Dialeto neutro

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Dialeto Neutro

Sotaque Neutro, Padrão

Falado(a) em: Todo o território do Brasil
Região: Geralmente usado nos meios de comunicação em massa, por profissionais da voz, mas também usado em algumas regiões urbanas brasileiras e em cursos de português para estrangeiros
Total de falantes: sem números exatos
Posição: Não se encontra entre os 100 primeiros
Família: Indo-europeia
 Língua portuguesa
  Português brasileiro
   Dialeto Neutro
Estatuto oficial
Língua oficial de: sem reconhecimento oficial
Regulado por: sem regulamentação oficial
Códigos de língua
ISO 639-1: --
ISO 639-2: ---

O dialeto neutro (também conhecido como sotaque branco, sotaque padrão ou sotaque do Jornal Nacional[1]) é uma variação linguística do português brasileiro usado na mídia em geral, seja em telejornais, novelas, séries, filmes, dublagens, peças de teatro, programas de rádio, televisão ou internet, assim por diante, bem como em alguns discursos políticos oficiais de nível federal, portanto não sendo característico de alguma região geográfica em especial.

História[editar | editar código-fonte]

Em 1º de setembro de 1969, a TV Globo dá inicio às primeiras transmissões do Jornal Nacional, o primeiro programa de televisão brasileiro a ser exibido em rede nacional.[2] Com o surgimento do telejornal em rede nacional, nasce a necessidade de um falar, por parte dos âncoras e repórteres, que fosse considerado como neutro, ou seja, isento de características regionais[1] seguindo o exemplo do General/Standard American English, do inglês americano (também chega a ser comparado ao Received Pronunciation do inglês britânico... no entanto o dialeto equivalente a este último na língua portuguesa seria o dialeto estremenho do português europeu). Tal modo de falar tornou-se a forma padrão usada pela mídia e também por diversos oradores ao redor do país.[1][3]

Características fonético-morfológicas[editar | editar código-fonte]

A principal característica do dialeto neutro é a dificuldade de se identificar a origem da pessoa que está falando.[4] Nota-se, na composição do dialeto, uma hibridização de fonemas comuns aos vários sotaques brasileiros, bem como uma linearização do canto linguístico.[5]

  • A palatalização de /d/ e /t/, como de costume na maioria dos sotaques brasileiros, e sua pronunciação em [dʒ] e [tʃ] (ou [dᶾ] e [tᶴ]) antes de /i/. A palavra presidente é pronunciado [pɾeziˈdẽtᶴi].[5]
  • As fricativas /s/ e /z/ nunca são palatalizadas, ocorrendo até mesmo em caso de virem na frente de consoantes alveolares e dentais (/d/ e /t/), à semelhança do que ocorre com os dialetos paulistano, mineiro, caipira, sertanejo, brasiliense e sulista: isto ['istu] e desde ['dezdʒi].[5]
  • A pronúncia do "s" é consoante alveolar tal qual na maioria dos dialetos brasileiros (e em contraste forte com o "s" chiante" do dialeto carioca). Exemplo: véspera ['vɛspeɾa].[5]
  • A pronúncia do "r" forte e aspirado no meio das palavras, tal como nos dialetos carioca, fluminense, mineiro, brasiliense e os sotaques das regiões Norte e Nordeste do país, porém com mais suavidade. Exemplo: carne [k′ar̄′ni].[5]
  • A pronúncia, ainda que ocasional, do "r" brando no fim das frases, como no dialeto paulistano e nos sotaques da região Sul do país. Exemplo: achar [aʃ′ar].[6]
  • Uniformização do canto dialetal isentando-o de características regionais tanto na maneira linear de pronunciação como na ausência de termos ou gírias locais.[7]

Opinião pública[editar | editar código-fonte]

A padronização do sotaque na mídia se deve por alguns motivos como:[3]

  1. Evitar que o ouvinte/espectador/telespectador desvie sua atenção evitando que o foco do assunto a ser tratado seja desviado;
  2. Evitar a presença de fonemas que atrapalhe na transmissão da mensagem entre emissor e receptor;
  3. Evitar que um sotaque predomine sobre o outro evitando uma violação ao valor democrático dos dialetos brasileiros.

Pesquisas com telespectadores de telejornais[editar | editar código-fonte]

De acordo com pesquisas feitas com estudantes do curso de Jornalismo da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), é possível encontrar três opiniões a respeito do dialeto neutro: a favor, contra e impreciso.[3] Na pesquisa foi observado que 31% dos entrevistados são favoráveis ao uso do dialeto neutro por considerarem que este soa como comum a todos os brasileiros, o sotaque característico de alguma região desviaria a atenção.[3] Outros 31% acreditam que os sotaques mostram a diversidade cultural do Brasil, portanto deveriam ser utilizados pela mídia.[3]

Críticas ao sotaque neutro das telenovelas brasileiras[editar | editar código-fonte]

Em 2018, a novela Segundo Sol, da TV Globo, foi criticada pelo fato de sua história se passar no litoral baiano, porém com personagens sem o sotaque característico da região variando entre um dialeto baiano exageradamente artificial, um dialeto carioca com pronúncia suave e o próprio dialeto neutro.[8] Outra novela criticada, mas desta vez pelo uso integral do dialeto neutro, é Sonho Meu (1993), também da TV Globo, por se passar em Curitiba, capital do Paraná, e seus personagens possuírem um sotaque sem as características locais.[8]

Suavização dos dialetos regionais em programas locais[editar | editar código-fonte]

Algumas afiliadas locais das grandes redes de televisão brasileiras passaram a adotar uma variação do sotaque neutro que permite alguma influencia dos dialetos locais. Os telejornais e programas locais de emissoras afiliadas localizadas em regiões interioranas do país passaram a admitir um sotaque regional suavizado em contexto formal, porém bem mais próximo ao dialeto neutro.[9][10]

Dialetos regionais semelhantes ao dialeto neutro[editar | editar código-fonte]

Para alguns especialistas, os dialetos falados em Brasília,[11] Espírito Santo[12] e na região Sul Fluminense, no estado do Rio de Janeiro,[13] são parecidos e bem próximos ao dialeto neutro por serem intermediários, ou seja, compostos por elementos de vários sotaques diferentes.

Referências

  1. a b c MENDES, Conrado Moreira (2006). O falar do Jornal Nacional: produção e recepção de um sotaque de natureza ideológica. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais 
  2. Hamburger, Esther (23 de janeiro de 1995). «'Jornal Nacional' precisa se reinventar». Folha de S. Paulo. Consultado em 21 de junho de 2018. Cópia arquivada em 21 de junho de 2018 
  3. a b c d e DE SOUSA, Socorro Cláudia Tavares; DE ANDRADE, Rafaela Cristina Oliveira; DIONÍSIO, Cynthia Israelly Barbalho (2012). Sotaque do telejornalismo brasileiro: Uma questão de política semântica. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba 
  4. «Fonoaudiologia ajuda a neutralizar sotaque». Central da Fonoaudiologia. 22 de abril de 2015. Consultado em 21 de junho de 2018. Cópia arquivada em 21 de abril de 2018 
  5. a b c d e Vídeo "Fonoaudiologia #4 - Neutralizando Sotaques", do canal Locutores & Dubladores, no Youtube.
  6. Vídeo "Exercícios - Sotaque Neutro", de Gabriela Colin, no Youtube.
  7. Fernanda, Heloísa (19 de setembro de 2016). «A mídia e o sotaque neutro no jornalismo». Jornal Matéria Prima. Consultado em 21 de junho de 2018. Cópia arquivada em 21 de junho de 2018 
  8. a b Binder, Angelo (1º de junho de 2018). «Sotaques regionais das novelas». Tribuna do Paraná. Consultado em 21 de junho de 2018. Cópia arquivada em 21 de junho de 2018 
  9. Mini-documentário "Sotaque no Telejornalismo", de Gianda Oliveira, disponível no Youtube.
  10. LOPES, Leonardo Wanderley; LIMA, Ivonaldo Leidson Barbosa; SILVA, Eveline Gonçalves; ALMEIDA, Larissa Nadjara Alves de; ALMEIDA, Anna Alice Figueiredo de (2014). Preferência dos Ouvintes em Relação ao Sotaque Regional em Contexto Formal e Informal de Comunicação (PDF). João Pessoa: Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal da Paraíba 
  11. Moura, Rafael Moraes (21 de abril de 2010). «Candango tem sotaque sem traços esteriotipados e se apropria de tudo». O Estado de S.Paulo. Consultado em 21 de junho de 2018. Cópia arquivada em 21 de junho de 2018 
  12. Motta, Urariano (24 de fevereiro de 2012). «A padronização do sotaque no telejornalismo». GGN. Consultado em 21 de junho de 2018. Cópia arquivada em 21 de junho de 2018 
  13. Prestes Filho, Luiz Carlos (2009). Cadeia produtiva da economia do carnaval. Rio de Janeiro: E-Papers. 158 páginas. ISBN 978-85-7650-219-7