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Neon Cunha

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Neon Cunha
Neon Cunha
Nascimento 24 de janeiro de 1970 (54 anos)
Belo Horizonte
Cidadania Brasil
Ocupação publicitária, ativista dos direitos humanos, ativista LGBTQIAPN+, ativista trans, funcionária pública

Neon dos Afonso Cunha (Belo Horizonte, 24 de Janeiro de 1970), mais conhecida como Neon Cunha, é uma mulher, negra, transgênero, referência na luta por direitos humanos[1] e de pessoas LGBTQIAPN+ no Brasil.[2] Entrou para a história dos direitos da população trans ao mudar o nome e o gênero em seus documentos sem que tivesse que apresentar um atestado médico.[3] Foi o primeiro caso no Brasil de retificação de documento sem a necessidade de laudo médico, o que criou um precedente jurídico.[4]

Juventude e formação

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Nascida em Belo Horizonte, Neon é filha da empregada doméstica Salete dos Afonso Cunha e do metalúrgico Odilon Domingos da Cunha, e terceira filha de um total de 10 irmãos consanguíneos e mais dois de criação.[5] Por conta da profissão do pai, toda a família se mudou para São Bernardo do Campo no ABC Paulista quando ela tinha dois anos. Formou-se em publicidade e artes plásticas e fez carreira como funcionária pública na Prefeitura de São Bernardo do Campo, onde trabalha até hoje. Neon Cunha se entende como uma pessoa do gênero feminino desde a infância.[5]

Luta para reconhecimento de gênero e identidade

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“Agora eu posso existir” – História de Neon Cunha, documentado pelo Museu da Pessoa (2020)

Em 1980 a transexualidade foi catalogada como um fenômeno da psiquiatria no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) III.[6] A Organização Mundial de Saúde também classificava a identidade de gênero, quando não concordante com o sexo biológico, como transtorno mental pela Classificação Estatística Internacional de Doenças, Lesões e Causas de Óbito (CID). A organização retirou a transexualidade da lista de doenças ou distúrbios mentais em 2018.[7]

Em 2014, quando tinha 45 anos, Neon entrou na Justiça com um pedido de retificação de gênero em sua documentação. Na época, o governo federal brasileiro exigia um laudo médico que comprovasse a transexualidade de quem pleiteava a alteração dos documentos. Para isso, as pessoas precisavam se submeter a laudos médicos e de juízes. Neon se recusou a passar pela avaliação médica por entender que sua identidade não é uma patologia.[8] A questão da dispensa de laudos quase nunca foi judicializada.[9]

Com a demora no processo jurídico, Neon pediu em 2016 morte assistida à Organização dos Estados Americanos (OEA) caso seu gênero e sua identidade não fossem reconhecidos pelo Estado brasileiro.[10] Ela foi a primeira mulher trans a falar presencialmente na OEA e o fez a convite do Geledés - Instituto da Mulher Negra.[11]

No dia 31 de outubro de 2016, o juiz Celso Lourenço Morgado, da 6ª Vara Cível de São Bernardo do Campo, concedeu o pedido de mudança de gênero e nome.[12] Na sentença, ele afirmou: “A transexualidade não é uma condição patológica e a identidade de gênero é autodefinida pela pessoa.” A decisão pavimentou o caminho para o país derrubar, dois anos depois, a necessidade de judicialização para mudança no registro civil.[13] Em março de 2018 o Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito à alteração de nome e gênero no registro civil sem a realização de procedimento cirúrgico de redesignação de sexo e de processo judicial.[14]

Reconhecimentos

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A trajetória de Neon Cunha como ativista de direitos humanos foi reconhecida por diversos órgãos e premiações. Recebeu da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo em 2019 a Medalha Theodosina Ribeiro,[15] que homenageia mulheres que se destacam na sociedade. Em 2021, recebeu da Universidade Federal do ABC menção honrosa pelo combate ao ódio aos LGBTQIA+ e por sua contribuição no processo de aprovação das cotas transgênero na UFABC.[16] Em 2023, foi ganhadora do Prêmio Milu Villela ao lado de Nego Bispo e Léa Garcia.[17]

Desde 2018 é matrona da Casa Neon Cunha, espaço de acolhimento para pessoas LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade social no ABC Paulista.[18]

Publicações

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Além do trabalho como funcionária pública na Prefeitura de São Bernardo do Campo, Neon atua em outras áreas. Na moda, é atualmente colaboradora da Isaac Silva[19] e do Instituto Casa de Criadores.[20]

Já publicou artigos em diversas publicações, entre elas no livro “Mobilidade antirracista”, organizado pela Fundação Rosa Luxemburgo, em que escreveu o artigo “Transicionar o coletivo é preciso”, ao lado do jornalista João Bertholini,[21] além de colunas nos sites Midia Ninja,[22] Máxima[23] e Alma Preta.[24]

Atuação política

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Em 2022 foi candidata a deputada estadual pelo estado de São Paulo e obteve 35.111 votos.[25] Em 2024 é candidata a vereadora pela cidade de São Paulo.[26]

Referências

  1. «Neon Cunha». Memorial da Resistência. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  2. «Neon Cunha: 'Não nos interessa apenas inclusão, queremos pertencimento'». Revista Marie Claire. 25 de agosto de 2022. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  3. «Pela primeira vez, mulher trans pode mudar gênero sem avaliação médica - 31/10/2016 - Cotidiano». Folha de S.Paulo. 2 de agosto de 2024. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  4. «À margem da margem - revista piauí». revista piauí - _pra quem tem um clique a mais. 3 de fevereiro de 2022. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  5. a b «NEON CUNHA, 44: Transexual pede morte assistida se não puder mudar nome e gênero - 30/07/2016 - Cotidiano». Folha de S.Paulo. 2 de agosto de 2024. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  6. Arán, Márcia; Murta, Daniela (2009). «Do diagnóstico de transtorno de identidade de gênero às redescrições da experiência da transexualidade: uma reflexão sobre gênero, tecnologia e saúde». Physis: Revista de Saúde Coletiva: 15–41. ISSN 0103-7331. doi:10.1590/S0103-73312009000100003. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  7. Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (22 de junho de 2018). «OMS retira transexualidade da lista de doenças e distúrbios mentais». gov.br. Consultado em 2 de agosto de 2024 
  8. Neon Cunha luta para ser reconhecida como mulher | Estação Plural | TV Brasil | Cidadania, 3 de outubro de 2017, consultado em 3 de agosto de 2024 
  9. «Opinião – Paulo Iotti: "Julgamento de STF sobre registro de pessoas trans foi histórico"». Fecom Bahia. 7 de março de 2018. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  10. «Pelo direito de existir: Ao pedir direito à morte assistida, Neon Cunha entrou para história e mudou a vida de mulheres trans do Brasil». www.uol.com.br. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  11. Santos, Jessica (2 de março de 2021). «Neon Cunha, ativista trans: 'Lembro de gente morta com tiro na testa, com a cabeça debaixo de coturno de policial'». Ponte Jornalismo. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  12. «Andamento do Processo n. 1012057-34.2016.8.26.0564 - Retificação ou Suprimento ou Restauração de Registro Civil - 31/10/2016 do TJSP». Diário de Justiça do Estado de São Paulo. 31 de outubro de 2016. Consultado em 2 de agosto de 2024 
  13. «Primeira trans do Brasil a mudar nome e gênero sem cirurgia, Neon Cunha estará no I Mutirão de retificação da DPCE; palestra é aberta ao público». Defensoria Pública do Estado do Ceará. 24 de junho de 2022. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  14. «STF reconhece a transgêneros possibilidade de alteração de registro civil sem mudança de sexo». Supremo Tribunal Federal. 1 de março de 2018. Consultado em 2 de agosto de 2024 
  15. «Medalha Theodosina Ribeiro homenageia 16 mulheres». www.al.sp.gov.br. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  16. Godoy, José. «Homenagens destacam agentes externos de atuação relevante na trajetória da UFABC - Universidade Federal do ABC». www.ufabc.edu.br. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  17. «"Prêmio Milú Villela - Itaú Cultural 35 Anos": leia os perfis dos homenageados». Itaú Cultural. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  18. «Casa Neon Cunha leva acolhimento e dignidade a pessoas LGBTQIAPN+ em situação de vulnerabilidade no ABC Paulista». GQ. 25 de junho de 2024. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  19. «ISAAC SILVA». FFW. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  20. «Casa de Criadores cria Instituto para repensar a moda». L'Officiel Brasil. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  21. Costa, Katarine (22 de junho de 2021). «Transicionar o coletivo é preciso, com João Bertholini e Neon Cunha». Fundação Rosa Luxemburgo. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  22. «Neon Cunha, Autor em Mídia NINJA». Mídia NINJA. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  23. Ezatamentchy (28 de junho de 2024). «Stonewall não é aqui, por Neon Cunha». Máxima. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  24. Preta, Alma (29 de janeiro de 2024). «Visibilidade Trans e o direito fundamental: ser quem se é». AlmaPreta. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  25. «Neon estuda candidatura a vereadora na Capital - Diário do Grande ABC - Notícias e informações do Grande ABC: lgbt,negra,amerindia,transgenera,politica,grande abc,psol,periferia,boulos,neon cunha». Jornal Diário do Grande ABC. 23 de outubro de 2023. Consultado em 3 de agosto de 2024 
  26. «Eleições 2022: Neon Cunha - PSOL | Ficha do candidato | Folha». Folha de S.Paulo. Consultado em 3 de agosto de 2024 

Ligações externas

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