garantias Fundamentais. 1 (18): 15-40 
  7. a b «João Maurício Adeodato: O Brasil nunca teve paciência com a democracia». www.diariodepernambuco.com.br. Consultado em 15 de junho de 2024