Socialismo religioso

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Socialismo religioso é um termo usado para descrever formas de socialismo que são baseadas em valores religiosos. O socialismo religioso, especificamente o de vertente cristã, foi o tipo de socialismo original que existiu no início do século XIX na Europa Ocidental, a partir do qual todas as outras vertentes se ramificaram.

Muitas das maiores religiões descobriram que as suas crenças acerca da sociedade humana, convergem com princípios e ideias socialistas. Como resultado, os movimentos socialistas religiosos desenvolveram-se dentro destas religiões.

Alguns desses movimentos são: socialismo budista, socialismo cristão, socialismo judaico e socialismo islâmico.

Socialismo e religião[editar | editar código-fonte]

Socialismo cristão[editar | editar código-fonte]

Ver: Socialismo cristão

Os ensinamentos de Jesus são freqüentemente descritos como socialistas.[1] Há quem veja a igreja primitiva, como a descrita nos Atos dos Apóstolos, como uma forma primitiva de comunismo ligando Jesus como o primeiro comunista.[2] Este vínculo seria destacado nos primeiros escritos de Karl Marx, onde afirmou que “Cristo é o intermediário perante o qual o homem descarrega toda a sua divindade, todos os seus laços religiosos, portanto o Estado é o mediador perante o qual ele transfere toda a sua impiedade, toda a sua liberdade humana”.[2] O espírito marxista que visa a unidade reflete o ensino universalista cristão de que a humanidade é uma e que há apenas um deus que não discrimina as pessoas.[3]

Utopia[editar | editar código-fonte]

No século XVI, o escritor inglês Thomas More, venerado na Igreja Católica como um santo, descreveu uma sociedade baseada na propriedade comum, em seu tratado Utopia, cujos líderes a administravam por meio da aplicação da razão.[4] Vários grupos na Guerra Civil Inglesa apoiaram esta ideia, especialmente os Diggers que defendiam os ideais comunistas mas agrários.[5] A atitude de Oliver Cromwell em relação a esses grupos era ambivalente e, na melhor das hipóteses, hostil.[6]

Reino Celestial Taiping[editar | editar código-fonte]

Os participantes da Rebelião Taiping, que fundaram o Reino Celestial Taiping, são vistos pelo Partido Comunista da China como proto-comunistas. O Reino Celestial Taiping foi um estado oposicionista existente na China Imperial entre 1851 e 1864 estabelecido por Hong Xiuquan, um convertido ao cristianismo que se autoproclamou rei da nação e como o novo Messias, inclusive declarando-se como o segundo filho de Deus e irmão mais novo de Jesus Cristo.[7]

No Reino Celestial, a propriedade privada foi abolida com a distribuição da terra,[8] a sociedade foi declarada sem classes e os sexos foram declarados iguais, o ópio, a escravidão e a prostituição foram proibidos sob pena de morte.

Jim Jones e Jonestown[editar | editar código-fonte]

Jim Jones teve sua própria interpretação das idéias de Marx e Engels, assumindo uma atitude passiva em vez de promover uma revolta dos desprivilegiados.[9] Jones usou passagens bíblicas para apoiar sua mensagem comunista, citando frequentemente o Novo Testamento.

Portanto, não há justiça nesta sociedade, então ninguém pode ter uma dívida com a sociedade, e isso é uma lavagem cerebral que os ricos colocaram em suas cabeças, que devemos algo à sociedade. A única coisa que devemos à sociedade é se ela é uma sociedade socialista justa. Então você deve algo a ele. Se não, você não deve nada a ele.[10]

Jones fundou Jonestown tentando construir uma comunidade rural autossustentável, uma tentativa que terminaria em massacre.[11]

Socialismo budista[editar | editar código-fonte]

O socialismo budista defende um socialismo baseado nos princípios do budismo, buscando acabar com o sofrimento, analisando as condições e eliminando suas principais causas por meio da práxis. Pessoas que foram descritas como socialistas budistas incluem Buddhadasa Bhikkhu, B. R. Ambedkar, S. W. R. D. Bandaranaike, Han Yong-un[12] e Norodom Sihanouk.[13]

Bhikkhu Buddhadasa acreditava que o socialismo é um estado natural, o que significa que todas as coisas existem juntas em um sistema.[14] Han Yong-un sentia que a igualdade era um dos princípios fundamentais do budismo.[12]

Socialismo judaico[editar | editar código-fonte]

Ver: Socialismo judaico

Os judeus têm sido forças importantes na história do movimento trabalhista, direitos das mulheres, anti-racismo e anti-colonialismo e organizações anti-fascistas e anti-capitalistas na Europa, Estados Unidos, Argélia, Iraque, Etiópia e Israel.[15][16]

Socialismo islâmico[editar | editar código-fonte]

O socialismo islâmico incorpora princípios islâmicos ao socialismo. O termo foi cunhado por vários líderes muçulmanos para descrever uma forma mais espiritual de socialismo, destacando as semelhanças entre o sistema econômico islâmico e a teoria socialista,[17] já que tanto o socialismo quanto o islamismo são contra a renda extra. Socialistas muçulmanos acreditam que os ensinamentos do Alcorão e de Maomé, especialmente o zakat,[18] são compatíveis com os princípios do socialismo.

Em 2015, İhsan Eliaçık, dirigente da juventude do movimento Akıncı gençler (Jovens Cavaleiros), era considerado o ideólogo dos muçulmanos anticapitalistas na Turquia[19].

Movimento Wäisi[editar | editar código-fonte]

Fundado por Bahawetdin Wäisev, o movimento Wäisi foi um movimento religioso, social e político que ocorreu no final do século XIX e no início do século XX no Tartaristão e em outras partes da Rússia povoadas por tártaros.[20] As doutrinas Wäisi promoviam a desobediência à lei civil e à autoridade em favor do cumprimento do Alcorão e da Sharia. Os apoiadores do movimento evitaram o serviço militar e se recusaram a pagar o imposto ou portar um passaporte russo. O movimento também incorporou elementos de luta de classes e nacionalismo. O movimento Wäisi reuniu agricultores, artesãos e a pequena burguesia tártaros e gozou de grande popularidade em toda a região.

Muammar al-Gaddafi[editar | editar código-fonte]

Muammar al-Gaddafi descreveu sua versão do socialismo islâmico no Livro Verde.[21] O Livro Verde rejeita a democracia liberal moderna, propondo, em vez disso, um tipo de democracia direta supervisionada pelo Comitê Geral do Povo.[22]

Socialismo revolucionário somali[editar | editar código-fonte]

O Partido Socialista Revolucionário da Somália foi criado pelo regime militar de Siad Barre na República Democrática da Somália sob liderança soviética em 1976 como uma tentativa de reconciliar a ideologia oficial do estado com a religião oficial do estado, adaptando os preceitos marxistas às circunstâncias locais.[23] A ênfase foi colocada nos princípios muçulmanos de progresso social, igualdade e justiça, que, de acordo com o governo, formavam o núcleo do socialismo científico e sua ênfase na autossuficiência, participação pública e controle popular, bem como propriedade direta dos meios de produção.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. The Gospels, by Terry Eagleton, 2007
  2. a b Houlden, Leslie; Minard, Antone (2015). Jesus in History, Legend, Scripture, and Tradition: A World Encyclopedia. Santa Barbara, CA: ABC-CLIO. p. 357 
  3. Halfin, Igal (2000). From Darkness to Light: Class, Consciousness, and Salvation in Revolutionary Russia. Pittsburgh, PA: University of Pittsburgh Press. p. 46 
  4. Davis, J. C. (28 de julho de 1983). Utopia and the Ideal Society: A Study of English Utopian Writing 1516-1700 (em inglês). [S.l.]: Cambridge University Press 
  5. Campbell, Heather M, (2009). The Britannica Guide to Political Science and Social Movements That Changed the Modern World. [S.l.]: The Rosen Publishing Group. pp. 127–129 
  6. «Eduard Bernstein: Cromwell and Communism (1895)». www.marxists.org. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  7. «Taiping Rebellion | Causes, Effects, & Facts | Britannica.com». web.archive.org. 13 de julho de 2018. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  8. Crossley, Pamela (2010). The Wobbling Pivot: China Since 1800. [S.l.: s.n.] 
  9. «Communism, Marxism, and Socialism: Radical Politics and Jim Jones – Alternative Considerations of Jonestown & Peoples Temple» (em inglês). Consultado em 22 de outubro de 2020 
  10. «Q1058-3 Transcript – Alternative Considerations of Jonestown & Peoples Temple» (em inglês). Consultado em 22 de outubro de 2020 
  11. «1978: Mass suicide leaves 900 dead» (em inglês). 18 de novembro de 1978. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  12. a b Tikhonov, Vladimir (2006). Han Yongun's Buddhist Socialism in the 1920s-1930s. [S.l.]: International Journal of Buddhist Thought and Culture 6. pp. 207–228 
  13. «Cambodia Under the Khmer Rouge». www.sjsu.edu. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  14. Chulalangkorn, Bhikku (2003). Dhammic Socialism Political Thought of Buddhadasa. [S.l.]: Journal of Buddhist Studies 2. p. 118 
  15. «The New Left». www.jewishvirtuallibrary.org. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  16. «Henri Alleg, auteur de "La Question", est mort». Le Monde.fr (em francês). 18 de julho de 2013. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  17. Scott, James C. (outubro de 2008). Weapons of the Weak: Everyday Forms of Peasant Resistance (em inglês). [S.l.]: Yale University Press 
  18. Jawad, Rana (29 de julho de 2009). Social Welfare and Religion in the Middle East: A Lebanese Perspective (em inglês). [S.l.]: Policy Press 
  19. Turquia: surgem os muçulmanos anticapitalistas, acesso em 19 de julho de 2016.
  20. «zinnur.ru - Ваисовское движение». web.archive.org. 22 de dezembro de 2015. Consultado em 22 de outubro de 2020 
  21. Esposito, John L. (1999). "The Islamic Threat: Myth Or Reality?". [S.l.]: Oxford University Press. pp. 77–78 
  22. Vandewalle, Dirk J. (2006). A history of modern Libya. [S.l.]: Cambridge ; New York : Cambridge University Press 
  23. «Somalia Creation of the Somali Revolutionary Socialist Party - Flags, Maps, Economy, Geography, Climate, Natural Resources, Current Issues, International Agreements, Population, Social Statistics, Political System». www.workmall.com. Consultado em 22 de outubro de 2020