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Usuário(a):Lúcio Costi Ribeiro/Testes

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Operação Acrônimo: absolvição

Um dos episódios “mais marcantes e dolorosos” da vida de Mario Rosa, nas palavras do próprio jornalista, “acabou após 1.855 dias de terríveis provações”.

O Ministério Público Federal, depois de 5 anos e 1 mês de investigações que devassaram a sua vida, concluiu que não havia provas que o incriminassem na chamada “Operação Acrônimo”. O procurador da República Frederick Lustosa de Melo concluiu que as acusações contra o consultor não se sustentavam e a Justiça Federal determinou o arquivamento do processo.[1]

Uma das acusações apontava que Mario Rosa havia recebido pagamento para influenciar contra o financiamento pelo BNDES para a aquisição de uma rede varejista de atuação nacional. O comprador da empresa, vejam só, também havia procurado Mario Rosa para lhe assessorar no posicionamento público sobre o negócio.[2]

Ocorre que a empresa do jornalista foi, isto sim, contratada para fazer assessoria de imprensa por uma concorrente, que seria afetada pelo negócio. No entanto, o trabalho foi iniciado após a decisão do banco de não conceder o financiamento (confira abaixo). A assessoria foi prestada por Mario Rosa em parceria com outra empresa de Assessoria de Comunicação, cuja proprietária se tornaria, três anos mais tarde, esposa de uma autoridade. Para a Polícia, a subcontratação teria o intuito de repassar dinheiro para essa autoridade influenciar o banco público no caso em questão, mas os investigadores não atentaram para o fato de ser impossível influenciar uma decisão que já havia sido tomada.

O Procurador Federal descreveu os seguintes fatos na Petição inserida no processo, que correu em segredo de Justiça:

“Mario (forma como o MPF se refere ao jornalista, cujo nome usado profissionalmente é Mario Rosa) somente iniciou o seu trabalho de comunicação...após a decisão do BNDES, não tendo praticado qualquer ato que pudesse ensejar ou interferir na decisão da referida entidade, sendo que seu trabalho nunca foi feito perante a referida instituição e, por isso, nunca lá esteve ou mesmo fez qualquer contato com os responsáveis pela condução do assunto no Banco em questão, antes, durante ou após a decisão do BNDES;”[3]

Além do mencionado acima, a Petição do MPF ainda coleciona outros fatos que demonstram que o consultor não teve relação nenhuma com a decisão do banco.

A contratação da empresa parceira para o trabalho de assessoria de imprensa, conforme o documento do MPF, “somente ocorreu no primeiro semestre de 2012, não havendo, portanto, qualquer relação com a decisão proferida pelo BNDES no começo de julho de 2011”. O MPF ainda reconhece que “não há qualquer ligação, mensagem ou qualquer registro de conversas” entre Mario Rosa e a subcontratada no período em junho/julho 2011, com relação ao tema em alusão.

“Ao contrário do mencionado no Relatório da autoridade policial”, continua o Procurador da República, “a decisão tomada pelo BNDES foi precedida por uma grande pressão da imprensa, eis que a possibilidade de o Banco injetar uma enorme quantidade de dinheiro na operação estava gerando um enorme desconforto a todos, inclusive, considerando que o País não estava vivendo um bom momento econômico”.

A acusação ainda se imiscuiu em avaliar o valor do contrato firmado entre Mario Rosa e seu cliente, relação que o MPF também reputou que não indicavam crime algum. O Procurador Frederick Lustosa de Melo escreveu que “estava dentro dos padrões praticados pelas referidas empresas, e que MARIO ROSA sempre gozou de muito prestígio e, por isso, seu trabalho era muito valorizado. Tanto é assim que possuía na sua carteira de clientes somente grandes empresas. A média de valores dos contratos celebrados era a mesma, conforme pode ser facilmente verificado nos documentos apreendidos”.[4]

“Ademais, o fato de ter sido procurado pelos dois grandes grupos envolvidos em uma das maiores batalhas comerciais e de comunicação do País é a clara demonstração de seu prestígio e da importância do seu trabalho que, destaque-se, sempre foi feito na área de comunicação e nunca teve função de ‘lobista’ ou intermediário de qualquer contrato celebrado pela administração pública.”

Outra ilação se referia ao crescimento do patrimônio de Mario Rosa, considerado pela Polícia excessivo, no período entre 2009 e 2014. Sobre isso, o MPF recepcionou o argumento da defesa:

“Por fim, negou veementemente a afirmação da autoridade policial quanto a suspeitas sobre sua evolução patrimonial, uma vez que esta resultou tão somente de sua atividade lícita e de seu reconhecimento no mercado, sendo que todos os ganhos foram devidamente declarados à Receita Federal.”

O Procurador ainda ressaltou a reputação e qualidade técnica do consultor de Comunicação Social no mercado ao pedir que a Justiça arquivasse o processo:

“Restou inegável nos autos a notoriedade de MARIO ROSA no meio das comunicações, tendo em vista que há provas de que há bastante tempo ele já era requisitado por grandes empresas do cenário nacional visando gerenciar crises de imagem”

O juiz da Vara Federal que conduzia o caso acatou prontamente a representação do Procurador e o processo foi extinto:

“Adoto como razões de decidir a promoção do Ministério Público Federal (ID 285687357), para o fim de, com esteio no art. 28 do Código de Processo Penal (aplicado a contrário sensu), DETERMINAR o ARQUIVAMENTO dos autos, com as ressalvas do art. 18 daquele Ato Normativo.“[5]


Balanço de 1.855 dias - Carta aos amigos

Após ser inocentado pela Justiça Federal, Mario Rosa refletiu sobre o peso da densa atmosfera que havia respirado nos 1.855 dias desde que, “na alvorada do dia 25 de junho de 2015, o toque insistente da campainha ganhava uma sonoridade estrondosa, contrastando com o lusco-fusco”. Do outro lado do portão, r uma voz imponente anunciou: “Senhor Mario Rosa? É a Polícia Federal”.[6]

Da reflexão, nasceu uma carta aos seus amigos e amigas mais próximos em que relaciona o que lhe acometera aos “abusos que se tornaram possíveis no país, com a implantação do chamado ‘Estado Policial’, que veio na esteira da Operação Lava Jato e hoje é questionado pelos seus excessos e pelas acusações e denúncias sem provas ou fundamentos feitas contra algumas vítimas”.

Mas a carta não se resume à análise do cenário político-jurídico-policialesco que vive o país. Mario Rosa mergulha numa meditação sobre o que significou para sua vida os efeitos de ver cruzando seu caminho a “banalidade do mal”.

Meus amigos queridos, minhas amigas queridas,

Na semana passada, após 1855 dias, houve o ‘arquivamento’ das acusações que sofri no contexto da ‘Operação Acrônimo’.

Como é natural, a mídia deu pouco destaque ao desfecho e, de minha parte, não cabe publicar artigos e criar qualquer tipo de conflito público, pois afinal o episódio teve bom termo.

Mesmo assim, sinto-me na obrigação de prestar contas após todos esses anos dessa desconfortável posição de ser questionado oficialmente para pessoas como você e, ao invés de apenas me defender ou vociferar, preferi compartilhar uma reflexão pessoal - humana, na medida do possível equilibrada e serena - para que episódios como o que eu sofri sirvam pelo menos para que possamos aprimorar o nosso sistema e as nossas instituições.

Muito obrigado por todo apoio e solidariedade durante todos esses longos anos,

Mario Rosa

Aqui a reflexão

O dia em que fui “cabeça de Orcrim” ou “a banalidade do mal”

Veja este quadro acima.

Estou colocado no topo de uma organização criminosa. Ali, sou um “cabeça de Orcrim”.

Passados 5 anos e 1 mês de um processo criminal que começou com uma busca e apreensão em minha casa e na esteira produziu diversos impactos pessoais em minha vida - o fim de um casamento de 18 anos, perda de patrimônio, clientes e sobretudo paz e o escárnio social devido a incomoda situação de ser colocado como suspeito de atos criminosos, sem contar a depressão de minha filha e os abalos emocionais causados por toda essa reviravolta - não creio que enumerar lamúrias ou expressar ressentimentos seja a contribuição mais útil que possa oferecer ao debate público.

Para a minha honra, o Ministério Público Federal decidiu recomendar o arquivamento por absoluta falta de provas e reconheceu minha inocência em todo o caso, a chamada ‘Operação Acrônimo’, onde fui parar apenas porque contratei uma jornalista de forma legal, com emissão de notas fiscais, por pagamentos eletrônicos, para me assessorar numa das maiores batalhas empresariais privadas do país em todos os tempos. Um trabalho típico de consultor de crises.

O MP federal, após analisar com profundidade o caderno acusatório, constatou a ausência de motivos para uma ação judicial e ‘julgou’ que não deveria haver sequer um julgamento, por ausência de justa causa. O juiz da vara acolheu a muito rara manifestação de um representante do MP nesse sentido e a questão foi extinta. Após 1855 dias, tive minha dignidade mínima como cidadão devolvida pelo Estado.


Mas qual o motivo deste artigo? O motivo é refletir sobre a tabela acima. Como me tornei - por força de um organograma, de um power point - um “cabeça de Orcrim”? E como, depois de ter parado lá, essa acusação tão grave pode ter se esfarelado ao ponto de não servir sequer para ser acusado de nada, por total falta de provas?

Isso não fala de mim. Isso fala do nosso tempo. Do tempo que vivemos, sobretudo nos anos passados.

A consequência prática dessa aparentemente inofensiva ‘tabela’ é que ela serviu de base para a solicitação e concessão de duas dezenas - repito - 20 buscas e apreensões, além de uma condução coercitiva, entre todos ou quase todos os meus principais clientes, espalhados pelo país. Imagine o que significou para mim, o que significaria para qualquer profissional, ao invés de levar uma solução para seus clientes ser o responsável por levar um, dois camburões da Polícia Federal no auge do Estado Policial? Estamos falando de 2015...

Faço toda essa introdução pessoal para relembrar um dos principais e mais conhecidos conceitos da filósofa alemã, Hannah Arendt. Ela assistiu ao julgamento do carrasco nazista Adolf Einchman, em 1962 e, particularmente, fixou seu olhar analítico sobre os depoimentos do funcionário nazista. O que mais chamou atenção dela? Buscar uma resposta para uma pergunta crucial.

‘O que faz um ser humano normal realizar os crimes mais atrozes como se não estivesse fazendo nada demais’?

O cerne do conceito apresentado pelo livro de Arendt sobre o julgamento de Einchman – ‘a banalidade do mal - é a perturbadora ideia de que o mal não precisa ser necessariamente resultado de pessoas cruéis, desumanas, maléficas, criminosas. Pode ser praticado por pessoas que se consideram apenas ‘cumprindo o seu dever’, sem qualquer tipo de autocrítica. Trabalham num campo de concentração durante o dia e, à noite, podem ser ótimos país ou mães, maridos ou esposas.

- Sua consciência ficou efetivamente tranquila quando ele viu o zelo e o empenho com que a ‘boa sociedade’ de todas as partes reagia ao que ele fazia. Ele não precisava ‘cerrar os ouvidos para a voz da consciência’, como diz o preceito, não porque ele não tivesse nenhuma consciência, mas porque sua consciência falava com a ‘voz respeitável’, com a voz da sociedade respeitável à sua volta.

Fico imaginando a noite em que o responsável ou a responsável pela autoria da tabela que inicia este artigo chegou em casa. Provavelmente estava orgulhoso pelo trabalho bem feito! Pouco importa se nada daquilo fosse verdade ou se aquilo fosse destruir vidas. Era uma missão cumprida com exímia perícia. A banalidade do mal é assim: não há remorsos. Há até um certo orgulho de participar de algo positivo e reconhecido pela ‘sociedade’.

Termino esta reflexão, meu amigo, minha amiga, ressaltando que foram graças às instituições, mesmo que apesar de parte delas, mas graças sobretudo a elas, que pude ao fim e ao cabo não sofrer a malignidade absoluta do abuso estatal. O sistema de freios e contrapesos, contemplado em nossa Constituicao, permitiu que em algum ponto a justiça fosse feita.

O que quero destacar aqui é justamente a importância e a responsabilidade dos detentores do poder, sobretudo do poder de acusar. Uma simples tabela - uma ‘hipotese’ investigativa - se transformou numa avalanche que arruinou os fundamentos de minha vida. Não tivesse eu uma sólida base probatória e, acima de tudo, não tivesse o Ministério Público em algum ponto cessado essa sucessão de banalidades do mal, meu destino talvez fosse outro.

O que coloco aqui para os operadores do Direito: a missão das senhoras e dos senhores é crucial e o peso de suas decisões - mesmo a confecção de um simples organograma - pode destruir e selar o destino de alguém. Isso só aumenta a responsabilidade com que esse importante e fundamental poder precisa ser exercido.

Qualquer dúvida, olhe a tabela de novo.”

  1. «Justiça arquiva inquérito da operação Acrônimo». Poder360. 29 de julho de 2020. Consultado em 19 de outubro de 2020 
  2. Sena/Divulgação, Myke. «Mário Rosa, o Wolverine: "Eu saí da UTI"». HOME. Consultado em 19 de outubro de 2020 
  3. Melo, Procurador-federal Frederick Lustosa de (23 de julho de 2020), Português: Petição do MPF (PDF), consultado em 19 de outubro de 2020 
  4. Melo, Procurador-federal Frederick Lustosa de (23 de julho de 2020), Português: Petição do MPF (PDF), consultado em 19 de outubro de 2020 
  5. Português: Decisão da Jusitça Federal que determina o arquivamento do processo (PDF), 28 de julho de 2020, consultado em 19 de outubro de 2020  |nome1= sem |sobrenome1= em Authors list (ajuda)
  6. «Entre a Glória e a Vergonha». www.uol. Consultado em 19 de outubro de 2020