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O Risco do Bordado

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
O risco do bordado
Autor(es) Autran Dourado
Idioma Português
País  Brasil
Gênero Romance
Linha temporal Meados do século XX
Localização espacial Minas Gerais
Editora Editora Expressão e Cultura
Lançamento 1970
Páginas 273
ISBN 85-325-1021-3
Cronologia
Ópera dos mortos
Uma poética de romance

O risco do bordado é um romance do escritor brasileiro Autran Dourado, publicado em 1970. A história se passa na cidade fictícia de Duas Pontes, interior de Minas Gerais, em meados do século XX. A obra foi bem acolhida pelo público e pela crítica desde a sua publicação e ganhou o Prêmio Pen-Club do Brasil naquele ano.

O romance é estruturado em sete blocos relativamente independentes, que a princípio dão a impressão de contos isolados em que tomam parte os mesmos personagens. Todos os episódios referem-se à adolescência do escritor João da Fonseca Nogueira, que volta ao cenário de sua infância, encontra antigos moradores da cidade, parentes e companheiros de infância, e vai montando uma espécie de quebra-cabeças, resgatando fragmentos de memória para compor a narrativa. Trata-se, assim, de um romance de formação, que trata da descoberta da sexualidade, da amizade, da traição e da literatura. A personalidade e a história da vida de outros personagens próximos, como o Vovô Tomé, também vão sendo lentamente revelados.

A narrativa não é linear: tem o ritmo descontínuo e labiríntico da memória. A fragmentação e desordem temporal das recordações requerem frequentemente acréscimos por parte da imaginação e de interpretações de João e de outros personagens. O risco do bordado que é a história da vida de um homem não pode ser totalmente conhecido por ele mesmo.

O mundo é muito desigual em seus caminhos. O risco não é a gente que traça. (em "Assunto de Família")

Deus é que sabe por inteiro o risco do bordado. (em "As Roupas do Homem")

O autor utiliza o recurso da falsa terceira pessoa: a narrativa está na terceira pessoa, mas o leitor facilmente identifica o narrador a João; em alguns trechos, a narrativa chega a passar para a primeira pessoa durante um curto intervalo. Em um dos blocos (Assunto de Família), a falsa pessoa não é mais João e sim seu avô Tomé. No último episódio, também se emprega a narrativa em blocos: o narrador praticamente desaparece quando pessoas diferentes fornecem seu depoimento sobre alguma circunstância da vida de um cangaceiro, o que dá origem não apenas a uma visão fragmentada, mas também incoerente, desse personagem. Em toda a obra Dourado usa o discurso indireto livre, em que as falas das personagens se misturam com a voz do narrador, sem demarcação específica.

A obra resiste à classificação. Por um lado, faltam-lhe características distintivas do romance, como, por exemplo, a existência de um clímax na narrativa. Por outro lado, não se pode falar de apenas um grupo de histórias, pois é inegável que o todo formado vai além da mera justaposição das partes.[1][2]

Estão presentes nesse romance outras características notáveis do escritor:

  1. A presença de pares de personagens contrastantes, como Joâo/Valentina e vovô Tomé/vó naninha;
  2. A recorrência de idéias, eventos e personagens;
  3. A intertextualidade, com essas idéias, eventos e personagens trafegando entre narrativas diferentes e entre livros diferentes;
  4. O trabalho artesanal meticuloso na escrita;
  5. A construção psicológica cuidadosa e lenta dos personagens.

Autran Dourado analisa em outro livro seu, Uma poética de romance, o processo de construção dessa obra, revelando uma estrutura complexa que requereu a elaboração prévia de desenhos e plantas-baixas por parte do escritor. A respeito disso, declarou:

Técnica labiríntica, onírica, amplificadora, através de desdobramento e fusões associativas, metafóricas. (em O meu mestre imaginário)

Inicialmente eu coloquei as marcações, as reações que o menino ia sentindo com o desenrolar do caso do avô; depois as subtrai para alcançar o efeito de ambigüidade, que acredito ter conseguido. A ambigüidade em ficção é tão importante como em poesia. (em Uma poética de romance: matéria de carpintaria)

É uma metáfora, o risco serve para a gente não se perder. Na construção narrativa em blocos, se não houver esse planejamento, posso me perder. A gente tem que ir deixando rastro, se não, não se acha o fio da meada. [...] Primeiro faz-se o risco, depois se borda por cima dele. Gosto de lembrar que conforme diz o ditado popular, “Deus é que sabe por inteiro o risco do bordado” (em entrevista - 2008).

O personagem João da Fonseca Ribeiro aparece em outros livros do autor: Um artista aprendiz e A serviço del-rei, que focam aspectos posteriores de sua vida. Além disso, o vovô Tomé volta a aparecer em O senhor das horas.[3]

  1. Viagem à Casa da Ponte: João acompanha seu melhor amigo, Zito, que trabalha numa loja, a um bordel, para levar sapatos a serem provados pelas prostitutas.
  2. Nas Vascas da Morte: João vive a experiência da morte se um de seus tios-avós, Maximino, afastado da família devido a rixas com o avô de João.
  3. Valente Valentina: Um circo visita a cidade, e João torna-se amigo da adolescente trapezista cujo nome artístico é Valentina.
  4. As Voltas do Filho Pródigo: A história de Zózimo, tio de João, cujos mistérios e esquisitices João luta para entender.
  5. Assunto de Família: A história do bisavô de João, Zé Mariano.
  6. O Salto do Touro: Um contato erótico com a tia solteirona, Margarida.
  7. As Roupas do Homem: As muitas faces e interpretações da vida e da personalidade do cangaceiro Xambá, conforme relatos de pessoas que com ele tiveram variados tipos de contato, uma delas, o garoto João.

Referências

  1. Douglas Wisniewski. «"O Risco do Bordado". Autran Dourado». Consultado em 11 de janeiro de 2011. Arquivado do original em 19 de outubro de 2008 
  2. Editora Rocco. «Descoberta da sexualidade, da amizade e da literatura em "contos entrelaçados"». Consultado em 11 de janeiro de 2011 
  3. Leonor da Costa Santos. «Autran Dourado em romance puxa romance ou a ficção recorrente» (PDF). Consultado em 31 de dezembro de 2010. Arquivado do original (PDF) em 11 de novembro de 2011