Matrifocalidade
Matrifocalidade é um conceito que qualifica um grupo doméstico centrado na mãe, estando o pai frequentemente ausente ou detendo apenas um papel secundário.[1]
Raymond Thomas Smith criou o conceito para dar conta da realidade familiar das famílias negras das Américas.[2] Segundo ele, o termo
- não deve ser confundido com matrilinearidade;
- não significa matrilocalidade (residência na casa da mãe da esposa)
- não é indicador de uma sociedade matriarcal.
Segundo Gonzalez [3] a família matrifocal apresenta as seguintes características:
1 – a mãe é a figura estável, e as outras pessoas do grupo doméstico funcionam ao seu redor;
2 – a maioria dos contactos dos membros da família se realiza com parentes matrilaterais;
3 – as mulheres têm o poder de decidir sobre as crianças e a casa.
Matrifocalidade e monoparentalidade
[editar | editar código-fonte]O primeiro estudo sobre a família afrodescendente americana é atribuído a Edward Franklin Frazier (The negro family in the United States, 1939), que enfatiza o papel da escravatura e depois, da sua abolição, na desorganização da família afro-americana. Frazier já falava de "família materna", mas é a Raymond Thomas Smith que se deve a expressão "família matrifocal", em The negro family in British Guiana, de 1956,[4] e The matrifocal family,[5] de 1973. Edith Clark, em sua obra My mother who fathered me, de 1957,[6] marcou a reflexão sobre a posição central da mãe.
Embora a definição de Fritz Gracchus [7] - "a matrifocalidade é a posição central da mãe e a marginalidade do pai" - seja consensual, há outras concepções de matrifocalidade. Uma delas, mais restritiva, requer a presença de três gerações de mulheres, sem homem no grupo doméstico. Fala-se então de matrifocalidade estrutural mas também de matrifocalidade residencial, o que parece ser um fenômeno relativamente raro.[8] e Jacques André [9] rejeita tal concepção, considerando tratar-se de uma "configuração-limite" da família matrifocal.
Uma outra concepção, menos restritiva mas também menos precisa, considera a família matrifocal como uma família sob influência feminina. Trata-se então da matrifocalidade funcional e também relacional. Neste caso, existem poucas evidências estatísticas, pois uma família monoparental (mãe-filho) pode muito bem ter um referente masculino forte (um tio, um amigo, etc.), que, embora não vivendo sob o mesmo teto, exerce grande influência na educação das crianças. No caso inverso, famílias nucleares (homem, mulher e seus filhos) podem ter um pai fisicamente presente mas, na prática, ausente da vida da família. Assim, embora as famílias monoparentais sejam numerosas, a correlação entre monoparentalidade e matrifocalidade ainda é uma questão em aberto.[10]
Referências
- ↑ BARRY, Laurent Glossaire de la parenté Arquivado em 9 de dezembro de 2008, no Wayback Machine.
- ↑ «"La famille et la parenté"» (PDF). Consultado em 7 de novembro de 2010. Arquivado do original (PDF) em 27 de novembro de 2009
- ↑ GONZALEZ, Nancie. Toward a definition of matrifocality. In Whiten Jr. & Szwed, J. (ed.) Afro-American Anthropology. Free Press and Collier Macmillan: New York London, 1970, apud George Zarur, "Repensando o conceito de matrifocalidade".
- ↑ SMITH, Raymond Thomas The negro family in British Guiana - Family structure and social status in the villages Arquivado em 12 de junho de 2010, no Wayback Machine.. London: Routledge & Kegan Paul Limited, 1956. New York: Grove Press, Inc. Institute of Social & Economic Research, University College of the West Indies, Jamaica. International Library of Sociology and Social Reconstruction. ISBN 0415175763.
- ↑ SMITH, Raymond Thomas.The matrifocal family: power, pluralism, and politics
- ↑ CLARK, Edith, My mother who fathered me - A Study of the Families in Three Selected Communities in Jamaica. Kingston, Jamaica: The Press University of West Indies, 1999.]
- ↑ GRACCHUS, Fritz. Les lieux de la mère dans les sociétés afroaméricaines - Pour une généalogie du concept de matrifocalité. Editions Caribéennes. Centre antillais de recherches et d'études, 1980.
- ↑ Um recenseamento da população nas Antilhas, mostrou que se trata de um fenômeno marginal: em apenas 5% das famílias ocorre a superposição de três gerações e na maioria delas se organiza em torno de um casalAntiane Éco n°. 19, setembro de 1992 - INSEE. La famille épouse son temps, por Jacques CAZENAVE.
- ↑ ANDRÉ, J. L'inceste focal dans la famille noire antillaise: Crimes, conflits, structure. Voix nouvelles en psychanalyse. Presses universitaires de France, 1ª ed., 1987.
- ↑ Lorsque l'enfant paraît... Antiane Éco n°. 30, dezembro de 1995, p. 19. INSEE.
Ver também
[editar | editar código-fonte]Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Repensando o conceito de matrifocalidade, por George Zarur. Artigo originalmente publicado pelos Cadernos de Antropologia da UNB, em 1976. Discute o conceito de matrifocalidade, especialmente com referência à família negra nas Américas.
- Aliados e rivais na família: o conflito entre consangüíneos e afins em uma vila portoalegrense, por Claudia Fonseca.